sexta-feira, fevereiro 26, 2010

A sopa com data de validade vencida

É bem conhecido que Darwin especulou sobre o que poderia acontecer em “algum pequeno lago quente”. Mas foi só em 1929 que J. B. S. Haldane desenvolveu uma hipótese testável envolvendo um "ensopado prebiótico", ou a "sopa primordial". Ele propôs que compostos orgânicos eram produzidos quando metano, amônia e água reagiam como resultado da energia fornecida pela radiação ultravioleta. Os produtos da reação foram sugeridos como tendo se acumulado em uma “sopa quente diluída” na Terra primeva. Nesse cenário, reações posteriores resultaram em macromoléculas, protocélulas e depois a vida. "Apoiada pela síntese inorgânica de moléculas orgânicas de Stanley Miller's (1953) no laboratório, pareceu a gerações de cientistas que a narrativa de Haldane estava basicamente correta, e tudo o que foi deixado foi ordenar os detalhes."

As experiências de Miller se tornaram um ícone da evolução naturalista, e entrou nos livros-textos com muito pouca análise crítica das descobertas. Até recentemente, o trabalho de Miller foi aclamado na revista científica Science.

Felizmente, existem oportunidades de se ir além da "onda", mas, como Jonathan Wells demonstrou no seu livro Icons of Evolution, essas contribuições raramente passam além da literatura técnica. William Martin e colegas apresentaram um caso forte para se aposentar o conceito de sopa primordial. Ele já chegou à idade avançada de 81 anos e, como uma hipótese, ela não foi confirmada. Normalmente, quando as hipóteses são testadas e não são confirmadas, elas são descartadas — mas nós estamos agora com uma hipótese há muito vencida para isso acontecer com a sopa primordial. Ela já está “vencida bem além do seu prazo de validade”.

Duas razões foram fornecidas no artigo. A primeira é que a sopa de elementos químicos orgânicos estaria em equilíbrio termodinâmico. Os produtos da reação já estão presentes, e não há uma fonte de energia óbvia para conduzir a polimerização ou qualquer outra mudança significativa. “A radiação ultra-violeta ionizante destroi inerentemente tanto quanto cria.”

“[A] sopa homogênea não tem energia interna livre que lhe permitisse reagir mais. A vida não é somente sobre replicação; também é da união de reações químicas — reações exergônicas que liberam energia e reações endergônicas que a utilizam, impedindo a dissipação de energia como calor. É banal dizer que a vida requer energia, mas a concepção de uma sopa primordial falha em reconhecer ou incorporar a importância do fluxo de energia. Baseado no princípio da congruência, o que a vida precisava não foi alguma fonte de energia severa e problemática como a radiação UV (ou raios), mas uma fonte de energia química contínua e reabastecedora.”

A segunda razão diz respeito à fermentação como o mecanismo primordial de geração de energia em um mundo sem oxigênio. Haldane promoveu essa ideia, e De Duve a apoiou como sendo o mecanismo para sustentar a vida anaeróbica. “Se isso pode ser dito como sendo a opinião de um livro-texto, é isso mesmo.”

“Mas há dificuldades profundas — tanto químicas como biológicas — em considerar a fermentação como sendo primitiva em vez de derivada. A fermentação é quimicamente uma desproporciação — não é uma reação redox, na qual os elétrons são tirados de um doador e passada adiante a um receptor, dirigida por forte termodinâmica. Em contraste com a respiração, a quantidade de energia liberada pela fermentação é pequeníssima, refletindo sua falta de força termodinâmica motriz. Para derivar tal fonte insignificante de energia exige mais do que menos sofisticação, e, na verdade, cerca de 12 enzimas são necessárias para catalizar uma sucessão complexa de etapas em fermentações do tipo glicolítica baseadas em torno da via glicolítica ou via Embden-Meyerhoff. Essas enzimas são proteínas codificadas por genes, que teriam de ter evoluído como uma unidade funcional sem qualquer outra fonte de energia nos oceanos primordiais — próximo de uma impossibilidade em um mundo RNA, muito menos a única maneira de evoluir um.”

Os autores prosseguem defendendo o ponto de vista deles de que a fermentação é uma derivação sofisticada, em vez de uma derivação primordial. Isso os leva à questão decisiva:

“Mas, se não houve nenhuma sopa, e nenhuma energia da radiação UV ou de fermentação, então onde estava a energia que energizou a emergência da vida?”

Eles continuam o artigo propondo as fontes alcalinas hidrotermais como a fonte primordial de energia para a vida. Eles desenvolvem a ideia deles de que a origem da vida pode ser considerada distintamente da origem da replicação. Eles apoiam a proposta de Russell et al (1993) de que a quimiosmose é “uma propriedade inerente da vida, uma propriedade herdada do local e espaço onde ela surgiu”. O artigo deles é exploratório, não traçando quaisquer detalhes do que LUCA — Last Universal Common Ancestor (Último Ancestral Comum Universal) teria parecido, mas considerando como a quimiosmose poderia ter funcionado no ambiente das fontes alcalinas hidrotermais. Mais discussão disso se faz necessária, é claro, mas esta postagem é para chamar a atenção do desafio que esses autores apresentam aos pesquisadores da origem da vida e aos autores/educadores de livros-texto.

“Chegou a hora de se lançar fora os grilhões da fermentação em alguma sopa primordial como a ‘vida sem oxigênio’ — uma ideia que remonta a um tempo antes que alguém tivesse qualquer entendimento de como que o ATP é feito — e seguir a ideia mais revolucionária em biologia desde Darwin como a chave, não somente para a bioenergética de toda a vida na Terra, mas à sua própria origem. Assim, parece, para nós, provavelmente, que o LUCA cresceu devido ao casal H2/CO2, e que ela era naturalmente quimiosmótica.”

(Desafiando a Nomenklatura Científica)