sexta-feira, setembro 17, 2010

Ensino fraudulento e não objetivo da evolução

[O blog Desafiando a Nomenklatura Científica parafraseou texto publicado no site na UNB, segundo o qual professores ensinam teoria da evolução misturada à religião.] Na contramão da ciência do século 21, o MEC/SEMTEC/PNLEM impede o ensino objetivo da teoria da evolução nas escolas, uma vez que o pensamento de Charles Darwin seria contrariado no contexto de justificação teórica. Mas, mesmo onde se ensina o evolucionismo, ele é bem explicado pelos professores? Segundo pesquisa de Ana Paula Ovelha, mestre em Ensino de Ciências pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a resposta é não. Para responder a essa pergunta, Ana Paula pediu a professores do ensino médio da Bahia que escrevessem textos didáticos sobre as dificuldades da teoria da evolução no contexto de justificação teórica. Ela se surpreendeu com a total ignorância dessa importante questão epistêmica. Muitos inclusive incluíram concepções ideológicas do naturalismo filosófico. Ou seja, os professores acabavam por misturar Charles Darwin com materialismo filosófico.

A pesquisa foi apresentada na sexta-feira, 3 de setembro, em seminário sobre o ensino de evolução. Viviane Bleyser, orientadora da pesquisa, acredita que é preciso questionar se basta que o professor “continue falando que vai ensinar evolução científica e que essas dificuldades teóricas sejam omitidas intencionalmente como advoga o MEC/SEMTEC/PNLEM”. Ela lembra de uma resposta que um aluno do ensino médio deu na prova. “Ele disse que apenas estava reproduzindo material que a professora e os livros didáticos aprovados pelo MEC/SEMTEC/PNLEM não disseram, mas que está disponível livremente na internet sobre a teoria da evolução. Do jeito que está, é 171 epistêmico.”

Para a professora Marian Luiza Gastão, do Núcleo de Educação Científica do Instituto de Ciências Biológicas da UnB, a questão do ensino correto de biologia vai além de questões metodológicas. “O principal talvez seja tomar consciência dessas dificuldades teóricas e o que elas representam para a justificação epistêmica do fato da evolução no contexto de justificação teórica, e poder apresentá-las nas salas de aula sem sanções acadêmicas.” Segundo ela, é comum os professores se esquivarem dessas questões espinhosas por temerem a inquisição sem fogueiras da Nomenklatura científica e serem prejudicados na sua carreira docente.

Outros problemas vêm de complexidades inerentes ao tema. “Uma das confusões recorrentes é entender essas críticas científicas à evolução como sendo exclusivamente ‘criacionismo disfarçado’ ou sinônimo de atraso e até de pseudociência. Na verdade, o ensino dessas dificuldades representa transformações e melhoras pedagógicas do ensino da teoria da evolução ao longo do tempo”, explica Viviane.

Nilde Deniz, professora de evolução biológica do Departamento de Genética e Morfologia da UnB, encontra dificuldades também com alunos de graduação. “Muitos chegam sem nenhum conhecimento dessas dificuldades sobre o fato, Fato, FATO da evolução, porque não foram ensinadas no ensino médio”, conta Nilde. “Alguns acham que isso nem existe e saem sem nada saber o que isso representa para a corroboração da teoria da evolução, e nem que uma nova teoria está sendo elaborada: a Síntese Evolutiva Ampliada.”

Alunos de Nilde que fazem licenciatura serão professores. “Tentamos ensinar a matéria com exemplos que podem ser reproduzidos também no ensino médio.” Segundo Viviane, o problema se repete na UFSC. “Em outra dissertação que orientei verificou-se que professores formados nos cursos da universidade também iam para a sala de aula desconhecendo completamente essas dificuldades teóricas.”

Viviane Bleyser destacou que a comunidade de pesquisa em ensino de Biologia ainda não despertou para a questão. Segundo ela, o caminho para melhorar esse cenário passa pelos avanços na formação de professores da área e, acima de tudo na qualidade do material didático aprovado pelo MEC/SEMTEC/PNLEM. Mas não é só isso. “É preciso tentar estratégias para modificar a cultura que, de uma forma geral, idolatra e nem questiona Darwin, como se ele tivesse a palavra final na origem e evolução da vida. Investir em mostras, exposições e outras formas de alcançar a população em geral seria uma solução entre outras.”

Sugestão do blog Desafiando a Nomenklatura Científica: “Que tal o ENSINO OBJETIVO e OBRIGATÓRIO dessas dificuldades fundamentais para o estabelecimento da teoria da evolução no contexto de justificação teórica? Afinal de contas, é através do ensino das evidências a favor e contra que uma teoria científica deve ser ensinada. Do jeito que está não é educação científica, mas doutrinação ideológica do materialismo filosófico que posa como se fosse ciência. Nada mais falso!”

Nota: Algumas pessoas me perguntam se concordo com o ensino do criacionismo em escolas públicas. Depois de ler a paráfrase acima (e a matéria original da UNB), minha opinião apenas se cristalizou: sou contra. Se professores evolucionistas não dão conta de explicar o evolucionismo, o que dirá se se aventurarem a falar do criacionismo? Portanto, em escolas públicas, sou contra o ensino do criacionismo por dois motivos: (1) o criacionismo é uma teoria científico-religiosa, e o governo deve ser laico e não ensinar religião (qualquer uma) aos alunos de suas escolas; (2) a maioria dos professores está despreparada para tratar da controvérsia entre o criacionismo e o evolucionismo em bases científicas; assim, o criacionismo corre o risco de ser ainda mais deformado/injustiçado. O ideal mesmo seria que os professores recebessem preparo para ensinar um evolucionismo crítico, sem fechar os olhos para as insuficiências epistêmicas da teoria.[MB]