terça-feira, janeiro 16, 2018

Modelos ou “forçação de barra”?

Recentemente li em uma matéria publicada pelo jornal O Globo sobre uma fraude no Museu Nacional da Holanda, envolvendo uma amostra de rocha que, supostamente, seria uma “pedra lunar”. A amostra teria sido doada, na ocasião, pelo embaixador norte-americano na Holanda, Willian Middendorf, ao primeiro-ministro holandês Willem Drees. Segundo o jornal, a doação teria sido feita por ocasião de uma “turnê mundial” dos três astronautas norte-americanos que integraram a missão Apollo 11. O fato curioso teria sido descoberto por um especialista em questões espaciais que afirmou achar “estranho” e até mesmo duvidoso que a Nasa, a agência espacial americana, teria um desprendimento assim tão grande de abrir mão de uma raríssima amostra de material lunar somente para agradar ao primeiro-ministro holandês. Mas foram os geólogos da Universidade de Amsterdã que, mediante análises microscópicas, descobriram que, na verdade, se tratava de uma amostra de madeira petrificada e nem de perto teria procedência lunar. O mais curioso é que, segundo o museu, somente o seguro da tal pedra teria custado 50 mil euros. Hoje, após a descoberta, a amostra poderia ser vendida no máximo por 50 euros.

Esse fato me fez lembrar de uma aula muito interessante que tive durante meu mestrado sobre a formação das grandes províncias magmáticas do mundo. Lembro-me bem de que minha professora relatou sobre uma então recente discussão que estava ocorrendo durante os congressos de geofísica e de geologia a respeito de outra suposta fraude em alguns modelos geológicos que serviram de base para muitos artigos científicos.

Segundo alguns geofísicos, muitos pesquisadores que criaram modelos para a formação de ilhas oceânicas a partir de “hotspot” teriam usado de muita “criatividade” para a explicação dos processos vulcânicos associados. Alguns chegam até mesmo a achar que as tomografias mantélicas, feitas muitos anos atrás para sustentar essas hipóteses, foram manipuladas. Um grande grupo de geólogos simplesmente desacredita nessas informações, deixando essa discussão longe de ter um fim. Em virtude disso, alguns cientistas até propõem outros modelos para a formação de vulcanismo, como o pesquisador Don Anderson, do Instituto de Tecnologia da Califórnia, nos Estados Unidos. Segundo ele, os tradicionais modelos que mostram estreitos jatos de magma vindo das profundezas da Terra e disparando pelo meio de uma montanha em formato de cone, devem ser banidos dos livros-textos.

“Mas esse quadro está errado”, garante o professor Anderson. Segundo ele e seu colega James Natland (Universidade de Miami), esses estreitos canais de magma que dariam origem aos vulcões não existem nem fazem sentido – não existe, por exemplo, uma explicação da energia necessária para trazer o material até a superfície.

“Plumas vindas do manto nunca tiveram uma boa base física ou lógica”, diz Anderson, referindo-se ao formato de pena frequentemente usado pelos livros-textos para ilustrar os jatos de lava que alimentam os vulcões. Segundo o autor, para tentar detectar as hipotéticas plumas, os geólogos analisam a atividade sísmica medida por várias estações espalhadas por uma grande área. O tipo de material que essas ondas atravessam altera suas propriedades, o que pode ser usado para deduzir o tipo de material atravessado. Mas ninguém detectou os canais estreitos de lava em pesquisas feitas em áreas repletas de vulcões – no Havaí, no Parque de Yellowstone e na Islândia.

Agora, em parte graças a estações sísmicas melhores e mais adensadas, a análise de sismologia do planeta é boa o suficiente para confirmar que não existem “plumas mantélicas” estreitas, garantem Anderson e Natland. Em vez disso, os dados revelam que há grandes pedaços do manto, em movimento ascendente lento, com mais de mil quilômetros de largura, afirma o pesquisador.

O fato é que hipóteses podem ser comprovadas ou não. Modelos podem ser refeitos, abandonados, substituídos... Isso normalmente faz parte das pesquisas científicas. O grande problema reside na má-fé de alguns “pesquisadores” que manipulam imagens e/ou dados para comprovar suas teorias e embasar suas pesquisas. Não será difícil você achar na internet várias outras matérias abordando as fraudes cometidas por esses supostos pesquisadores para sustentar suas teorias. O fato é que precisamos ter os olhos bem abertos! Vejo que, quando falamos de criacionismo, parece que estamos falando de algo extremamente bizarro e sustentado em cima de mentiras. Mas será que tudo o que os cientistas lhe mostram como verdade é, de fato, verdade? O bom senso não serve somente ao estudarmos o planeta segundo a ótica criacionista; o bom senso serve ao usarmos qualquer lente para estudar a criação.

(Hérlon Costa é geólogo formado pela UFPA e mestre em Geologia Exploratória pela UFPR)

Fontes:
http://g1.globo.com/Noticias/Ciencia/0,,MUL1284661-5603,00-PEDRA+LUNAR+DE+MUSEU+HOLANDES+ERA+NA+VERDADE+MADEIRA+PETRIFICADA.html

Mantle updrafts and mechanisms of oceanic volcanism, Don L. Anderson, James H. Natland, Proceedings of the National Academy of Sciences, vol. published online: DOI: 10.1073/pnas.1410229111