sábado, outubro 25, 2014

Nos passos dos pioneiros: ideias em conflito

Fazenda de Hiran Edson
Em nosso terceiro dia de viagem pelos lugares históricos da Igreja Adventista nos Estados Unidos (24/10), pudemos conhecer quatro locais importantes que revelam a efervescência ideológica e religiosa que teve lugar na região da Nova Inglaterra, no século 19: a comunidade de Oneida, o Monte Cumorah e as cidades de Hydesville e Port Gibson. De certa forma, esses quatro lugares separados por pouco mais de dez minutos de carro ilustram um conflito que vem sendo travado neste planeta há alguns milênios. A mentira original descrita no livro de Gênesis se refere ao estado do ser humano na morte. Deus foi muito claro em dizer que o pecado levaria o ser humano à morte, ao passo que o inimigo de Deus, valendo-se de uma serpente como médium, procurou contradizer as palavras do Criador dizendo que, independentemente do que fizessem, Adão e Eva não morreriam. O primeiro casal duvidou das palavras de Deus e acreditou no anjo caído, o que deu origem à história do pecado em nosso planeta. 

A Comunidade Oneida foi fundada em 1848 por John Humphrey Noyes, cujo objetivo era criar o “céu na Terra”. Noyes reuniu um grupo de homens e mulheres que passou a morar num casarão. Ele dizia ter alcançado a perfeição e que pecado era o egoísmo. Portanto, ter um cônjuge era manifestação desse egoísmo, o que levou a comunidade, embora religiosa, a adotar os múltiplos relacionamentos. Ninguém era de ninguém e todos eram de todos. As crianças oriundas desses relacionamentos sequer sabiam quem eram seus pais, e eram criadas pela comunidade. Algumas daquelas pessoas adotaram uma dieta vegetariana. Depois de alguns anos, a comunidade foi desfeita por líderes locais, que não puderam aceitar esse tipo de distorção religiosa e comportamental.

O monte Cumorah fica em Palmyra e é tido pelos membros da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias (mórmons) como o local em que o suposto profeta Joseph Smith teria, em 1831, recebido do “anjo” Moroni as placas de ouro das quais Smith teria copiado o conteúdo do Livro de Mórmom. Entramos no prédio bem cuidado e belamente decorado com quadros, displays luminosos e monitores com vídeos bem produzidos. Um senhor simpático vestido de terno e gravata nos recebeu e nos forneceu uma série de informações sobre a religião e a história dos mórmons. Eu já sabia que essa igreja acredita que as almas são imortais, geradas por um deus e uma deusa, e que eles praticam o batismo pelos mortos, sendo, portanto, espiritualistas. Quando perguntamos quem havia sido Moroni, aquele senhor nos explicou que o “anjo” tinha sido, na verdade, um ser humano ressuscitado, ou seja, um “espírito”. Smith, o profeta do mormonismo, teve uma história polêmica, foi polígamo, preso e morto por linchamento em 1844. 

A poucos minutos dali, está a pequena cidade de Hydesville. Nela, visitamos o discreto memorial que marca o começo do espiritismo moderno, em 1848, com as famosas batidas na casa da família Fox. A casa não mais existe. Foi destruída por um incêndio anos atrás, sobrando apenas a fundação de pedra por cima da qual foi construída uma casa de madeira, com amplas janelas de vidro. Há mais de cem anos, Ellen White revelou quem foi o verdadeiro autor daquelas batidas. E a placa em frente às ruínas da casa dos Fox confirma o que Ellen escreveu: aquela manifestação espiritual no século 19 marca o início da expansão do espiritismo no mundo. 

Por último, completando a programação do dia, visitamos, em Port Gibson, a fazenda que havia sido de Hiran Edson. Há uma pequena casa lá e uma réplica do celeiro dentro do qual alguns mileritas se reuniram para orar no dia 23 de outubro de 1844, um dia após o grande desapontamento. Edson saiu dali com um amigo com o objetivo de confortar outros mileritas tristes. Enquanto atravessava um milharal, Deus lhe concedeu a compreensão do que realmente havia acontecido no dia anterior: a profecia não anunciava a vinda de Jesus à Terra, mas, sim, Sua passagem do lugar santo para o lugar santíssimo do santuário celestial, dando início, assim, ao juízo investigativo. De certa forma, naquele dia em 1844, após a experiência amarga do desapontamento causado pela má compreensão do evento anunciado pelas profecias, nascia a Igreja Adventista do Sétimo Dia. Assim como, depois do desapontamento da cruz causado pela má compreensão das profecias messiânicas, nasceu a igreja cristã.

Você prestou atenção à data dos eventos mencionados acima? Oneida: 1848. Encontro de Smith com o “anjo” Moroni e linchamento do “profeta”: 1831 e 1844. Batidas na casa das irmãs Fox: 1848. Seria apenas coincidência? Em 1844, Ellen White teve sua primeira visão profética. Em 1848, foram organizadas as principais conferências bíblicas dos adventistas do sétimo dia. Lamentavelmente, a emergência do movimento adventista - com sua missão de restaurar as verdades do santuário celestial, do sábado, da mortalidade humana, do estilo de vida saudável, do criacionismo - acabou sendo ofuscada em parte pelo “espetáculo paralelo” de movimentos religiosos “proféticos”, moralmente condenáveis, pregadores da imortalidade. Na mente de muitas pessoas, o adventismo certamente foi visto como mais um movimento exótico. No entanto, a partir daquele pequeno começo, a Igreja Adventista cresceu, se espalhou pelo mundo e vem cumprindo sua missão de proclamar a volta de Jesus.

De Port Gibson, rumamos para Benton Harbor, Michigan. Mais 1.226 km nos aguardavam.  

Michelson Borges
Mansão da Comunidade Oneida; hoje é um museu e hotel

Memorial no Monte Cumorah

Interior do memorial em honra a Joseph Smit

Placa reconhece local do surgimento do espiritismo moderno

Casa da família Fox, em Hydesville

Antiga propriedade do pioneiro Hiran Edson