quinta-feira, dezembro 17, 2015

Culto “Star Wars” e a turma do “nada a ver”

As fronteiras ficam mais tênues
Uma igreja de Berlim, na Alemanha, teve uma celebração inusitada no domingo passado: um culto “Star Wars”. Isso mesmo! Dois futuros pastores quiseram mostrar aos fiéis as supostas analogias entre o cristianismo e a saga “Star Wars”. A cerimônia, intitulada “O despertar da Força: culto pelo episódio VII de ‘Star Wars’”, foi realizada na Igreja de Sion, no bairro de Mitte. No culto, foram exibidas cenas do sexto filme da saga e até um sorteio foi feito entre aqueles que compareceram fantasiados de algum personagem da franquia. O prêmio? Entradas para assistir ao episódio 7: “O Despertar da Força”, que estreou mundialmente nesta quarta-feira, levando legiões de fãs às salas de cinema.

A banalização da religião, infelizmente, é um fenômeno interdenominacional. Enquanto uns mercantilizam a fé e apregoam teologias absurdas de prosperidade e barganha com Deus, e outros criam bizarrices como “cusparadas santas” e paletós que derrubam crentes em êxtase, há aqueles que insistem numa dicotomia artificial entre sagrado/espiritual e secular, como se uma “área” da vida não afetasse a outra. Você acha mesmo que neste grande conflito em que estamos imersos, em que forças do mal e forças do bem lutam para conquistar o coração de cada ser humano, haveria algo realmente “neutro”? Será que posso buscar Deus numa igreja ao mesmo tempo em que não dou a mínima para os conteúdos que absorvo em meus momentos de lazer? Ellen White escreveu o seguinte: “Satanás tem mais sucesso quando faz seus ataques no momento em que as pessoas estão sem ter nada para fazer” (Os Escolhidos, p. 94). Sim, nossos passatempos, nossos momentos de recreação, os filmes, os livros, etc., terão inevitavelmente algum impacto sobre nossos pensamentos, e os pensamentos habitualmente repetidos, os conteúdos em que nos demoramos acabarão por moldar nosso caráter. Numa guerra espiritual, tudo é espiritual. A pessoa com quem escolho namorar e/ou casar, a casa que decido financiar, o carro que desejo comprar, a carreira na qual vou investir... cada uma dessas coisas tem potencial para edificar ou destruir a espiritualidade. E por isso mesmo deve ser alvo de muitas orações. Tudo na vida de um cristão deve ser feito com oração e sob a orientação de Deus e Sua Palavra. Para um não religioso, tudo é material. Para um religioso, tudo é “espiritual”. Simples assim? Nem tanto...

Depois que postei no YouTube dois vídeos sobre a influência de filmes (especialmente os de super-heróis), houve uma enxurrada de comentários nas redes sociais (clique aqui e aqui para ver os tais vídeos). A maioria das pessoas parece concordar com minhas ideias e com as advertências que fiz, mas outras fizeram críticas com base num “argumento” bastante recorrente: o argumento “nada a ver”. Para alguns cristãos, não tem “nada a ver” aquilo que assistimos, o tipo de músicas que ouvimos, nem o que comemos ou bebemos e as pessoas com quem nos relacionamos. Para alguns desses, o que precisamos é pregar a Bíblia e não ficar criticando a cultura que nos rodeia nem as produções midiáticas que seriam meros passatempos inocentes. Concordo que em muitos de nossos púlpitos têm sido apresentados sermões carentes da verdadeira teologia bíblica; que muitos pregadores têm substituído os poderosos sermões expositivos por mensagens água com açúcar de cunho existencialista. Sim, esse é um problema. Mas resolveremos um problema ignorando o outro? “Em vez de criticar produtos culturais como os filmes, temos que pregar a Bíblia.” Essa me parece uma típica falácia non sequitur. Os próprios autores bíblicos, especialmente os profetas, foram críticos dos costumes de seu tempo. Denunciaram a corrupção, a violência, a perversidade, a imoralidade, a idolatria, as injustiças... Curiosamente, todas essas coisas estão presentes em muitos produtos da indústria cultural de nosso tempo. Será que alguns cristãos atuais teriam coragem de dizer para um profeta: “Nada a ver! Deixe de falar dessas coisas e pregue a Bíblia. Deixe que as pessoas se divirtam!”

Você duvida mesmo que os entretenimentos “inocentes” tenham influência sobre as pessoas? Veja só esta declaração da Emily Barbosa Borges, postada em seu Facebook: “Eu sempre fui apaixonada pelos desenhos das princesas da Disney. Hoje, não sei por que, veio uma música na minha cabeça do desenho do Aladdin, e qual não foi a minha surpresa ao cantar a música e falar a palavra ‘orgia’! Eu pensei ‘é isso mesmo?’. Sim, mamães, cuidado com os desenhos que as crianças assistem! Para quem não acredita em mim, aqui está o vídeo da abertura do desenho, no qual ele canta: ‘As noites na Arábia e os dias também são sempre tão quentes, mas fazem com que a gente se sinta tão bem, tem um belo luar e orgias demais!”

Logicamente que a pessoa não vai se envolver em orgias pelo simples fato de que essa palavra está “trancada” na mente dela por causa de uma musiquinha de desenho animado. Mas será que esse e outros conteúdos vão contribuir para que estas palavras de Paulo sejam realidade em nossa vida? “Nós, porém, temos a mente de Cristo” (1Co 2:16), e: “Seja a atitude [sentimento] de vocês a mesma de Cristo Jesus” (Fp 2:5). Para ter a mente, as atitudes e o sentimento de Jesus, precisamos passar tempo com Ele. Não ter tempo para a comunhão com Cristo (tempo que muitas vezes é roubado pelos filmes, livros, seriados, videogames, etc.) já é um problema, porque sem Ele nada podemos, nada somos. Agora, gastar esse tempo com produções vazias e, pior, anticristãs, é cometer um duplo grave erro.

Quer um filtro seguro? Aqui está: “Tudo o que for verdadeiro, tudo o que for nobre, tudo o que for correto, tudo o que for puro, tudo o que for amável, tudo o que for de boa fama, se houver algo de excelente ou digno de louvor, pensem nessas coisas” (Fp 4:8).

Aí está o conselho divino. Você escolhe se ele tem tudo a ver ou se é “nada a ver”.

Michelson Borges