sexta-feira, setembro 20, 2019

A Pré-História em filmes: "O Bom Dinossauro"

Em diversas áreas do conhecimento existe uma espécie de círculo viciante que nos empurra a pré-definir algumas coisas. Quando eu falo de dinossauros, a agressividade e a violência desses animais já me vêm a mente. E, assim, o cinema deu aquele "empurrãozinho" para nos viciar em certas ideias que muitas vezes são visões opostas do que de fato ocorreu. No exemplo dos dinossauros, os animais selvagens atualmente não se comportam da forma que vemos nos filmes. Grande parte deles nem carnívora era. Desconstruir a ideia de "dinossauros são do mal" dá muito trabalho. Existem vários conceitos pré-formados que insistem em estampar a capa dos livros. A "evolução do homem" é um dos grandes exemplos. A tentativa constante de "macaquizar" o homem e humanizar os macacos está sempre na mídia.

Decidimos comentar alguns filmes que retratam a Pré-História e falar sobre alguns pontos desses círculos viciantes. Segundo Kindersley:[1]

"A Pré-História corresponde ao período da História que antecede a invenção da escrita, desde o começo dos tempos históricos registrados até aproximadamente 3500 a.C. É estudada pela antropologia, arqueologia e paleontologia."

Assim, podemos entender que a Pré-História se deu em momentos diferentes nos continentes. Quando os portugueses chegaram a nossas praias, encontraram o continente vivendo uma pré-história. Porém, na Europa e Ásia a pré-história já tinha ficado para trás dezenas de séculos antes.

Nas palestras do Onze de Gênesis, fizemos uma sequência de seis semanas, comentando filmes da Pré-História sob a ótica criacionista. Os detalhes que separei flertam com a cosmovisão criacionista e por isso achei interessante colocar essas cartas sobre a mesa para debate. Separei os seguintes filmes:

A Era do Gelo (2002) 
Apocalypto (2006) 
10.000 a.C. (2008) 
Os Croods (2013) 
O Bom Dinossauro (2015) 
Alfa (2018)

Claro que existem muitos outros bons, como o "Ao: The Last Hunter", ou a série "Elo Perdido", mas focamos em filmes mais populares. O primeiro dessa série é o filme "O Bom Dinossauro".

Numa linha do tempo alternativa, os dinossauros escaparam da extinção quando o asteroide passou diretamente pela Terra, sem atingi-la. Milhões de anos mais tarde, numa fazenda, um casal de Apatossauros agricultores, Henry e Ida, tem três filhos de 11 anos: Buck, Libby, e o último a chocar, Arlo. As crianças têm que deixar sua marca no silo da fazenda por algo grande que fizeram.

1. Extinção dos dinossauros

Cena do filme que mostra o meteoro que extinguiu os dinossauros errando a rota de colisão com a Terra

Na narrativa do filme, a extinção dos dinossauros dada por um impacto de asteroide não acontece. O comentário que quero destacar aqui neste trecho é o fato de a maioria dos paleontólogos concordar que houve uma extinção em massa no fim do período Cretáceo.  A teoria que é mais aceita pela comunidade científica é a de que um asteroide com aproximadamente 10 km de diâmetro tenha atingido a superfície da Terra, gerando uma explosão semelhante a 100 trilhões de toneladas de TNT.[2] Outra teoria é a de que certos movimentos sofridos pelos continentes provocaram mudanças nas correntes marítimas e também no clima do planeta. Isso fez a temperatura baixar, o que causou invernos mais rigorosos, consequentemente levando ao desaparecimento dos seres vivos que habitavam a Terra.[3]

Sob o ponto de vista criacionista, dinossauros existiram, foram criados por Deus e desapareceram da face da Terra. Um dos motivos do desaparecimento dos dinossauros pode ter sido o dilúvio bíblico, como é defendido por alguns criacionistas. O dilúvio bíblico e o grande asteroide que atingiu a Terra no fim do Cretáceo parecem ser eventos diferentes, mas podemos traçar uma convergência de dados. O evento pode ter sido o mesmo, narrado sob óticas diferentes.

Sobre o modelo da extinção dos dinossauros, Everton Alves escreveu:[4]
O modelo criacionista prevê que apenas um meteorito provavelmente não seria capaz disso nem responderia pela existência de tantos fósseis no mundo inteiro. Mas pense numa enxurrada de meteoritos caindo em terra e mar há bem menos tempo do que supõe a esticada cronologia evolutiva. Os que caíram na terra acabaram rachando a crosta, dando origem aos deslocamentos de placas tectônicas, aos terremotos e aos derrames de lavas. Os que caíram em mar poderiam gerar tsunamis de centenas de metros de altura, varrendo os continentes e destruindo tudo pela frente, sepultando quantidades incríveis de rochas, plantas e animais.
Então, tanto criacionistas quanto evolucionistas podem estar narrando o mesmo evento no caso da extinção dos dinossauros.

2. Montanhas e gelo

Cena do filme que mostra altas montanhas com gelo

O filme retrata a Terra antes do dilúvio, e no modelo criacionista a geologia do planeta é bem diferente dessa cena. Não há altas montanhas e existe um clima ameno. A Terra era uma grande estufa, havia um só continente com pequenas elevações. As grandes montanhas e formações com gelo são previstas apenas após o dilúvio.

Cena do filme que mostra altas montanhas com gelo

O dilúvio realizou um grande trabalho geológico. Corroer sedimentos aqui, reposicioná-los ali, elevar continentes, elevar planaltos, desnudar terrenos, etc., para que a Terra hoje fosse bem diferente de antes. Hoje, mesmo as cadeias de montanhas se elevam acima do mar.[5] A Bíblia relata que todas as montanhas foram cobertas; montanhas que existiam no momento do dilúvio, pois as montanhas atuais não existiam. Na geologia atual, algumas montanhas perderam altitude nos últimos anos e outras ganham a cada ano. Então, comparando a cena do filme com o cenário criacionista, vale a pena entender que de fato isso não ocorreu nesse período.

3. Dieta vegetariana

Cena do filme que mostra o humano caçando insetos para alimentar o dinossauro.


Cena do filme que mostra o humano caçando animais para alimentar o dinossauro

Cena do filme que mostra o dinossauro aceitando a dieta vegetariana

No filme, o personagem principal é um apatossauro. O apatossauro (do grego "lagarto enganoso") viveu na América do Norte durante o período Jurássico, e esse dinossauro saurópode chegava, em média, a mais de 23 metros de comprimento e 30 toneladas. O apatossauro se alimentava de plantas como samambaias, cavalinhas e gimnospermas, e devia comer em torno de 400 kg de vegetação por dia, engolindo junto pequenas pedras para ajudar a moer o alimento (gastrólitos).

Logicamente que o personagem do filme não comeria nada diferente da sua dieta. Mas o curioso é que, quando vemos os filmes de dinossauros, os ditos carnívoros é que chamam mais atenção. Eles são indômitos e saem devorando tudo o que está na frente deles. Será mesmo que os animais na natureza expressam esse comportamento?

Grande parte dos dinossauros era herbívora. Até alguns terópodes (família dos tiranossauros) eram herbívoros. Um estudo de paleontólogos americanos do Museu Field, em Chicago, indica que a maior parte dos dinossauros terópodes, exceto pelo Tiranossauro Rex e pelo Velociraptor, era herbívora e não carnívora, como se acreditava.[6]

Lindsay Zanno e Peter Makovicky concluíram com base em análises estatísticas que o regime alimentar de 90 espécies de dinossauros terópodes era constituído por plantas. Esses resultados contradizem a visão comum entre os paleontólogos de que quase todos os dinossauros terópodes caçavam para se alimentar, especialmente os antepassados mais próximos das aves.

"Grande parte dos terópodes estava claramente adaptada a uma vida de predador mas, em certo momento da evolução até as aves, esses dinossauros se tornaram herbívoros", explicou Lindsay Zanno. Os dois pesquisadores encontraram cerca de meia-dúzia de traços anatômicos que, estatisticamente, ligam a maior parte dos terópodes ao comportamento herbívoro, incluindo um bico desprovido de dentes.

Aplicando essa análise, os pesquisadores determinaram que 44% dos terópodes, distribuídos em seis grandes linhagens, eram herbívoros. Já que o número de terópodes herbívoros era tão importante, super-carnívoros como o Tiranossauro rex e o Velociraptor deveriam ser vistos "mais como uma exceção do que como uma regra", concluem os pesquisadores.

4. Serpente com patas

Cena do filme que mostra a serpente com patas



Logo nos vem a mente a narrativa bíblica, onde a punição da serpente foi de rastejar sobre o próprio ventre. Em Gênesis 3:14, 15 lemos:
“Porque fizeste isso, serás maldita entre todos os animais e feras dos campos; andarás de rastos sobre o teu ventre e comerás o pó todos os dias de tua vida. Porei ódio entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a dela. Esta te ferirá a cabeça, e tu ferirás o calcanhar.”
A maioria dos cristãos tenta imaginar o que era esse animal chamado de serpente. Alguns tentam especular o fato de as serpentes terem pernas e as perdido após a punição de Deus.

O fato é que temos evidências de serpentes com patas no registro fóssil. O fóssil, encontrado na Formação Crato, na Bacia do Araripe, interior do Ceará, está circundado por fezes de peixes igualmente fossilizadas, o que sugere que o animal morreu soterrado por água e lama. Segundo os pesquisadores, essa cobra de quatro patas vivia no supercontinente Gondwana, integrante da parte sul da Pangea. Leia mais sobre isso aqui.

No entanto, algo mais real pode estar por trás disso. A serpente do Éden poderia ter patas ou poderia ter asas. Praticamente todas as culturas do mundo referenciaram monstros sobrenaturais em seus contos folclóricos - e alguns desses monstros assumem a forma de répteis escamosos, alados e que cospem fogo. "Dragões", como são conhecidos no oeste, geralmente são retratados como enormes, perigosos e ferozmente antissociais, e quase sempre acabam sendo mortos pelo proverbial "cavaleiro de armadura brilhante" ao fim de um ataque violento. 

Antes de explorarmos o vínculo entre dragões e dinossauros, é importante estabelecer exatamente o que é um dragão. A palavra "dragão" vem do grego dracon, que significa "serpente" ou "cobra d'água" - e, de fato, os primeiros dragões mitológicos se parecem mais com cobras do que com dinossauros ou pterossauros (répteis voadores). Também é importante reconhecer que os dragões não são exclusivos da tradição ocidental; esses monstros aparecem fortemente na mitologia asiática, onde recebem o nome chinês de "longo".

A serpente do Éden era um dragão? Um dinossauro? Ou uma espécie de serpente extinta? Leia mais sobre isso em nosso texto sobre o dragão de Da Vinci.

5. Pterossauros

Cena do filme que mostra os pterossauros caçadores

Nessa parte do bate-papo abordamos a grande verdade que a maioria dos espectadores não sabe: pterossauros não eram dinossauros. Eram répteis voadores. E sempre trago algumas curiosidades sobre esses animais lindos. Uma delas é que a região onde eu moro (Sul do Brasil) é rica em fósseis de pterossauros.

O pterossauro Keresdrakon vilsoni, o mais recente deles, foi apresentado em um artigo publicado em agosto de 2019 na revista da Academia Brasileira de Ciências. Segundo os paleontólogos, o pterossauro viveu "em um ambiente desértico periférico, onde existiam oásis com água e certa vegetação".

Keresdrakon é a junção de "keres", que, segundo a mitologia Grega, são espíritos que personificaram a morte violenta e estão associados à fatalidade; e "drakon", palavra para dragão no grego antigo. Já vilsoni foi uma homenagem a Vilson Greinert, um voluntário que dedicou centenas de horas preparando a maioria dos espécimes do "cemitério dos pterossauros" que fazem parte do acervo do Cenpaleo.

6. Tiranossauros bonzinhos

Cena do filme que mostra os tiranossauros bonzinhos

Nesta parte do filme vemos a interação do personagem principal com os tiranossauros. E para minha surpresa, não contribuíram com a má fama dos tiranossauros. No filme, eles são bonzinhos e ajudam o apatossauro a voltar para casa. Claro que eles cuidam da "comida", que é o "gado". São carnívoros, mas não demonstram aquele comportamento voraz, destruidor a que estamos acostumados.

Temos que desconstruir a imagem da agressividade extrema desses animais. Deus criou tudo bom e perfeito, e após o pecado muitas deformidades vieram a acontecer na criação. Não conseguimos ainda determinar direito como isso ocorreu, mas, comparando com os animais selvagens atuais, é fato que o cinema ás vezes exagera.

Cena do filme que mostra o "gado" cuidado pelos tiranossauros

8. Raptores emplumados

Raptores emplumados

Nessa cena representaram os raptores com algumas plumas saindo da cauda. E, de fato,  encontramos isso no registro fóssil. Existiram dinossauros com penas.

Para a cosmovisão criacionista, existe um fator que é discutido com polêmica. O fato de se admitir que dinossauros tinham penas pode corroborar com a evolução de dinossauros para aves. No entanto, isso é uma falsa premissa. Existiam répteis emplumados, e as aves fazem parte de outra categoria. É comum os seres vivos compartilharem características. E isso não comprova a macroevolução, mas comprova o design comum.

Cena do filme que mostra aves vivendo com dinossauros

Encontramos no registro fóssil aves vivendo com os dinossauros, e até antes de alguns deles.[7] Não encontramos de forma contundente no registro fóssil essa transição de dinossauros para aves. Não temos muitos fósseis dessa época na América do Norte, e menos ainda apresentam características que nos dão uma boa ideia de como eram na vida, mas sabemos que eles definitivamente existiam de alguma forma. O oxpickers, nativos da África, são especializados em comer parasitas sugadores de sangue de animais grandes, é um exemplo de ave que se acredita habitou com os dinossauros.

Na cosmovisão criacionista, cremos que Deus criou todos os seres vivos com aporte necessário para sofrer mutações. No entanto, dentro da mesma família. Sem saltos evolutivos que mudariam a espécie/família. Então, as aves variam e continuam aves. Dinossauros variam e continuam dinossauros. Algumas estruturas (como escamas, garras e penas) são compartilhadas.

Alex Kretzschmar

Referência:

[1] Série de autores e consultores, Dorling Kindersley, History (título original), 2007, ISBN 978-989-550-607-1, pág 15 

[2] Hildebrand AR, Pilkington M, Connors M, Ortiz-Aleman C, Chavez RE. Size and structure of the Chicxulub crater revealed by horizontal gravity gradients and cenotes. Nature. 2002; 376:415-417. 

[3] Price GD, Nunn EV. Valanginianisotopevariation in glendonitesandbelemnitesfromArctic Svalbard: Transient glacial temperaturesduringtheCretaceousgreenhouse. Geology. 2010;38(3):251-254. 

[4] ALVES, Everton Fernando; BORGES, Michelson. A extinção dos dinossauros: semelhanças entre as propostas evolucionista e criacionista. In:________. Revisitando as Origens. Maringá: Editorial NumarSCB, 2018, p.79-87. 

[5] Batten, D. (Ed.), Catchpoole, D. , Sarfati, J. e Wieland, C., Capítulo 11, E a deriva continental? O Livro de Respostas da Criação , Publicadores de Livros da Criação, 2006. 

[6] Lindsay E. Zanno e Peter J. Makovicky. Ecomorfologia herbívora e padrões de especialização na evolução de dinossauros terópodes . Anais da Academia Nacional de Ciências , 2010; DOI: 10.1073 / pnas.1011924108 

[7] Xing, Lida, et al. “Reanálise de Wupus Agilis (início do Cretáceo) de Chongqing, China, como um grande traço aviário: diferenciando entre grandes faixas de aves e pequenas faixas de terópodes não aviárias.” Plos One, vol. 10, n. 5, 2015, doi: 10.1371 / journal.pone.0124039.