sexta-feira, janeiro 15, 2016

Poderiam apenas duas pessoas repovoar a Terra?

Pesquisa aponta para o criacionismo
Os predadores estrangeiros chegaram de barco. Dentro de dois anos, todo mundo estava morto. Quase. A ilhota Pirâmide de Ball fica a 600 km a leste da Austrália, no Pacífico Sul, saindo do mar, como um caco de vidro. E lá estavam eles – a meio caminho da borda do penhasco, abrigando-se debaixo de um arbusto espigado – os últimos da espécie. Dois escaparam e apenas nove anos mais tarde havia nove mil, os filhos e netos e bisnetos de Adão e Eva. Não, isso não é um relato bizarro na história da criação. O casal de sorte foram lagostas-das-árvores, Dryococelus australis, insetos-vareta do tamanho de uma mão humana. Eles foram considerados extintos logo após ratos negros invadirem sua ilha nativa Lord Howe, em 1918, mas foram encontrados agarrados na Pirâmide de Ball, 83 anos mais tarde. A espécie deve a sua recuperação milagrosa a uma equipe de cientistas que escalou 150 metros de rocha vertical para chegar ao seu esconderijo em 2003. As lagostas foram nomeadas “Adão” e “Eva” e enviadas para iniciar um programa de reprodução no Zoológico de Melbourne.

Voltar atrás após o Armagedom dos insetos é uma coisa. Lagostas-das-árvores fêmeas depositam dez ovos a cada dez dias e são capazes de partenogênese; eles não precisam de um macho para se reproduzir. Repovoar a Terra com seres humanos é outra questão. Nós poderíamos fazê-lo? E quanto tempo isso levaria?

A resposta é mais do que uma discussão de lunáticos no pub. A partir de pesquisas da Nasa sobre o número mágico de pioneiros necessários para a nossa mudança para outro planeta, para as decisões sobre a conservação das espécies ameaçadas de extinção, é uma questão de crescente importância e urgência internacional.

Então, vamos avançar 100 anos no tempo. Esforços da humanidade deram horrivelmente errado e uma insurreição de robôs nos limpou de sobre a face da Terra – um destino previsto por Stephen Hawking em 2014. Apenas duas pessoas sobreviveram. Não há nenhuma maneira de contornar a situação: a primeira geração seria toda de irmãos e irmãs.

Sigmund Freud acreditava que o incesto era o único tabu humano universal ao lado de assassinar seus pais. Não é apenas tabu, é francamente perigoso. Um estudo de crianças nascidas na Checoslováquia entre 1933 e 1970 descobriu que quase 40% das pessoas cujos pais eram parentes de primeiro grau foram severamente deficientes, dos quais 14% acabou por morrer.

Para entender por que a consanguinidade pode ser tão mortal, é preciso se familiarizar com alguma genética. Todos nós temos duas cópias de cada gene, um do pai e outro da mãe. Mas algumas variantes genéticas não aparecem a menos que você tenha dois genes exatamente iguais. A maioria das doenças hereditárias é provocada por essas variantes “recessivas”, que escapam do radar evolutivo porque são inofensivas por si sós. Na verdade, uma pessoa na média tem entre uma e duas mutações recessivas letais no seu genoma.

Quando um casal está [consanguineamente] relacionado, não demora muito para a máscara cair. Tome a acromatopsia, uma doença recessiva rara que provoca cegueira total da cor. Ela afeta 1 em 33.000 americanos e é transportada por um em 100. Se um dos nossos sobreviventes pós-apocalípticos tiver a variante, há uma chance em quatro de seu filho ter uma cópia. Por enquanto, tudo bem. Depois de apenas uma geração de incesto, o risco sobe como um foguete – com uma chance em quatro de seu filho ter duas cópias. Essa chance será de uma em 16, de que o primeiro neto do casal original tenha a doença.

Esse foi o destino dos habitantes de Pingelap, um atol isolado no oeste do Pacífico. Toda a população é descendente de apenas 20 sobreviventes de um tufão que varreu a ilha no século 18, incluindo um portador de acromatopsia. Com tal pequeno conjunto de genes, hoje um décimo da população da ilha é totalmente cega às cores.

Mesmo com esses riscos hediondos em mente, se os sobreviventes tiverem filhos suficientes, as chances são de que pelo menos alguns deles seja saudável. Mas o que acontece quando a endogamia continua por centenas de anos? Acontece que você não tem que ser preso em uma ilha para descobrir, porque não há uma comunidade que simplesmente não consiga se manter longe o suficiente de seus parentes próximos: a realeza europeia. E com nove gerações de casamentos entre primos estratégicos, tios e sobrinhas em 200 anos, os Habsburgs espanhóis são um experimento natural na forma como tudo isso acontece.

Charles II foi a vítima mais famosa da família. Nascido com uma litania de deficiências físicas e mentais, o rei não aprendeu a andar até os oito anos. Quando adulto, sua infertilidade soletrou a extinção de uma dinastia inteira.

Em 2009, uma equipe de cientistas espanhóis revelou o porquê. A ascendência de Charles foi tão emaranhada, que seu “coeficiente de consanguinidade” – uma figura que reflete a proporção de genes herdados que seriam idênticos em ambos os pais – foi maior do que se ele tivesse nascido de irmãos.

É a mesma medida utilizada por ecologistas para avaliar os riscos genéticos enfrentados pelas espécies ameaçadas de extinção. “Com um tamanho pequeno da população, todo mundo vai estar relacionado mais cedo ou mais tarde, e à medida que aumenta o parentesco, os efeitos da endogamia tornam-se mais importantes”, explica o Dr. Bruce Robertson, da Universidade de Otago. Ele estuda os papagaios gigantes da Nova Zelândia, que não voam, o chamado Kakapo, dos quais existem apenas 125 no planeta.

De particular preocupação são os efeitos da endogamia sobre a qualidade do esperma, que aumentou a proporção de ovos que nunca vão eclodir de 10% para cerca de 40%. É um exemplo de depressão por endogamia, diz Robertson, causada pela exposição dos defeitos genéticos recessivos em uma população. Apesar de muita comida e proteção contra predadores, o Kakapo não pôde se reproduzir [adequadamente].

Espécies ameaçadas de extinção também executam o desafio dos riscos de longo prazo. Embora eles já possam ser bem adaptados ao seu ambiente, a diversidade genética permite que as espécies evoluam seu caminho em torno de desafios futuros. Em nenhum lugar isso é mais importante do que a imunidade. “É algo que a maioria das espécies parece estar disposta a promover - a diversidade -, até mesmo os seres humanos. Nós escolhemos parceiros com uma composição imunológica muito diferente, assim nossos descendentes têm um diversificado leque de barreiras no sistema imunológico”, diz o Dr. Philip Stephens, da Universidade Durham. Voltando em nosso [suposto] passado evolutivo, pensa-se que o acasalamento com os neandertais pode ter dado ao nosso sistema imunitário um impulso genético.

Mesmo que nossa espécie o faça, poderia ser irreconhecível. Quando pequenos bolsões de indivíduos permanecem isolados por muito tempo, eles se tornam suscetíveis ao efeito fundador, em que a perda de diversidade genética amplifica peculiaridades genéticas da população. Não só os novos seres humanos pareceriam e soariam diferentes - eles poderiam ser uma espécie completamente diferente.

Então, de quanta variedade você precisa? É um debate que vai direto aos anos 80, diz Stephens, quando um cientista australiano propôs uma regra universal do polegar. “Basicamente, você precisa de 50 indivíduos reprodutores para evitar depressão endogâmica, e 500, a fim de se adaptar”, diz ele. É uma regra usada ainda hoje - embora ela tenha sido aumentada para 500-5.000 para compensar perdas aleatórias quando os genes são passados de uma geração para a seguinte – como informado pela Lista Vermelha da IUCN, que cataloga espécies mais ameaçadas do mundo.

Cada vez mais o conceito está levando aqueles no campo a questionar as políticas de grandes instituições de caridade de conservação, que priorizam as espécies mais ameaçadas de extinção. “É conservação enquadrada no contexto de triagem – você peneira vítimas e pergunta se existe uma chance de salvá-las. Ela pode ser usada para dizer: ‘bem, podemos esquecer as espécies?’”

Mas antes que você risque fora o nosso casal, como um cientista apontou, somos provas vivas das falhas inerentes do conceito. De acordo com a evidência anatômica e arqueológica, nossos ancestrais não teriam atingido os nossos próprios alvos populacionais, com a existência de mil indivíduos por quase um milhão de anos. Em seguida, entre 50.000 e 100.000 anos atrás, nós rasgamos outro remendo ruim, como os nossos antepassados ​​migrando para fora da África. Como seria de esperar, fomos deixados com surpreendentemente baixa diversidade genética. Um estudo de 2012 das diferenças genéticas entre grupos vizinhos de chimpanzés encontrou mais diversidade em um único grupo do que entre os sete bilhões de seres humanos vivos hoje.

Olhar para os nossos antepassados ​​pode ser nossa melhor aposta. Uma estimativa do antropólogo John Moore, publicada pela Nasa em 2002, foi modelada em pequenos grupos que migram dos primeiros seres humanos - cerca de 160 pessoas. Ele recomenda começar com casais jovens, sem filhos, a triagem para a presença de genes recessivos potencialmente perigosos. Infelizmente, Moore estava contemplando as viagens espaciais de longa duração, não repovoar o planeta. Seu número só permite 200 anos de isolamento antes de os pioneiros voltarem para a Terra.

Então, o que seria dos últimos homem e mulher? É impossível dizer com certeza, embora timidamente Stephens seja otimista. “A evidência para os efeitos de curto prazo da baixa diversidade genética é muito forte, mas todas essas coisas são probabilísticas. Há histórias de viagens incríveis de volta do limiar - tudo é possível.”

Enquanto o apocalipse não destrói os fundamentos da civilização moderna, a humanidade poderia se recuperar surpreendentemente rápido. Na virada do século 20, a comunidade Hutterite da América do Norte - que é, aliás, altamente pura - atingiu os níveis mais elevados de crescimento populacional já registrados, dobrando a cada 17 anos. É duro de se pedir, mas se cada mulher tivesse oito filhos, voltaríamos aos sete bilhões de pessoas e nossa atual crise populacional chegaria em apenas 556 anos.

(BBC, com tradução livre de Alexsander D. da Silva) 

Nota do tradutor: Alguns defensores da teoria da evolução concluíram, há alguns anos, que a raça humana descende de um único casal (assim como os criacionistas bíblicos defendem). De acordo com a questão da diversidade genética apresentada na matéria acima, além de todos os outros inúmeros problemas, esse primeiro casal produziria descendentes consanguíneos e sujeitos à diversas anomalias, questionando-se mesmo se poderiam sobreviver por tantos milhares de anos, como alegado, com tão poucos indivíduos. 

Note bem que, diante dessa sugestão, que ficou subentendida nas entrelinhas da reportagem, as autoridades consultadas saem pela tangente, cossecante, bissetriz, mais ou menos com o seguinte discurso, embora com outras palavras: “Veja bem, aconteceu, estamos aqui, então, ocorreu de alguma forma!”, ou: “Tipo assim, parceiro, toda regra tem exceção, sacomé, né? Nosso modelo é limitado, a gente não sabe bem como, mas tá aí!”

Apesar de o criacionismo não ter provas indiscutíveis do seu modelo, assim como o evolucionismo, neste ponto, mais uma vez, a visão criacionista é mais plausível. O primeiro casal - diga-se Adão (tirado da Terra) e Eva (mãe de todas as criaturas - não é Gaia, viu?) - teria genomas perfeitos e intactos. Alguns criacionistas argumentam que toda a diversidade de raças estaria nesses genes, mas vamos ficar aqui apenas com a questão da integridade do DNA. A segunda, terceira, quarta geração de humanos teria pouco ou nenhum dano no genoma. Então, não haveria problema de consanguinidade, até que a população tivesse se diversificado o suficiente. 

Evidência disso é o relato da idade com que os primeiros homens morriam. Quase mil anos, até que, com a deterioração do ambiente e da própria bagagem genética dos seres vivos, esse número caiu para a casa dos 100 anos. Também é relatado na Bíblia sobre gigantes, valentes e homens de fama sobre a Terra. Descobertas arqueológicas dão evidências da inteligência, da arte e do poder de povos antigos, superiores ao que se imaginava até então, sugerindo uma raça de humanos que, dentre outras qualidades, possuía um genoma bastante “saudável”.

O dilúvio teria desempenhado papel preponderante na degradação genética. O ambiente mudou consideravelmente, talvez mesmo os níveis de radiação solar e cósmica que passaram a atingir a Terra. A alimentação do ser humano mudou após a catástrofe. Agora se sabe que o consumo de carne é um dos fatores que pode aumentar o risco de câncer e outras doenças, e foi após o dilúvio que o ser humano recebeu autorização para consumi-la, em virtude do estado de calamidade que se apresentava. Tudo isso acumulado e potencializado por alguns milhares de anos viria a produzir, ao invés de evolução, deterioração. Faz sentido. Muito. Mas é assunto amplo, para outras postagens...