quinta-feira, janeiro 11, 2018

“Prova matemática da evolução darwiniana” é falsa

Devido à tradição da escrita científica profissional, grandes desenvolvimentos em literatura científica geralmente chegam abafados por uma linguagem tão maçante ou técnica que acabam passando despercebidos pelo leitor regular. Isso, junto com o hábito da mídia de dar suporte à evolução, faz com que rachaduras enormes na fundação do Darwinismo se espalhem despercebidas pelo público, que continua acreditando que a ciência [humana] está totalmente estabelecida e se manterá sempre assim.

Um bom exemplo é o recente artigo do Jornal de Biologia Matemática, uma significativa publicação de revisão por pares feita pelo influente site de publicações Springer. O título do artigo anuncia: “O teorema fundamental da seleção natural com mutações”.

Incluir um verbo seria, presumidamente, concessão demais para o sensacionalismo populista. Ainda assim a conclusão, se não sensacional, é certamente notável.

Gerações de estudantes de biologia e evolução aprenderam sobre o trabalho pioneiro de Ronald A. Fisher (1890-1962). Um fundador da estatística moderna e genética populacional, ele publicou seu famoso teorema fundamental de seleção natural em 1930, lançando uma das pedras fundamentais do neodarwinismo ao conectar genética mendeliana com a seleção natural. A Wikipédia sumarizad “Isso contribuiu para o renascimento do Darwinismo na revisão da teoria da evolução do início do século 20, conhecida como a síntese moderna.”

O teorema de Fisher, tido como o equivalente à “prova matemática de que a evolução darwiniana é inevitável”, agora é considerado falso. Sua ideia é relativamente fácil de descrever. Ela afirma: “A velocidade de aumento na aptidão de qualquer organismo a qualquer tempo é igual a sua variância genética em aptidão naquele momento.”

Sua comprovação para isso não foi da maneira comum da matemática; aptidão não é rigorosamente definida, e seu argumento é mais intuitivo que qualquer outra coisa. O teorema aborda apenas os efeitos da seleção natural. Fisher não abordou diretamente nenhum outro efeito (mutação, deriva genética, mudança ambiental, etc.), pois ele os considerou insignificantes. Matemáticos posteriores discordaram da falta de rigor de Fisher, alguns de forma bem detalhada. Mas a omissão dos efeitos de mutação foi o que mais chamou a atenção.

Recentemente, o matemático William F. Basener e o geneticista John C. Sanford vieram propor uma expansão do teorema fundamental, incluindo mutações. Basener é professor no Instituto de Tecnologia de Rochester e um acadêmico visitante no Instituto de Dados da Ciência da Universidade da Virgínia. Sanford é um geneticista botânico que foi professor associado na Universidade Cornell por muitos anos. Ele é editor do volume Biological Information: New Perspectives (World Scientific, 2013). O Jornal de Biologia Matemática é a publicação oficial da Sociedade Europeia para Biologia Matemática e Teórica.

Basener e Sanford expandiram o modelo de Fisher permitindo mutações tanto benéficas quanto danosas, seguindo e estendendo o trabalho anterior. Eles usaram níveis de mutação zero para testar a concordância de seu modelo com o de Fisher. Eles estabeleceram que existe um nível de aptidão de equilíbrio em que a seleção balanceia os efeitos mutacionais. Entretanto, se mutações em níveis biológicos plausíveis ocorrem, a aptidão geral é comprometida. Em alguns casos isso leva à “falha mutacional”, onde o efeito de mutações acumuladas suplanta a habilidade populacional de se reproduzir, resultando na extinção.

Extinção é o oposto de evolução. Eles concluem: “Nós reexaminamos o teorema fundamental de Fisher da seleção natural, focando na questão de novas mutações e consequentes implicações para populações biológicas reais. A tese primária de Fisher era que variação genética e seleção natural trabalham juntas num caminho fundamental que garante que as populações naturais irão sempre crescer em aptidão. Fisher considerou seu teorema essencialmente como uma prova matemática da evolução darwiniana, e a comparou com uma lei natural. Nossa análise mostra que a tese primária de Fisher (aumento contínuo e universal da aptidão) não está correta. Isso se dá por ele não ter incluído novas mutações como parte de sua formulação matemática, e por conta de seu corolário informal se basear numa premissa que agora se sabe ser falsa.”

“Nós mostramos que o Teorema de Fisher, como formalmente definido pelo próprio Fisher, é de fato antitético à sua tese geral. Além de novas mutações, o Teorema de Fisher simplesmente aperfeiçoa variações de aptidão alélica pré-existentes levando ao equilíbrio. Fisher se deu conta de que precisaria de novas mutações formadas para que seu teorema suportasse sua tese, mas ele não incorporou mutações em seu modelo matemático. Fisher apenas considerou novas mutações utilizando experimentos mentais informais. Para analisar o Teorema de Fisher, nós julgamos ser necessário denominar o elemento mutacional informal de seu trabalho como o Corolário de Fisher, o qual nunca foi de fato comprovado. Nós mostramos que enquanto o Teorema de Fisher é verdadeiro, o Corolário é falso.”

“Neste artigo, nós derivamos um modelo de mutação-seleção melhorado, que é construído sobre o modelo de base de Fisher, assim como em outros modelos pós-Fisher. Comprovamos um novo teorema, que é uma extensão do teorema fundamental de Fisher de seleção natural. Este novo teorema permite a incorporação de novas mutações formadas no Teorema de Fisher. Nós nos referimos a este teorema expandido como ‘O teorema fundamental de seleção natural com mutações’.”

“Após termos reformulado o modelo de Fisher, permitindo a análise dinâmica e a incorporação de novas mutações surgidas, nós subsequentemente fizemos uma série de simulações dinâmicas envolvendo populações grandes, porém finitas. Nós testamos as seguintes variáveis no tempo: (a) populações sem novas mutações; (b) populações com mutações que apresentam distribuição simétrica de efeitos de aptidão; e (c) populações com mutações que apresentam uma distribuição mais realística de efeitos mutacionais (com a maior parte das mutações sendo danosas). Nossas simulações mostram que (a) à parte de novas mutações, a população rapidamente se move em direção ao equilíbrio; (b) com mutações simétricas, a população passa por aptidão rápida e contínua; e (c) com uma distribuição mais realística das mutações, a população geralmente passa por declínio perpétuo da aptidão.”

É isso injusto com uma figura histórica? E quanto aos modelos desenvolvidos após Fisher?

“Com base no trabalho de Fisher, e os problemas associados a ele, nós também examinamos os modelos pós-Fisher do processo de mutação-seleção. No caso dos modelos de população infinita, o que foi comumente observado é que populações vão rotineiramente ao equilíbrio ou a um limite definido – como uma órbita periódica. Eles não mostram aumento ou declínio perpétuo em aptidão, mas se restringem pelo comportamento, por conta da estrutura do modelo (uma população infinita com mutações apenas ocorrendo entre variedades genéticas pré-existentes). De forma prática, todas as populações biológicas são finitas. No caso dos modelos de população finita, o foco tem sido em se medir a acumulação de mutações, como afetadas pela seleção. Modelos finitos claramente mostram que populações naturais podem tanto aumentar quanto diminuir em aptidão, dependendo de muitas variáveis. Outros modelos matemáticos finitos de população não somente mostram que aptidão pode diminuir – eles geralmente mostram que apenas uma faixa estreita de parâmetros podem de fato evitar o declínio na aptidão. Isso é consistente com muitos experimentos de simulação numérica, com diversos experimentos de acumulação de mutações, e com observações onde sistemas biológicos têm ou um alto índice de mutação ou um pequeno tamanho de população. Mesmo quando grandes populações são modeladas, minúsculas mutações danosas (VSDM em inglês) podem teoricamente levar ao contínuo declínio da aptidão.”

O golpe final vem embrulhado em elogios: “Fisher foi inquestionavelmente um dos maiores matemáticos do século vinte. Seu teorema fundamental de seleção natural foi um enorme passo à frente, no qual ele, pela primeira vez, relacionou seleção natural com genética mendeliana, o que pavimentou a via para o desenvolvimento do campo da genética populacional. Entretanto, o teorema de Fisher estava incompleto de forma a não permitir a incorporação de novas mutações. Em adição, o corolário de Fisher estava seriamente falho pelo fato de presumir que mutações apresentam um efeito final de aptidão que é essencialmente neutro. Nossa reformulação do Teorema de Fisher completou e corrigiu efetivamente o teorema, de forma que ele pode agora refletir a realidade biológica.”

O que eles quiseram dizer está descrito de forma mais franca anteriormente no artigo: “Graças à premissa que fundamenta o corolário de Fisher ser agora reconhecido como inteiramente errado, o corolário de Fisher é falso. Consequentemente, a crença de Fisher de que ele desenvolveu uma prova matemática de que a aptidão deve sempre aumentar também é falso.”

Esta é a “realidade biológica”. O trabalho de Fisher é geralmente interpretado como significando que a seleção natural leva ao aumento da aptidão. Apesar de isso por si só ser verdade, mutações e outros fatores podem e de fato reduzem a aptidão média da população. De acordo com Basener e Sanford, em níveis reais de mutação, o teorema original de Fisher, compreendido como sendo uma prova matemática de que a evolução darwiniana é inevitável, está derrubado.

Parabéns a Basener e Sanford por demonstrar esse importante ponto. Agora os livros e artigos das enciclopédias online tomarão nota?

(Evolution News, com tradução de Leonardo Serafim)