Desta vez é verdade. Um mês depois
da polêmica gerada por um texto falso atribuído à revista France Football que criticava fortemente a organização da Copa do
Mundo no Brasil [veja aqui e aqui], o site da revista esportiva francesa So Foot publicou uma extensa reportagem
sobre a preparação do Brasil para o Mundial. O texto, carregado de sarcasmo e
humor ácido, mostra a que veio já no título: “Viva a Bagunça Brasileira!”"
(Vive Le Bordel Brésilien!). Em
francês, a palavra bordel serve tanto para designar casas de prostituição
quanto uma grande bagunça. A reportagem divide as cidades-sede em três grupos:
as que realmente deveriam estar sediando a Copa e que valem a viagem, mas que
nem por isso estão livres de problemas (Les
villes où ça devrait le faire), as sedes em que inevitavelmente a Copa será
uma bagunça (Les villes dans lesquelles
ce sera forcément le bordel), e aquelas onde o melhor mesmo é deixar para
ver os jogos pela televisão (Les villes
dans lesquelles on verra peut-être un match, mais à la télé de préférence).
No primeiro grupo, estão Fortaleza,
Belo Horizonte, Brasília e Porto Alegre. Nessas cidades, a revista identifica
problemas menores, como problemas de conexão com a internet e falhas nos telões
no estádio do Beira-Rio, na capital gaúcha. Já sobre Brasília, a reportagem
destaca o alto custo de construção do Estádio Nacional Mané Garrincha, em uma
cidade que não possui clubes de expressão no cenário nacional.
Já no segundo grupo, o da bagunça
inevitável, estão São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Recife e Natal. O
Aeroporto do Galeão (RJ) é descrito como “indigno de uma capital turística”: “Edifícios
degradados, pistas saturadas nas altas estações e paralisação das atividades em
cada chuva forte prometem grandes doses de diversão”, ironiza a publicação.
Sobre São Paulo, a reportagem
afirma ser a cidade “irmã da Cidade do México e prima do Cairo (capital do
Egito)”, centros urbanos conhecidos mundialmente pelo trânsito caótico. Já Salvador
teria um trânsito difícil na hora do rush.
“Considerando que o estádio [Arena Fonte Nova] fica em uma região central da
cidade, vai haver sofrimento.”
Finalmente, no grupo das cidades em
que seria melhor ver os jogos pela TV, estão Cuiabá, Manaus e Curitiba. O
aeroporto da capital mato-grossense é descrito como “um campo de barro”. “[O
aeroporto] é do tamanho de uma cozinha, mas há um lindo papagaio pintado na
parede. Nenhuma grande nação vai jogar em Cuiabá. E depois dizem que o sorteio
é aleatório.” Já Curitiba é tratada como a “grande emoção pré-Mundial”, com a
dúvida até o último minuto sobre se o estádio estará ou não pronto a tempo.
A reportagem critica não só a
situação dos estádios, aeroportos e infraestrutura em todas as 12 cidades-sede
brasileiras. Sobrou também para a Fifa, para o seu presidente, Joseph Blatter
(descrito como alguém que, no Brasil, nunca havia colocado os pés fora do
Copacabana Palace), e para o secretário-geral da entidade, Jérôme Valcke. A
revista afirma que o turista que vier à Copa vai encontrar: filas em todos os
lugares, voos atrasados chegando às cidades dos jogos após o término das
partidas e torcedores enfurecidos por perderem o espetáculo.
O texto continua: “Nenhuma
cidade-sede tem capacidade de entregar a tempo o trio de obras ‘estádio +
aeroportos + obras de mobilidade urbana’. No caso dos aeroportos, os processos
de licitação das obras só foram lançados após as eleições de 2010. Quanto à
mobilidade urbana... não se moderniza um país em seis meses, especialmente um
país como o Brasil. E por mobilidade urbana entendem-se os meios mais básicos
de transporte: vias de acesso a locais turísticos, estradas, corredores de
ônibus, metrô e trens urbanos, etc. Logo, serão os seus pés os que farão a
maior parte do trabalho.”
De acordo com a reportagem, parte
da culpa para que se tenha chegado à marca dos 100 dias para o início da Copa
na situação em que se chegou é também da entidade que comanda o futebol
mundial. “A Fifa, do seu lado, é prisioneira de um Brasil com quem ela
briga/late/chicoteia a cada semana, como se tivesse tratando com uma criança,
com um sentimento vago de que é tarde demais.”
Sobrou até para o “jeitinho
brasileiro”: "Joseph Blatter, então, agora se mostra chocado: ‘Nenhum país
teve tanto tempo para se preparar quanto o Brasil’, e ele está certo. Errado
ele estava em 2007 [quando o Brasil foi escolhido como sede da Copa], ao impor
ao país um “padrão Fifa” que estava distante demais de sua realidade, e que
culturalmente não sabe dizer não. Mas sabe dizer, porém, quando já tarde
demais, “desculpe, mas teremos que fazer alguns arranjos”.
A reportagem foi publicada no dia 3
de março. No dia seguinte, a revista publicou novo texto sobre o Brasil e a
Copa, desta vez destacando as manifestações que varreram o país em junho do ano
passado, durante a Copa das Confederações, apontando que o povo brasileiro está
insatisfeito com o alto custo da preparação do país para a Copa,
majoritariamente custeados pelos cofres públicos.
(UOL Copa)