sexta-feira, fevereiro 12, 2016

Ondas gravitacionais e seu significado para o criacionismo

Ondas que deformam o espaço-tempo
Em setembro de 2015, o esforço coordenado de muitas equipes de pesquisadores finalmente deu frutos significativos: foram detectadas pela primeira vez ondas gravitacionais com uma chance de equívoco de ordem de 1 a cada 203.000 anos. Traduzindo, isso é muito mais provável do que a grande maioria do que as pessoas consideram como absolutamente certo no cotidiano, mas está apenas ligeiramente acima (5,1σ) do mínimo aceito pelos físicos para aceitar uma confirmação experimental (5,0σ) oficialmente. Para entender o significado disso é necessário conhecer o contexto. No século 19, James C. Maxwell reuniu diversas evidências experimentais e encontrou um padrão matemático. Ele expressou esse padrão na forma de um modelo matemático bastante abrangente, isto é, uma teoria científica: a Teoria Eletromagnética, que hoje em dia é comumente baseada em quatro equações diferenciais, embora possa ser expressa em apenas uma (F+J=0). A maior parte da tecnologia atual foi possível de desenvolver graças a esse conhecimento.

Para termos uma ideia da abrangência desse assunto, a existência de átomos e moléculas, sólidos e líquidos, toda a Química, a luz, o Sol aquecendo a Terra, a Biologia, o cérebro funcionando, tudo isso são manifestações de fenômenos eletromagnéticos.

Isso foi e continua sendo um grande sucesso, mas havia algo perturbador: uma das consequências dessa teoria é que a velocidade da luz é a mesma para todos os observadores. Imagine que um raio de luz passe por você a quase 300.000 km/s e você o persiga a 99% dessa velocidade em uma nave espacial super-rápida. Você esperaria que ele se afastasse de você a 3.000 km/s, mas o que ocorre é que mesmo do seu ponto de vista, ele continua se afastando de sua nave a 300.000 km/s. Mesmo assim, esse raio de luz estaria viajando ainda a 300.000 km/s em relação à Terra. Isso parecia absurdo. Maxwell propôs a ideia de que essa velocidade absoluta gerada pelas equações seria em relação a algum meio que permearia todo o espaço, ao que ele chamou de éter luminífero. O experimento de Michelson-Morley, bastante semelhante ao usado em 2015 para detectar as ondas gravitacionais, indicou que o tal éter luminífero não existe, e que a velocidade da luz é mesmo absoluta em relação a todos os observadores, não apenas a algum referencial privilegiado.

Um físico chamado Hendrik Lorentz mostrou matematicamente algumas implicações ainda mais perturbadoras desse fenômeno: dilatação do tempo e encurtamento do espaço. Seria possível, por exemplo, viajar para o futuro.

Ainda resistindo à Matemática, os físicos tendiam a considerar isso apenas como uma excentricidade da teoria, algo que só valia para o eletromagnetismo, mas não para o restante dos fenômenos físicos. Estavam errados. Albert Einstein aceitou a possibilidade de as consequências de Teoria Eletromagnética serem reais e universais e construiu um modelo matemático abrangente (teoria científica) baseado nas leis de Newton acrescidas de dois princípios: (1) a velocidade da luz é a mesma para todos os observadores, e (2) todos os sistemas inerciais são equivalentes, isto é, qualquer laboratório que seja montado em uma situação em que não exista aceleração obterá os mesmos resultados ao estudar leis físicas. A partir dessas cinco leis, a teoria resultante chama-se Relatividade Especial. Também foi e é um grande sucesso em termos de fornecer resultados acurados para uma infinidade de fenômenos, alguns desconhecidos previamente.

Mas faltava um ingrediente importante: a gravidade frequentemente tem um papel relevante em diversos fenômenos de interesse nessa área, porém, a Relatividade Especial ignora a gravidade. Como levar a gravidade em conta? Einstein trabalhou nisso durante anos. Finalmente, usou o famoso princípio da ação mínima, que se baseia na ideia de que tudo o que Deus faz, incluindo leis físicas, é otimizado, e ainda conceitos da teoria geométrica de Riemann e do cálculo tensorial de Ricci, conseguiu deduzir uma equação diferencial tensorial que mostra uma relação entre energia, quantidade de movimento, tensões e curvatura do espaço-tempo. Essa equação é o fundamento de uma teoria científica chamada Relatividade Geral.

Como as anteriores, foi extremamente bem-sucedida, mesmo deixando alguns elementos de fora (levada em conta a curvatura mas não a torção no espaço-tempo, por exemplo).

Concepção artística de um buraco de minhoca
Como nos casos anteriores, as consequências dessa equação surpreenderam e confundiram seu autor e colegas. Uma das primeiras consequências descobertas foi a existência de buracos negros, juntamente com muitos detalhes sobre seu funcionamento. Seguindo essa linha, encontram-se possibilidades de viajar tanto para o futuro quanto para o passado. Outro resultado interessante são os wormholes, ou buracos de verme/minhoca, nome inspirado em vermes de frutas que não precisam andar pela superfície de uma maçã para chegar de um lado a outro, mas podem cavar um túnel e passar por dentro da maçã. Buracos de verme permitiriam viajar de um ponto a outro do espaço-tempo sem a barreira da velocidade da luz. Dominando essa tecnologia poderíamos, em tese, viajar até uma galáxia a bilhões de anos luz em poucos minutos.

Literalmente milhões de experimentos têm sido feitos mostrando o quão acurada é a equação da Relatividade Geral para uma grande variedade de tipos de fenômenos (alguns autores falam em equações por se tratar de uma equação com entidades representáveis por matrizes, possuindo muitas componentes, podendo-se decompor a equação original em um sistema de várias equações mais simples).

Um outro resultado perturbador da equação da Relatividade Geral é o de que o Universo (o espaço mesmo, com ou sem matéria) não poder ter existido sempre, pelo menos não da forma como o conhecemos. O Universo teve uma origem. Einstein e outros não queriam aceitar esse resultado. Na década de 1920, Georges Lemaître, um religioso católico que também era físico, estudou as soluções da equação da Relatividade Geral, comparando-os com resultados da Termodinâmica e com observações astronômicas. O resultado que obteve é essencialmente o que hoje chamamos de Teoria do Big Bang, o primeiro modelo matemático cosmológico criacionista, embora não tenha sido apresentado dessa maneira. Com o tempo e com as evidências acumulando-se ao longo do tempo, o modelo acabou sendo aceito e encaixado em uma visão filosófica que abrisse espaço para doutrinas ateístas.

Esse e alguns outros modelos cosmológicos criacionistas, como o do Dr. Humpheys e do Dr. Gentry, baseiam-se na Relatividade Geral. A própria Teoria das Cordas, usada em anos recentes para estudar a possibilidade de outros universos, baseia-se na Relatividade Geral.

Assim, confirmações da validade da Relatividade Geral apoiam a principal base desses modelos, tanto criacionistas quanto evolucionistas. Para isso, procuram-se confirmar previsões de fenômenos ainda não detectados. Um desses é o das ondas gravitacionais.

Mas o que são ondas gravitacionais? Imagine um pequeno lago e imagine-se jogando uma pedra nesse lago. A partir do ponto de impacto entre a pedra e a água, ondas propagam-se pela superfície do lago. A pedra causa uma deformação na superfície da água, o que causa um movimento ondulatório que se propaga. A gravidade é uma espécie de deformação do espaço-tempo. Alguns fenômenos que ocorrem no espaço são particularmente violentos e, de acordo com a Relatividade Geral, fazem com que o espaço-tempo “ondule” e essa ondulação se propaga pelo espaço, possuindo certas características descritas em detalhes por soluções da equação da Relatividade Geral. Sabemos exatamente o que procurar e de onde esperar que essas ondas venham. A tecnologia para isso, porém, precisa ser muito sensível e dependemos de fenômenos naturais que causem essas ondas. Esses fatores se combinaram em 2015 e a detecção foi finalmente possível.

Mas esses resultados são muito mais úteis do que simplesmente confirmar algo que já se sabia teoricamente há muitas décadas. A tecnologia desenvolvida em pesquisas avançadas frequentemente tem encontrado novos usos no cotidiano, beneficiando a todos enquanto permanece desconhecida, funcionando nos bastidores para reduzir os transtornos da vida. Além disso, se aperfeiçoarmos o processo a ponto de formarmos uma espécie de “olho” para enxergar o Universo através de ondas gravitacionais, teremos acesso a coisas que agora são invisíveis ou quase.

(Dr. Eduardo Lutz é astrofísico e reside em Porto Alegre, RS)