quarta-feira, setembro 11, 2013

Dawkins minimiza abuso que sofreu na infância

Um dos mais prestigiados etólogos e biólogos evolucionários da atualidade, o britânico Richard Dawkins declarou, em entrevista publicada no último sábado pela revista Times, que foi vítima de uma “pedofilia leve” quando era criança, nos anos 50, mas que não considera o incidente “condenável” considerando os padrões da época. “Ele segurou no meu joelho e colocou a mão dentro da minha cueca. Tenho consciência de que você não pode condenar as pessoas de uma época em que os padrões eram diferentes da nossa. Assim como nós não olhamos para trás nos séculos 18 e 19 para condenar as pessoas por racismo, da mesma forma como condenaríamos uma pessoa moderna, eu olho para algumas décadas atrás, para minha infância, e vejo essas coisas como uma leve pedofilia, que não pode ser condenada pelos mesmos padrões que eu ou qualquer um faria hoje”, contou Dawkins à publicação. 

As declarações geraram diversas reações de repúdio, especialmente por parte de grupos religiosos e ligados aos direitos infantis. “Dawkins parece pensar que, porque um crime foi cometido há muito tempo, devemos julgá-lo de maneira diferente. Mas sabemos que as vítimas de abuso sexual sofrem os mesmos efeitos, não importa se o crime foi cometido há 50 anos ou ontem”, declarou Peter Watt, diretor da Sociedade Nacional para a Prevenção da Crueldade contra Crianças.

Ateu declarado, Dawkins é vice-presidente da Associação Humanista Britânica. Em 2012, entrou em outra polêmica sobre pedofilia por dizer que, para uma criança, é pior ser criada em um ambiente de fé católica do que sofrer abuso de padre.


Nota: Embora Dawkins tente minimizar o abuso de que foi alvo, essas experiências fincam raízes na memória e frequentemente afetam o relacionamento com as pessoas e com Deus. Principalmente se levarmos em conta que o abusador, no caso de Dawkins, foi um líder religioso, numa escola anglicana. Não sou psicólogo, mas imagino que essa experiência que ele procura desprezar tenha traído suas expectativas em relação a um referencial de pessoa religiosa. Com o tempo, inconscientemente, o biólogo acabou desenvolvendo aversão pela religião e, principalmente, por Deus. Ele odeia o religioso que abusou dele e traiu suas expectativas, mas transfere a raiva e a frustração para o Criador. Basta analisar um pouco as palavras exageradamente iradas com que Dawkins descreve Deus em livros como Deus, Um Delírio. O ódio que o inglês alimenta contra as religiões (especialmente a cristã) também é um tanto exagerado, o que revela se tratar de algo pessoal, que dói no íntimo dele. Um livro que ajuda a entender essas questões de transferência e da influência especialmente dos pais na visão que a pessoa desenvolverá com respeito a Deus é o ótimo Deus em Questão, de Armand Nicholi Jr. É uma pena que Dawkins tenha passado por isso e é uma pena que ele não consiga ver a relação de uma coisa com a outra. [MB]