quarta-feira, maio 07, 2014

Teorias conflitantes e um debate que resiste ao tempo

Oposição ideológica
Não é de hoje que as teorias sobre a origem da vida são motivo de polêmica. Trata-se de uma dúvida perturbadora, um mistério que atormenta os seres humanos desde a Antiguidade. Com base em questionamentos sobre nossa existência, apareceram, no decorrer dos anos, diversas teorias que tentam explicar a origem da vida na Terra. Na segunda metade do século 19, o inglês Charles Darwin apresentava ao mundo a teoria da evolução. Nessa teoria, o homem é visto como um resultado de mudanças que ocorreram com o passar do tempo. Foram necessários vinte anos de estudos e pesquisas em diversos ambientes para que Darwin publicasse essa teoria, uma vez que, naquela época, as crenças religiosas contrariavam suas descobertas. Desse modo, apenas em 1859, lançou o livro A origem das espécies através da seleção natural. Nessa obra o naturalista defende que apenas os seres mais adaptados ao seu meio sobrevivem e passam suas modificações para as próximas gerações. Essa ideia causou muitos debates na comunidade científica e religiosa.

As discussões ainda perduram nos dias atuais, já que a teoria criacionista é bem aceita pela população em geral, principalmente por estar de acordo com os relatos bíblicos. Quem segue uma religião cristã já se deparou com um dilema ao estudar na escola a teoria da evolução, pois a crença tradicional é a de que Deus criou o mundo e seus primeiros habitantes foram Adão e Eva, conforme consta na Bíblia.

A mestre em Biologia Marinha Natália Alves explica que a vida teria surgido da água através de processos evolutivos e, posteriormente, a seleção natural. Essa etapa, que compõe o início da teoria da evolução, é conhecida como evolução molecular. “A partir de compostos inorgânicos como carbono, hidrogênio, oxigênio, nitrogênio, dentre vários outros, foram realizadas combinações por meio de reações químicas, dando origem a outras moléculas orgânicas com maior complexidade”, afirma.

A bióloga cita, por exemplo, as proteínas e os carboidratos e relata que essas moléculas são essenciais para os seres vivos. As séries de reações químicas que teriam ocorrido para dar origem à vida só teriam sido possíveis devido à presença das moléculas de água no estado líquido.

Existe uma terceira teoria que tem conquistado espaço na comunidade científica e agradado alguns religiosos. Trata-se do design inteligente, inicialmente proposta pelo teólogo William Paley, em 1831. Essa teoria tenta provar que certas características da vida na Terra são mais bem explicadas se considerarmos uma causa inteligente. A linha de pensamento aceita alguns conceitos expostos por Darwin e procura evidenciar seus erros e acertos. A vida teria sido criada por uma causa inteligente, a partir disso os seres sofrem modificações chamadas de “microevoluções”.

No livro Fique por dentro da evolução, David Burnie afirma que a teoria de Darwin está sujeita a leis que podem ser verificadas por experimentos. Contudo, os vários elementos do acaso, envolvidos na evolução, fazem com que seus futuros passos nunca possam ser previstos. É nessa brecha que os adeptos do design inteligente encontram controvérsias. Eles afirmam que muitos aspectos da evolução são expostos de forma teórica e filosófica, ou seja, uma série de suposições que eles classificam como “naturalismo metafísico”.

Segundo o coordenador do Núcleo Brasileiro de Design Inteligente (NBDI) e mestre em História da Ciência Enézio Eugênio de Almeida Filho, existem diferenças fundamentais entre o criacionismo e o design inteligente. Ele afirma que o criacionismo é baseado em relatos sagrados de criação, enquanto o design inteligente procura evidências na natureza [embora os criacionistas também façam isso]. “A teoria do design inteligente é simplesmente um esforço de detectar empiricamente se a complexidade de tudo o que existe na natureza, fato reconhecido por todos os biólogos, são designs genuínos ou produtos do acaso, como a seleção natural”, explica.

A doutora em Biologia Animal pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Liliane Amorim afirma que os fósseis, a diversidade biológica, a seleção natural e as mutações são as principais evidências da evolução, mas não descarta a possibilidade de acreditar em uma teoria criadora. “A força que rege a evolução pode ser chamada de Deus, mas não seria o Deus humanizado que a religião prega”, diz.

Sobre o acalorado embate entre evolução e criacionismo, Liliane é categórica: “É impossível mudar a fé das pessoas e não acredito que um dia isso vá acabar, porém, acho que devemos respeitar. A teoria da evolução deve ser estudada, pois é uma linha da Biologia.” Enézio Filho concorda, mas, com algumas ressalvas: “Somos a favor de que a teoria da evolução de Darwin e os mecanismos evolucionários sejam ensinados de forma objetiva e honesta.” Endossando o debate, Natalia afirma: “Apesar de acreditar que a origem da vida está relacionada com a criação e das várias polêmicas que rodeiam esse tema, a evolução das espécies é um fato incontestável com inúmeras evidências científicas que provam [sic] as mudanças dos seres vivos ao longo do tempo.”

Embora haja divergências entre os adeptos do design inteligente e do criacionismo em relação à evolução, essa teoria é aclamada pela comunidade científica como “verdade absoluta”. Sobre o caráter científico do design inteligente, Enézio Filho diz: “A teoria do Design Inteligente ainda não chegou à mesa da academia para ser considerada no seu caráter científico. A questão não é uma guerra cultural entre criação versus evolução, é uma questão estritamente científica. As especulações transformistas de Darwin são corroboradas no contexto de justificação teórica? Acredito que a oposição feita ao criacionismo é ideológica.”

(Maicon de Almeida, Manaces Silva e Renan Freitas)