Este blog reconhece o esforço de
todas as entidades e organizações que estão defendendo a fé cristã bíblica por
meio de uma apologética consistente e racional. Reconhecemos também o grande trabalho
que essas mesmas entidades têm feito nos campi seculares tão desafiadores.
Precisamos mesmo mostrar a uma sociedade cada vez mais relativista e
“desigrejada” que o cristianismo oferece, sim, respostas apropriadas para as
grandes questões, e que a Bíblia pode e deve ser o fundamento de uma cosmovisão
útil para o entendimento da realidade que nos rodeia. Autores como William Lane
Craig, Ravi Zacharias, Alvin Plantinga, Lee Strobel e outros têm dado tremenda
contribuição nesse sentido. Ocorre que alguns desses autores e algumas dessas
entidades acabam “escorregando” aqui e acolá. Talvez a maior “pisada de bola”
seja o ensino da evolução teísta e a alegorização dos primeiros capítulos de
Gênesis. Já tratamos aqui no blog das sérias implicações desse tipo de ensino
(confira aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui). No texto a seguir, originalmente
postado no blog “Raciocínio Cristão”, Everton Alves expressa
educadamente sua preocupação com uma dessas entidades. [MB]
Recentemente, escrevi a matéria “O avanço do evolucionismo teísta no Brasil” para fins de esclarecimento quanto ao
perigo real do intento de harmonizar o evolucionismo com a Bíblia e de que
forma essa cosmovisão evoteísta acaba por minar todas as afirmações bíblicas.
Ademais, abordei o avanço dessa proposta no Brasil, principalmente por meio da
Associação Brasileira de Cristãos na Ciência (ABC2).
É válido mencionar, antes de
adentrarmos o tema, que a ABC2 vem fazendo um bom trabalho quando o
assunto é explorar as ciências humanas. Poucas organizações cristãs no Brasil
têm focado o historicismo nessas áreas. A ABC², então, tem se tornado
referência sobre esse problema grave para a fé cristã, uma vez que esse tema
está relacionado a ideias que vão contra as crenças cristãs dentro da Academia.
Portanto, para quem tem interesse em filosofia e epistemologia, a ABC² se
torna destaque devido às suas contribuições para esses campos de estudo.
O problema, como o próprio título da
matéria diz, é em relação à aceitação e divulgação do modelo evolucionista
teísta, por meio de materiais bibliográficos e audiovisuais que a associação
tem produzido que, por outro lado, deturpam claramente a Palavra de Deus. Há
uma tendência crescente de infiltrar esse tema cada vez mais no meio
protestante, uma vez que o catolicismo já o abraçou de vez. Ademais, as
publicações da ABC2 têm cada vez mais sido usadas para atacar o
criacionismo bíblico literal. É aí que mora o perigo!
Para fins didáticos, defino
“evolucionismo teísta” como sendo um modelo conceitual que reconhece, até certo
ponto, que Deus é o Criador e mantenedor do Universo e da vida. No entanto,
rejeita a interpretação literal do livro de Gênesis quanto à origem da vida e
declara que, embora a narrativa afirme a criação especial, ela não é exata,
pois os cientistas “demonstraram” que os organismos surgiram por evolução. Por
isso, Deus teria criado o ser humano utilizando-Se, para tanto, não da
criação ex nihilo (do
nada), mas, sim, dos mecanismos evolutivos a partir de animais inferiores.
Histórico
de advertências sobre o trabalho da ABC2
Ao longo dos últimos anos,
proponentes do criacionismo e do design inteligente
vêm expondo, publicamente, a má teologia, a má filosofia e a má ciência
presentes no modelo evoteísta. Até onde sei, temos, por exemplo, o caso do professor
Christiano P. da Silva Neto, presidente da Associação Brasileira de Pesquisa da
Criação, que em um breve artigo intitulado “Emergência: grave ameaça à fé
cristã”, adverte os criacionistas a ficar vigilantes com essa proposta
promovida pela ABC2:
“Durante os anos de 2016 e 2017
entramos em contato com mais de 20 igrejas que estavam recebendo a
ABC2 para encontros de fins de semana. Nenhuma delas tinha conhecimento de
que estavam abrigando uma organização evolucionista. Algumas, ao serem
informadas a esse respeito, cancelaram a programação; outras preferiram manter
o acordo que haviam firmado.
“Curiosamente, os livros utilizados
pela organização, escritos por conhecidos evolucionistas teístas, foram
publicados pela Editora Ultimato, de Viçosa, cujo
fundador, hoje falecido, esteve na cerimônia de fundação de nossa associação,
em 1979, parabenizando-nos pela realização.
“Não temos a menor ideia do que tem
motivado essas pessoas para o trabalho que realizam. Sabemos, entretanto, que
eles nos consideram, a nós criacionistas, como perniciosos para o
desenvolvimento da fé cristã. Nós, porém, estamos convictos de que a ABPC é, no
sentido teológico, um ministério, isto é, uma atividade para a qual fomos
devidamente convocados pelo nosso Deus Criador. Através do trabalho que
realizamos revelamos o fato de que a natureza e as Escrituras, na pureza de sua
narrativa da criação, falam a mesma linguagem sobre nossas origens.”
De igual modo, em 2016, a Sociedade Criacionista
Origem & Destino, por meio de seu atual presidente, Johannes Janzen, veio a
público com uma matéria intitulada “A morte no mundo e a evolução teísta” criticar o
evolucionismo teísta promovido pela ABC2 e o problema filosófico e
teológico da entrada da morte em nosso planeta:
“Os escritos do BioLogos têm sido
amplamente divulgados no Brasil, principalmente através da Associação
Brasileira de Cristãos na Ciência. BioLogos, através de teólogos como Tim
Keller, defende a evolução teísta. [...] A Bíblia ensina que a morte entrou no
mundo através de Adão (Romanos 5:12). A evolução teísta precisa argumentar que
Adão entrou no mundo através da morte. Na visão bíblica, Adão é o pai da morte.
Na visão do evolucionismo teísta, a morte é o pai de
Adão. A diferença é fortíssima. Essa monstruosidade, de acordo com a teologia
do BioLogos, não possui conexão com o pecado humano. Criaturas fofas sempre
morreram, muitas delas dolorosamente. E Deus chamou isso de ‘bom’.”
Problemas
filosóficos e científicos no modelo evolucionista teísta
Quanto ao problema da suposta
“harmonização” da Bíblia com o modelo evolutivo, o astrofísico e matemático
Eduardo Lütz, palestrante da Sociedade Criacionista Brasileira, afirma em
entrevista ao blog Criacionismo:
“É uma tentativa de união
de duas coisas incompatíveis. Isso só pode ser feito
pela descaracterização de uma das componentes. A componente que tem sido
descaracterizada é a Bíblia. Além disso, não se trata de tentar harmonizar
Bíblia e Ciência por dois motivos. Primeiro, porque desautorizar
afirmações bíblicas não pode fazer parte da
harmonização de qualquer coisa com a Bíblia. Segundo, porque evolução
darwiniana não é Ciência. É uma estrutura conceitual específica o suficiente
para ser filosoficamente atraente e vaga o suficiente para que possamos
encaixar nela virtualmente qualquer coisa e depois dizer que tudo é evidência
de que a ideia estava certa. Não há uma formalização matemática fundamental e
geral desse modelo conceitual, apenas pequenos modelos aqui e ali para tratar
de temas periféricos. Ciência é uma caixa de ferramentas matemáticas das quais
Darwin não fez uso para montar seu esquema filosófico.”
De fato, Lütz tem razão quando afirma
que sempre, quando há uma tentativa de “harmonizar” a Bíblia com um falso tipo
de ciência, uma das componentes é descaracterizada; na verdade, quando a
proposta evolucionista teísta está no cerne dessa tentativa, curiosamente é a
Bíblia que acaba sendo descaracterizada. Podemos ver essa situação sendo
admitida em uma matéria no site da ABC2 intitulada “Novos livros da Série Ciência e Fé Cristã”, que
trata de um dos seus livros recém-lançado:
“AlisterMcGrath mostra como a fé
cristã se adaptou ao darwinismo e pergunta se há um lugar para o design tanto no mundo da ciência como no
mundo da teologia.”
Diante disso, fico a pensar: Que
audácia, né?
Problemas
teológicos no modelo evolucionista teísta
Como vimos no texto anterior, essa
proposta é perigosa, pois retira a autoridade e
integridade bíblicas, desfaz todo o significado da redenção em Cristo e acaba
por derrubar toda a mensagem bíblica posterior; em relação a isso, podemos
comparar esse processo com aquela brincadeira de empilhar peças de dominó e
empurrar apenas a primeira, o que faz com que todas as demais peças caiam por
terra.
Um dos pilares da doutrina da
salvação é a criação especial; conforme a interpretação literal que o texto
exige, qualquer interpretação que não seja essa é forçar o texto a dizer o que
ele não diz. Quer um exemplo? Por que Jesus teria que morrer numa cruz pela
humanidade “caída” se essa humanidade, de fato, não tivesse caído em pecado
como o texto diz? Esse Jesus teria morrido em vão, certo?
E quanto às menções no Novo
Testamento que reiteram a historicidade dos primeiros onze capítulos de
Gênesis? Jesus Cristo e Seus apóstolos referiram-se ao relato de Gênesis como
factual e não como alegórico. Jesus fez menção aos eventos dos primeiros
capítulos de Gênesis (Mateus 19:4 e 24:37) como fato e não alegoria. Além de
Cristo, o próprio Deus Pai atestou a historicidade do livro de Gênesis (Êxodo
20:11).
O apóstolo Paulo nos diz que a morte
surgiu por causa do pecado (e não que a morte fosse o resultado de erros e
acertos ao longo de bilhões de anos por meio de seleção natural agindo sobre
mutações aleatórias e sobrevivência do mais apto). Podemos ver isso em Romanos
5:12-21, onde nos é apresentada uma descrição literal da entrada do pecado e da
morte no planeta por meio de Adão e a solução para esse problema em Cristo (ver
também 1 Coríntios 15:21, 22, 45; 2 Coríntios 11:3; 1 Timóteo 2:13, 14).
Pedro também foi outro apóstolo que
entendia os eventos descritos em Gênesis como sendo
reais (2 Pedro 2:5 e 3:6). E, para finalizar, Judas, também disse o seguinte:
“Quanto a estes foi que também profetizou Enoque, o sétimo depois de Adão,
dizendo: Eis que veio o Senhor entre Suas santas miríades” (Judas 1:14).
O
ataque silencioso, quase imperceptível contra o criacionismo
Em um artigo traduzido e publicado no
site da ABC2, intitulado “O Deus das ondas gravitacionais”, a autora faz o
seguinte comentário acerca dos criacionistas:
“Um criacionista acredita que a
teoria da evolução é insidiosa porque, à sua maneira de pensar, se
aceitarmos a ideia de que a vida surgiu a partir da ‘sopa primordial’ e
evoluiu para os seres humanos, como podemos reivindicar que ela foi criada
por um Criador divino? Esse tipo de raciocínio surge com tanta frequência que o
apelidamos de o ‘Deus das lacunas’. Para os cristãos, o problema de
raciocínio com o ‘Deus-das-lacunas’ é que ele coloca a ciência e a fé uma
contra a outra.”
Nada mais longe da verdade. Isso
porque criacionistas entendem, a partir de Romanos 1:19 e 20 e outras
evidências escriturísticas, que tanto a Bíblia quanto o livro da natureza (e a
verdadeira ciência) nunca entram em contradição, pelo contrário, ambos nos
levam a conhecer mais sobre o Criador e Sua forma de agir neste mundo; por
outro lado, a “ciência” a que ela está se referindo, um tipo falso de ciência
fundamentado em pressupostos filosóficos naturalistas, baseado em um ínfimo
agregado de dados frágeis e contestáveis, essa, sim,
de fato, não é possível ser harmonizada com a Bíblia e, por conta disso, estará
sempre em caminhos opostos à Palavra de Deus. Por outro lado, em vez de
Deus-das-lacunas, poderíamos utilizar a mesma estratégia e rotular o modelo
evolucionista como o “Darwin-das-lacunas” ou “milhões e milhões de
anos-das-lacunas”, que é o que tem supostamente preenchido as contas acerca da
origem da vida a partir da perspectiva evolutiva; porém, essa conta, na
realidade, nunca fecha.
Outra matéria traduzida e publicada
no site da ABC2 intitulada “Escritura, Ciência e Hermenêutica” vai além, parte para
o ataque e diz o seguinte quanto à forma de interpretação literal dos
criacionistas:
“Não é de se estranhar que invenções
semiteológicas como o criacionismo científico são concebidas a partir desse
tipo de ‘química’ teológica e frequentemente entram em contradição com o mundo
acadêmico.”
Seria ingenuidade ou simplesmente
desonestidade intelectual? Vale a pena lembrar-lhes, caso desconheçam realmente
fatos básicos da História da Ciência, que o criacionismo científico aceito
pelos pais da ciência foi o trampolim para a verdadeira revolução científica.
(Para quem quiser saber mais, recomendo alguns artigos: aqui e aqui.)
Se não bastasse, em entrevista ao
site da ABC2, Guilherme de Carvalho, vice-presidente da instituição, quando
questionado se a teoria da evolução é incompatível com a cosmovisão cristã,
afirmou:
“Eu mesmo me descrevo como
criacionista evolucionário [...] e aceito a HNE [História Natural Evolucionária].”
Em seguida, quando questionado se a
teoria da evolução não levaria à incredulidade e à apostasia, o vice-presidente
da ABC2 não poupou palavras ao atacar o criacionismo:
“Temo que o ‘criacionismo-da-Terra-jovem’ seja
não o salvador, mas o responsável pela alienação de muitos cientistas em
relação à fé cristã, e de muitos jovens cristãos aspirantes à ciência.
Certamente muitos falham em manter a ousadia cristã diante da oposição secular;
mas para vários o problema é antes o sentimento de não poderem honestamente
abandonar a ciência moderna em favor de um criacionismo científico com
credenciais questionáveis. O fato é que a identificação desnecessária de uma fé
genuína com o criacionismo científico torna a solução do dilema algo impossível
para muitos jovens universitários. E assim eles ganham mais uma razão para
abandonar a igreja. O que acontece, na minha opinião, é que o criacionismo
científico torna-se involuntariamente aliado dos naturalistas e neoateístas, quando
concorda com eles sobre a absoluta incompatibilidade entre a biologia
evolucionária e a fé evangélica.”
No caso, percebo uma incoerência e
uma manobra estranha e desesperada em virar o jogo contra os criacionistas a
fim de conseguir espaço para o evoteísmo nas igrejas evangélicas. “Criacionismo com credenciais questionáveis”? De onde você
tirou isso, senhor vice-presidente da ABC2? Qual é sua real intenção?
Bom, quanto à questão de o
criacionismo ser aliado dos naturalistas e neoateístas, o fato é que a biologia
evolucionária (ciência histórica baseada no naturalismo filosófico), conforme
classificado pelo próprio biólogo evolutivo Ernst Mayr, ao contrário da
biologia funcional/observacional, é caracterizada por cenários imaginários e
narrativas hipotéticas nas quais a experimentação não ocorre. Portanto, neste
caso específico, concordamos com o senhor vice-presidente da ABC2, ao ele
afirmar que há uma absoluta incompatibilidade entre biologia evolucionária
(histórica) e a fé evangélica.