terça-feira, novembro 26, 2013

O que é um “beijo comum”?

O retorno da mulher objeto
Alguns publicitários sempre se superam nos quesitos mau gosto e apelação. Desta vez, a campanha no meu entender ofensiva foi veiculada por uma das maiores operadoras de telefonia no Brasil. Folheando a revista Veja desta semana, me deparei com a peça e fiquei indignado. Numa página, está a foto de uma moça “comum”, com trajes discretos, beijando um rapaz com sorrisinho sem graça. Embaixo deles, a frase: “Um beijo comum é uma coisa.” Na página seguinte, a atriz Bruna Marquezine, em posição sensual e com saia bem curta, beija o mesmo rapaz, agora com expressão de deleite. Abaixo deles, outra frase: “Um beijo da Bruna Marquezine é outra coisa.” As duas páginas seguintes trazem a comparação descabida: mulher comum é como internet comum; Bruna é como a internet 4G “mais rápida do Brasil”. Francamente!

Mais uma vez os publicitários sem ideias originais apelam para o lugar comum e politicamente (pra não dizer moralmente) incorreto da mulher objeto. Desta vez, a beldade não é associada a um carro nem a uma cerveja. Ela é a conexão poderosa, turbinada que arranca suspiros do consumidor. A comum não serve. Não agrada. É ultrapassada.

Mas o que, afinal, é um “beijo comum”? É o beijo da mulher discreta que não procura chamar atenção para e por seus atributos físicos? É o carinho da mulher de verdade, não photoshopada nem sensualizada? É o beijo da mulher verdadeira, que procura agradar seu companheiro, numa “conexão lenta”, construída com tempo, paciência, dedicação, doação, compromisso? Se é esse, então o beijo comum é o beijo de verdade, o beijo que nasce do sentimento, o beijo desinteressado que simplesmente expressa afeto pelo objeto da afeição. O outro, o beijo “banda larga”, é pirotécnico, usado para “fisgar”, impressionar, seduzir. Como a conexão de alta velocidade, ele inebria os sentidos, hipnotiza, aturde, mas é fugaz como as informações da era digital. Dura pouco tempo na memória. Ativa hormônios, mas nem sempre toca os sentimentos mais profundos.

Essa operadora deveria se envergonhar de comparar as mulheres a uma conexão de internet, e mais ainda por chamar de “comuns” as mulheres de verdade, como se elas fossem incapazes de dar e ter prazer. Como se a sensação verdadeiramente prazerosa de um beijo fosse reservada unicamente às musas e aos "musos" midiáticos.

Ao debochar do “comum”, essa campanha publicitária parte para o lugar comum e acaba ofendendo a maioria dos consumidores, pois também são gente “comum”.

Michelson Borges