quinta-feira, março 25, 2010

Como não neutralizar o adventismo

Há algumas semanas, tive o privilégio de ouvir na Casa Publicadora Brasileira (CPB) uma palestra do pastor, escritor e historiador do adventismo George Knight. Seu livro A Visão Apocalíptica e a Neutralização do Adventismo foi recentemente lançado em língua portuguesa aqui no Brasil. Na palestra, assim como no livro, Knight expõe sua preocupação com os fatores que podem “castrar” a mensagem adventista e sua relevância no século 21. Knight, que é autor de mais de 70 livros (entre os quais Uma Igreja Mundial e Em Busca de Identidade, também publicados pela CPB), diz que A Visão Apocalíptica é o “livro do seu coração”, um recado simples e franco, que procura atingir pontos nevrálgicos e responder à pergunta: “Por que sou adventista?”

Para o autor, o povo que deve pregar as três mensagens angélicas de Apocalipse 14 tem uma mensagem de esperança diferenciada para este tempo. “Temos que pregar que Jesus morreu por nós. Mas é só isso? Um Salvador morto não pode fazer muito por mim. Devemos pregar que Ele ressuscitou. Ok, mas isso ocorreu há dois mil anos e as pessoas continuam sofrendo e morrendo. Jesus não é apenas o Salvador morto e ressuscitado. Ele também é o Leão da tribo de Judá que virá pôr fim à história humana e criar novos céus e nova Terra. Portanto, o Apocalipse não é um livro sobre bestas; é um livro sobre esperança”, disse ele na palestra.

No livro, Knight fala um pouco sobre seu tempo de agnóstico, sua vinda para a igreja e posterior abandono dela, para, finalmente, voltar “com tudo”. “Não voltei [para a igreja] porque a teologia adventista era perfeita, mas porque sua teologia é a mais próxima da Bíblia do que a de qualquer outra igreja que eu conhecia. Em resumo, fui e sou adventista por convicção e não por escolha”, diz ele na página 10.

Ao ler isso, lembrei-me de minha própria experiência de conversão (conheça mais dessa história aqui). Quando conheci o adventismo, na transição da década de 1980 para a de 1990, eu era líder na denominação da qual fazia parte. Tinha minhas convicções arraigadas. Por isso passei por um conflito de ideias muito intenso e dediquei-me a mais de dois anos de estudo da Bíblia para verificar que igreja a obedece mais integralmente. Embora nunca tenha deixado de reconhecer que Deus tem Seus filhos sinceros em todas as religiões (conheço muitos desses na igreja da qual deixei de fazer parte), uma coisa tive que admitir (como faz Knight em seu livro): a Igreja Adventista do Sétimo Dia é a que segue a Bíblia mais de perto e a que tem a mensagem mais profeticamente relevante para este tempo. A pergunta é: Está ela pregando e vivendo essa mensagem? Esse é ponto focal da análise de Knight.

O autor faz uma comparação entre aquilo que aconteceu com o protestantismo liberal e o que pode eventualmente ocorrer com o adventismo: “O melhor exemplo de esterilização religiosa no mundo moderno é o liberalismo protestante, que, na década de 1920, renunciou às ideias ‘primitivas’ do cristianismo, como a imaculada conceição, a ressurreição de Cristo, o sacrifício expiatório, os milagres, o segundo advento, o criacionismo e, claro, a inspiração divina da Bíblia, no sentido de que suas informações ultrapassam o entendimento humano e, por isso, foram obtidas por meio da revelação divina” (p. 18).

Se o adventismo perder sua visão apocalíptica, poderá enveredar por caminho parecido e se tornar estéril. A “demora” da volta de Cristo e a acomodação à cultura pós-moderna têm trazido essa sombra sobre o movimento e feito com que muitos se esqueçam do papel evangelístico da igreja. Para Knight, esse papel consiste em “levar as pessoas a não se adaptarem a uma cultura que foi julgada pela cruz e encontrada em falta; a não se adaptarem a uma cultura que chama a violência e o sexo ilícito de diversão; a não se adaptarem a uma cultura que paga milhões de dólares aos jogadores de futebol, mas permite que os professores de ensino fundamental ganhem um salário que mal dá para sustentar a família” (p. 21, 22).

É preciso que a igreja proclame uma mensagem equilibrada, “centralizada no Cordeiro de Deus e no Leão da tribo de Judá apresentado no Apocalipse” (p. 27). Devemos pregar o evangelho à luz da compreensão obtida a partir de 1888 (apresentada na assembleia da Associação Geral, em Mineápolis), segundo a qual, enquanto o povo de Deus aguarda a segunda vinda, deve guardar os mandamentos de Deus e a fé em Jesus (Ap 14:12), num perfeito casamento entre a lei e o evangelho. Mas, para que isso seja possível, é preciso, sobretudo, ter um relacionamento salvador com Deus. “O que precisamos”, diz Knight, “é de um relacionamento capaz de transformar nosso coração, e não simplesmente de doutrinas corretas e a prática de um bom estilo de vida. Deus deseja um povo que O ame e O sirva de coração. [...] Guardaremos verdadeiramente os mandamentos de Deus somente quando nossas ações fluírem de um coração repleto de amor a Deus e ao próximo” (p. 49).

Na página 56, Knight é contundente e pontua bem o assunto: “Se eu fosse o diabo, tentaria os adventistas e seus pregadores a serem bons evangélicos e a esquecerem coisas desagradáveis como a visão apocalíptica. Se isso não funcionasse, eu os tentaria a fazer pregações apocalípticas da besta que se concentrassem nos detalhes, no esoterismo e nos extremos. Tentaria levá-los a debater sobre o número 666 e a identidade dos 144 mil. Se não fosse bem-sucedido, tentaria fazer com que enfocassem a agitação e o medo dos eventos apocalípticos. E, claro, semearia a dúvida a respeito da validade da compreensão apocalíptica básica do movimento adventista.”

No fim do livro, Knight lembra que a igreja de Deus tem, sim, um importante papel social, mas não deve canalizar todos os seus esforços nessa direção. Por quê? Porque as mazelas sociais não terão fim até que Deus ponha um ponto final nisso tudo. Assim, precisamos ver a Jesus “não apenas como o Cordeiro de Deus que oferece salvação, mas também como o Leão da tribo de Judá que em breve irá regressar. Ele virá não para alimentar os famintos, mas para acabar com a fome; não apenas para consolar os que sofrem, mas para erradicar a morte. O mundo já sofreu demais e continua sofrendo, apesar dos melhores esforços da humanidade. A visão neoapocalíptica é a pregação da última esperança que obscurece todas as outras esperanças” (p. 106).

Por que me tornei adventista? Primeiramente, porque amo a Deus e tenho Sua Palavra como minha bússola. Em segundo lugar, porque amo as pessoas e quero torná-las conscientes de que existe uma esperança acima de qualquer esperança – a fim de que elas possam também decidir por si mesmas o que farão com essa verdade.

É uma esperança que arde em meu coração e que não posso guardar para mim. Tenho que falar, escrever sobre e viver essa mensagem, pois logo veremos Jesus!

Michelson Borges

P.S.: Depois da palestra na CPB, aproveitei para pedir que o Pr. Knight autografasse meu livro. Ele é muito simpático. Um verdadeiro profeta moderno. Um homem de Deus.