quinta-feira, maio 01, 2008

Biblioteca milenar

Em sua segunda edição, a revista Biblioteca Entre Livros (Editora Duetto) aborda a Bíblia de uma perspectiva literária, reconhecendo, no editorial, que “grandes escritores sempre beberam nas fontes bíblicas. Alguns buscaram uma referência de estilo, outros foram atrás de assunto: a Bíblia tem se revelado uma fonte inesgotável de temas a serem retrabalhados”. Tirando um e outro detalhe teológico, são textos bem escritos e que tratam as Sagradas Escrituras de maneira respeitosa.

Chamou-me a atenção, especialmente, o artigo do médico e escritor Moacyr Scliar. Intitulado “O fascinante universo bíblico”, o texto é uma verdadeira “viagem” pelas páginas sagradas, mencionando curiosidades da Bíblia e destacando a essência de alguns de seus livros.

Scliar inicia o texto fazendo o seguinte questionamento: “O que dizer de um livro que está traduzido em 2.167 idiomas e dialetos, que, no último século, teve edições totalizando mais de 2 bilhões de exemplares, está ao alcance de 85% da humanidade e é lido há cerca de 3 mil anos? Que tal coisa não existe, responderia um editor incrédulo (sobretudo em editor brasileiro, acostumado a pequenas tiragens). Mas existe, sim. Esse livro é a Bíblia, que merece, com justiça, o título de maior best-seller de todos os tempos.”

Para Scliar, “o Gênesis tem muito em comum com a mitologia de várias culturas do Oriente Médio, e mesmo de outras partes do mundo. Mas há uma diferença importante: enquanto os povos da região possuíam vários deuses, os hebreus eram monoteístas. Adoravam um Deus único, que, diferentemente de outras divindades, não podia ser representado em imagens”.

Ao falar sobre os livros de Ester e Rute, Scliar salienta outra singularidade da Bíblia: “Numa região de tradição patriarcal como é (até hoje) o Oriente Médio, este destaque dado à emoção feminina não deixa de chamar a atenção.”

Se pensarmos que o verdadeiro Autor por detrás dos escritores humanos da Bíblia foi Deus, e que quando esteve aqui na Terra, na pessoa de Jesus Cristo, tratou homens e mulheres de igual maneira, ignorando convenções racistas e machistas, esse aspecto das Escrituras não chama tanta atenção.

Scliar afirma, ainda, que “podemos ler a Bíblia de diversas maneiras. Em primeiro lugar, podemos ver nela um guia ético-espiritual, uma fonte de disposições e de ensinamentos de caráter fundamental religioso. Em segundo, podemos ler a Bíblia como um documento de caráter histórico, expressão de uma cultura milenar. E, finalmente, podemos ler a Bíblia como um conjunto de textos literários. De qualquer modo... é impressionante a disseminação destes textos. Como se explica que um livro que começou a ser escrito há quase três mil anos, ainda tenha tantos, e às vezes tão importantes, leitores? Uma pergunta tanto mais significativa quando se considera que textos envelhecem... A Bíblia é uma exceção. Trata-se de um livro eminentemente legível, mesmo em tradução, e mesmo nos dias atuais, uma fonte de sabedoria e ensinamento até para pessoas não religiosas”.

De fato, esse aspecto da Bíblia é bastante intrigante, se partirmos de uma perspectiva puramente secular: Como pode um livro produzido por um povo quase sempre submetido a outras culturas (egípcia, babilônica, romana) e que não ficou conhecido por grandes realizações literárias e/ou científicas, legar ao mundo uma “biblioteca” capaz de mudar os rumos da História?

“A Bíblia não é uma leitura monótona, como acontece com muitos livros religiosos”, garante Scliar. “Variedade é o que não falta aos textos. São numerosas narrativas; são numerosos gêneros: histórias, poemas, ditos, profecias. As histórias são vividas por personagens bem delineados, paradigmáticos.”

E o escritor arremata: “Em suma, a Bíblia é um mundo, um universo. Cujos segredos continuamos a desvendar, para nossa iluminação, para nosso encantamento, ou para ambas as coisas.”

Não deixa de ser uma publicação bem-vinda – essa segunda edição da Biblioteca Entre Livros – e um alento para os seguidores ou admiradores das Escrituras Sagradas, sobretudo nesta época em que se vêem tantas e inconvenientes investidas contra a Palavra de Deus (leia o texto a seguir).

Michelson Borges