quarta-feira, fevereiro 27, 2013

Carlos Heitor Cony e sua vã filosofia

[Os comentários entre colchetes são do leitor Marco Dourado, de Curitiba.]

[Segundo seu próprio testemunho, Cony chegou a ser considerado retardado pois só veio a falar por volta dos cinco anos de idade. No período conhecido por “antiguidade clássica”, nosso escriba seria descartado como um animal defeituoso, indigno de investimentos alimentares, afetivos e de manutenção. A partir da segunda metade do século I, enjeitados, ainda que saudáveis, eram eliminados em aterros sanitários mas escapavam da morte caso algum cristão tomasse conhecimento da barbárie, que então barbárie não era. Se esse “vão” do título de Cony (‘Nossa vã filosofia’) é disparado contra a filosofia baseada na teologia cristã, ele revela mais que ingratidão particular (sem os valores cristãos, o garotinho Carlos Heitor poderia ter sido tratado como um pedaço de mortadela estragada). Temos em apenas três palavras o desapreço por aquilo que nos garantiu muito das garantias e direitos individuais. Cony, de fato, é um humanista.]

[Começa assim o pequeno artigo de Cony:] Para nós, ocidentais, o livro-base continua sendo a Bíblia, em seus dois Testamentos. A ela devemos o relato da criação, escrito não se sabe por quem, apesar de os judeus atribuírem os cinco primeiros livros a Moisés.

[Também não se sabe quem escreveu a Ilíada, embora os gregos a atribuíssem a Homero - e isso vale para várias das obras antigas. Mas, sabemos, Cony não dirá sobre Satíricon preâmbulos como “escrito sabe por quem”, embora os romanos a tenham atribuído a Petrônio, não é, Cony? Especificamente quanto à autoria do Pentateuco, Cony age como o revisionista neurótico Pedro Pedreira, encarnado (ops!) pelo saudoso Francisco Milani. Pedreira desancava qualquer relato histórico que não estivesse inquestionavelmente documentado (uma declaração do Butantã do Antigo Egito, por exemplo, atestando que Cleópatra morrera pela picada de uma víbora).]

[Cony continua:] Nela [na Bíblia] está escrito que o espírito de Deus pairava sobre as águas, até que ele deu uma ordem ou expressou um pedido: “Fiat lux”. E a luz foi feita. Primeira pergunta: a quem ele deu essa ordem ou expressou esse desejo? A ele mesmo, ou havia alguém ou alguma coisa capaz de atendê-lo?

[O termo corretamente traduzido é: “Haja luz!” A Palavra do Senhor é a expressão de Seu poder (“Porque, assim como a chuva e a neve descem dos céus e para lá não tornam, mas regam a terra, e a fazem produzir e brotar, para que dê semente ao semeador, e pão ao que come, assim será a palavra que sair da Minha boca: ela não voltará para Mim vazia, antes fará o que Me apraz, e prosperará naquilo para que a enviei”, Is 55:10, 11). Para exemplificar direi: “Haja luz na mente de Cony!”, e para que a luz seja feita, explico a ele que as palavras do Verbo Eterno são descrições de Seus atos. E se mais luz brilhar na mente do escritor carioca, espera-se que ele (Cony) passe a usar maiúsculas SEMPRE ao se referir a Ele (Deus), e não esporadicamente.]

[Cony:] Ainda no processo da criação, Ele teria dito: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança.” 

[“Teria dito” é só picuinha de Cony. Sendo a cena descrita por um profeta, Carlos Heitor questiona a audição desse, ou sua capacidade cognitiva, ou seu caráter. O futuro do pretérito aqui é desdenhoso. Generalizado, deveria ser utilizado para tudo aquilo de que não temos plena certeza. Por exemplo: Cony TERIA passado uns dias preso pelo regime militar.]

[Cony:] Usou o plural. Haveria alguém ao lado ou acima dele? 

[Será que o escritor (e, presumo, também leitor) Cony nunca ouviu falar da doutrina da Trindade? Ou estaria fazendo média com seus amigos unitaristas, que acusam os cristãos de politeísmo?]

[Cony:] Bem, a linguagem - qualquer linguagem - é metafórica ou simbólica, traduzindo em letras aleatórias uma realidade espiritual ou física para a transmissão de um conhecimento.

[Por que “aleatórias”? E no que isso implica que a descrição do evento da Criação seja metafórica e não real? Se eu disser “Carlos Heitor Cony, após passar oito anos inteiros espezinhando diuturna e injustamente um dos governos mais importantes da história da república brasileira, foi premiado indevidamente pelo sucessor e inimigo desse com uma indenização nababesca e uma pensão de marajá, chamados de bolsa-ditadura (vide Millor)”, estarei sendo metafórico? Infelizmente, não.]

[Cony:] Será que o Deus cultuado no Ocidente é um Deus menor, um demiurgo como queria Platão, com jurisdição limitada ao que nós chamamos de Universo? 

[Em que a doutrina da Trindade diminui o Deus cristão, Cony-estranhador-de-termos-plurais? Leia os capítulos 1 tanto de Gênesis como de João e perceba que as três Pessoas da Tri-unidade estão ali nitidamente especificadas: o Espírito Santo de Deus (Gn 1:2), o Verbo-Filho Unigênito de Deus (Jo 1), além do próprio Deus-Pai (Gn 1:1). Onde se encontra nas Escrituras Sagradas menção a algum demiurgo?]

[Cony:] A mesma pergunta transcende ao Deus criado por judeus, árabes e cristãos em oposição aos deuses do paganismo, responsáveis por civilizações antigas, como a dos persas, a dos egípcios, a dos gregos e a dos romanos. Paganismo que fez Abraão abandonar sua cidade natal - qualquer entendido em palavras cruzadas sabe que ele saiu de Ur, na Mesopotâmia, porque acreditava e fez seus descendentes acreditarem num único Deus.

[Alô, editores do Grupo Coquetel! Vejam de onde Carlos Heitor Cony deve ter tirado suas ilações teológicas: das palavras cruzadas publicadas por vocês (Picolé? Fácil? Letrão?).]

[Cony:] Ele teria usado o plural para fazer o homem à sua imagem e semelhança. Seria Ele o responsável pelo antropomorfismo, dando à sua criatura as características ontológicas de seu Ser, sendo Ele “ens ut ens”? 

[Cony quase, quase chegou lá. Digo “quase” porque se realmente tivesse compreendido o texto, concluiria que os plurais “façamos” e “nossa” se devem ao fato de o homem ser “imagem e semelhança de Deus” - um Ser Triúno - por três similaridades: 

1) Ao contrário dos outros seres vivos deste planeta, o homem é um ser moral: tem a capacidade, o direito e o dever de fazer escolhas morais.

2) Ao contrário dos anjos, o homem pode gerar vida à sua imagem e semelhança, isto é, produzir descendência.

3) O homem, enquanto isolado, não pode ser imagem e semelhança de Deus pois o Criador é um relacionamento entre Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo.]

[Cony:] Daí o nome de Deus em hebraico ser plural: Elohim.

[Se essa é a conclusão mais lógica, para que tantos descaminhos nos parágrafos anteriores? Deve ser o tributo que o vício paga à virtude.]

[Cony termina:] São perguntas que não sei responder, como não sei se Lula tinha ou não domínio do fato que resultou no mensalão.

[Finalzinho schmaltzy, como nos sitcoms furrecas (furreca, aliás, é uma tradução possível para esse termo yiddish) que poluem a grade de programação da TV. Nada que surpreenda; começou mal, terminou mal. ]