quarta-feira, fevereiro 19, 2014

O que ganhamos quando a televisão saiu de cena

Despoluição mental
Desde que entramos em uma escola Waldorf, fomos alertados sobre os muitos efeitos negativos que a televisão causa nas crianças. Hiperatividade, incentivo ao consumo, informações precoces, enfim, comecei a dosar a quantidade de televisão em casa. Mas quando entramos na escola Waldorf aqui em Miami, a coisa foi um pouco diferente. Tivemos que assinar um contrato dizendo que nossos filhos não iriam assistir televisão. Com aquele gingado brasileiro, assinamos, mas não estávamos pensando em levar aquilo assim tão ao pé da letra. Se é que você me entende. Acontece que logo que conheci o professor do João, fiquei muito encantada com a seriedade e o comprometimento dele. Ele veio à nossa casa nos conhecer antes do início das aulas. Como de cara não viu nenhuma televisão, demonstrou tranquilidade ao falar: “Ah, vocês não têm televisão?” E nós respondemos com o rabo entre as pernas: “É... na verdade temos. Mas eles assistem pouco.” E o professor falou: “Eu peço para que o João assista apenas nos fins de semana. Porque o cérebro da criança precisa do sono para assimilar o aprendizado. Se, durante o dia, houve o estímulo da televisão com suas cores, informações, sons, imagens e mensagens muito fortes, o cérebro vai usar a noite para assimilar isso, não o aprendizado da escola.”

E isso para mim fez todo o sentido. Me lembrei das várias vezes em que o João acordou no meio da noite falando sobre o filme que tinha assistido, ou acordou com pesadelos relacionados às histórias dos filmes. Então essa frase do professor foi suficiente para eu não precisar ler as três páginas de estudos de Harvard que a escola distribuiu comprovando a relação direta entre excesso de televisão e déficit de atenção, dificuldade de aprendizado e descontroles emocionais e na visão, devido à exposição à telinha. Respirei fundo, e como regra você tem que falar uma vez só e seguir em frente, com muito medo de fracassar, disse com toda certeza: “A partir de hoje, televisão só no fim de semana.”

Estamos há quase seis meses sem televisão nos dias de semana. E de lá para cá a vida mudou muito por aqui. Fiquei mais cansada, mas até aí tudo bem, afinal, cuidar deles é meu trabalho agora. Mas eles ficaram mais calmos e agora têm tempo para brincar. Aqueles brinquedos no armário não são mais meras peças decorativas.

Incentivo que façam o mesmo. Estabeleçam uma rotina. De 2h às 4h brincar livre. (E eles que se virem para achar graça em alguma coisa, se for para ficar com tédio, fica. Que problema tem isso?) De 4h às 4h30, lanche. De 4h30 às 5h30, colorir, pintar, desenhar, fazer um cartão para a vovó, fazer biscoito, enfim, trabalhar com as mãos. Depois é banho, jantar e história para dormir. (Sim, sem a TV, o sono chega mais cedo.) E pode variar, claro. Segunda e quarta, de 2h às 4h, é dia de passeio. Pode ser com a babá ou avó, não importa. O que importa é a rotina. Criança adora sentir que não está “solta”. Lembra aquele paninho (cueiro) de enrolar bebê, em que eles ficam supercalminhos? Pois a rotina dá essa sensação para os grandinhos também.

E quando a televisão fica seletiva, você percebe como a maioria do que passa ali é inadequado para as crianças. Excesso de barulho, excesso de efeitos especiais, excesso de gírias, ironia, muitas vezes excesso de bullying e excesso de publicidade. Aliás, até os próprios filminhos incentivam o consumo. Um dia eu vi a Barbie falando: “Amigas, esse vestido está fabuloso, ou está muito last week [semana passada]?” Fala sério! Inclusive, no que sua filha vai sair ganhando em ter a Barbie como influência para o que quer que seja?

Acredite. Sua vida vai mudar muito quando a televisão deixar de ser a protagonista da história da sua casa. As crianças param de pedir o tempo inteiro para você comprar o que viram ali e a imaginação volta para o lugar onde precisa estar: dentro delas.

Ah, e agora eles têm mais tempo para ajudar nas tarefas de casa. Molhar as plantas é uma delas.