sexta-feira, novembro 10, 2017

Muco de lesma mostra como fazer plástico reutilizável

A natureza está fornecendo a inspiração para o desenvolvimento de um novo tipo de polímero que pode passar de um estado gelatinoso para uma conformação muito forte, abrindo novas gamas de aplicação. A inspiração veio da observação de uma espécie de lesma conhecida como verme-aveludado (Onychophora), devido às inúmeras papilas que apresentam na superfície do corpo. Para capturar sua presa, a lesma arremessa uma secreção grudenta e mole. Contudo, quando a presa começa a fazer força para escapar, essa força faz com que a secreção endureça na forma de fios muito fortes, que selam seu triste destino. Mais do que isso, depois de cumprir sua função mecânica, os fios podem ser simplesmente dissolvidos em água, voltando à sua forma gelatinosa, ficando prontos para uma próxima seção de esticamento e endurecimento. O fato de que fibras de polímeros reversíveis possam ser extraídas de uma secreção líquida e reutilizadas indefinidamente é um conceito muito interessante do ponto de vista tecnológico.

Por isso, Alexander Baer (Universidade de Kassel) e Georg Mayer (Instituto Max Planck de Coloides e Interfaces) se debruçaram sobre a composição e os mecanismos moleculares que pudessem explicar essa mudança estrutural na meleca da lesma, de forma a reproduzi-los em materiais sintéticos. Eles constataram que o muco é formado por moléculas grandes, de proteínas e ácidos graxos, que são produzidas separadamente e depois se juntam para formar glóbulos muito uniformes, todos com diâmetros na faixa dos 75 nanômetros. O material fica armazenado em uma glândula, até que o animal perceba a presença de um grilo ou de uma aranha. Nesse momento, ele arremessa o muco por meio de dois canais nos lados da cabeça, que sai impulsionado por contrações musculares.

“A princípio a consistência pegajosa não muda. No entanto, assim que a presa começa a se sacudir, as forças de cisalhamento agem sobre o limo para romper os nanoglóbulos, separando as proteínas e ácidos graxos. Enquanto as proteínas formam fibras longas no interior do limo, as moléculas de lipídeos e água são deslocadas para o exterior e formam uma espécie de bainha”, conta Baer. É essa bainha, uma espécie de cobertura alongada, que passa a revestir e dar rigidez às fibras que a presa forma a partir do muco ao tentar se desvencilhar.

A equipe espera que, no futuro, essa combinação de nanoglóbulos e macromoléculas solúveis em água possa servir como modelo para a fabricação de polímeros sintéticos reutilizáveis, que não precisem passar por processos complicados de reciclagem.

No caso do muco do animal, basta dissolver os fios em água para que eles voltem à consistência original – o animal não o reutiliza, mas o material fica pronto para um novo uso.

Antes disso, porém, a equipe afirma que será necessário descobrir detalhadamente como é que as proteínas do muco se combinam para formar fibras rígidas sem formar ligações químicas fixas.


Nota: Mesmo dispondo de tecnologia, dinheiro e muita inteligência, os pesquisadores ainda não conseguem reproduzir a tremenda engenharia do muco da lesma que alguns dizem ter surgido por acaso. (Evidentemente que, antes do pecado, a função desse muco não era a de captura.) [MB]