segunda-feira, maio 05, 2008

“Nasci para pregar ao meu pai”

Nasci num lar católico, em fevereiro de 1965, e meus pais eram muito religiosos. Naquele tempo, nossa vida era muito difícil, pois meu pai era alcoólatra e, apesar de ser um bom homem, quando chegava em casa alcoolizado batia na esposa e nas duas filhas adolescentes. Minha mãe lutava com muita dificuldade, trabalhando fora como costureira para manter as meninas. Ela confiava que Deus não apenas cuidaria das filhas, como também um dia transformaria o esposo e o faria deixar as bebidas.

Ela viveu essa luta por muitos anos, até que engravidou do meu irmão e escondeu a gravidez o máximo que pôde do meu pai. Certa vez, bêbado, ele tentou espancar minha mãe para que ela perdesse a criança. Por causa da rejeição do pai, a gravidez foi muito difícil. Mas quando nasceu o menino, ele o aceitou e o batizou com o nome dele mesmo, Geraldo. Com o nascimento dessa criança, a vida começou a melhorar. Quando o Geraldo tinha um ano e meio e as meninas já estavam grandes, papai quis ter outro menino. Recebi, então, o nome do meu avô, Antonio.

Um detalhe importante é que 15 dias antes de minha mãe dar à luz o Geraldo, ela teve um sonho em que viu uma imagem de Jesus que lhe era familiar, e viu também um bebê enrolado num manto branco. Ela perguntou à imagem por que ela teria aquele menino. A resposta foi que seria para “trazer a introdução”. Ela procurou o padre e as amigas da igreja em busca do significado do sonho. O que queria dizer “introdução”? Eles apenas disseram que introdução era o início de alguma coisa.

Realmente o Geraldo trouxe a “introdução”. A vida em casa começou a ficar melhor, materialmente falando, mas principalmente porque foi graças ao Geraldo que a mensagem adventista alcançou nossa família, quando ele tinha 18 anos. Ele conheceu a mensagem por meio de um amigo que morava na mesma rua. Ele e eu nos batizamos sem que nosso pai soubesse. Tínhamos medo de ser expulsos de casa ou de apanhar dele. Mas A mãe e as irmãs nos apoiaram.

Um dia, o pai fez a pergunta que temíamos: “Vocês mudaram de religião?” O Geraldo respondeu que sim e ele perguntou por que não havíamos dito isso a ele. Geraldo explicou que tínhamos medo que ele não entendesse e que nos punisse. Naquele momento, ele nos abraçou num dos momentos mais emocionantes da nossa vida, e nos disse: “Filhos, quero dizer a vocês que o mesmo senhor lá no bar que me disse que vocês mudaram de religião, disse também que vocês são os melhores rapazes do bairro.” O pai não apenas apoiou nossa decisão, como permitiu que mamãe fosse à igreja conosco e fosse batizada com nossas irmãs. Depois, os cunhados e os nossos sobrinhos também acabaram aceitando a mensagem, cumprindo aquela “profecia” que a mãe teve antes do nascimento do Geraldo, de que ele seria a “introdução”.

Meu irmão sempre foi uma pessoa muito religiosa. Passava a lição, pregava e todo mundo dizia que ele deveria fazer teologia. Mas ele não tinha recursos e nunca havia saído de Minas, quanto mais ir para São Paulo. Certa vez, o pai brigou feio com a mãe. Ele estava bêbado e a ameaçou de morte. Foi quando o Geraldo o enfrentou. Eles não brigaram. Mas o pai saiu para beber e o Geraldo foi para o quintal de casa chorar e perguntar para Deus por que a vida tinha que ser daquele jeito; por que a família toda havia se batizado e o pai não. Foi quando Deus lhe disse que ele deveria estudar teologia.

Geraldo foi para o Unasp (então IAE), como bolsista industriário. Depois descobriu a colportagem (venda de livros religiosos) e tornou-se aluno regular, capaz de pagar pelos estudos. O pai havia dito que se meu irmão saísse de casa para estudar, que não voltasse nunca mais, e chegou a agredi-lo. Mas quando foi visitá-lo no colégio e viu o ambiente onde ele estava, o pai mudou de idéia e passou a apoiar o Geraldo. É verdade que ele nunca pôde ajudá-lo financeiramente, mas no dia da formatura do meu irmão, lá estava papai, que o abraçou chorando e disse que no dia em que ele pudesse fazer um batismo ele seria batizado por ele.

Posteriormente, tornei-me obreiro e pastor também, mas meu pai ainda sofria e fazia mamãe sofrer com o alcoolismo e o tabagismo. Não entendíamos como ela conseguia suportar tudo aquilo, e ela dizia que fazia por amor a ele e aos filhos, e que como Deus havia feito tanto pela família também haveria de mudar o coração dele.

Até que um dia ficamos sabendo que papai estava com câncer. Eu estava morando no Rio de Janeiro nessa época e tive oportunidade de ir para outros lugares distantes, mas não fui, pois quis ficar perto do meus pais, que moravam em Juiz de Fora. Nesse momento difícil, recebi um chamado para trabalhar exatamente naquela cidade.

Depois de seis meses lá, fiz uma semana de oração em minha antiga igreja, no bairro Santa Luzia, onde moravam meus pais. Meu pai quase não ia à igreja e eu preparei as mensagens da semana de oração pensando nele. Ele foi, assistiu toda a programação e naquela semana houve uma transformação na vida dele. No sábado, quando fiz o apelo para o batismo, ele se levantou, foi à frente, me abraçou e disse no meu ouvido: “Filho, eu quero amar esse Jesus que você tanto ama e quero estar nesse Céu de que você tanto prega.” E me pediu para ser batizado.

Exatamente 15 dias depois da semana de oração, ele teve complicações: uma artéria onde estava localizado o câncer se rompeu. Naquele momento em que ele sangrava, minha mãe acariciou os braços que tantas vezes a haviam machucado e disse para ele: “Geraldo, não fique triste, porque vamos estar no Céu com nossos filhos.” Em resposta, ele fez que sim com a cabeça, deixou a bacia de sangue cair no chão e curvou-se nos braços de minha mãe, falecendo.

Tenho certeza de que meu pai morreu preparado. A conversão dele se deve, em primeiro lugar, ao milagre do poder do Espírito Santo, que pode levar à conversão toda e qualquer pessoa que se entregue a Ele. Deve-se, em segundo lugar, à fé e à coragem de uma mãe que suportou tudo, sofreu a vida inteira, mas foi fiel porque confiava que Deus poderia transformar a vida de meu pai. Isso só aconteceu porque minha mãe fez a parte dela fielmente. Deus nunca deixou de responder as orações dela, que hoje tem boa saúde e diz que todo o sofrimento pelo qual passou não foi em vão. Ela diz que sua maior alegria é ter toda a família na igreja e dois filhos servindo a Deus no Ministério.

Acredito que vim ao mundo para pregar ao meu pai, a fim de que ele pudesse ter a chance de ser salvo. Um dia ele vai ser ressuscitado e poderei abraçá-lo. Enquanto isso, vou contando esse testemunho que tem ajudado outras pessoas a aceitar a Jesus como o Salvador capaz de transformar-lhes a vida.

(Pastor Antonio Oliveira Tostes é diretor da Rede Novo Tempo de Comunicação)