Quando ingressei na Colômbia, sonhava em alcançar duas cidades: Bogotá e Medellin. Depois que conquistei Medellin, fixei meu alvo no caminho mais curto que me permitisse chegar ao Panamá. Havia um em direção a Cartagena. Mais longo e vigiado todo tempo pelo exército colombiano. O outro seguia em direção de uma cidade chamada Turbo – praticamente a metade da distância e que me deixaria em um porto bem próximo do Panamá. No entanto, esse caminho é considerado como “zona vermelha”, ou seja, região onde existe ação terrorista das Farc. Aliás, Farc quer dizer Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia. Sua criação se deu em 1964, apenas como uma guerrilha revolucionária do Partido Comunista Colombiano. As Farc são uma das mais capacitadas, equipadas e a mais antiga das forças insurgentes do continente sul-americano. Tem de 12.000 a 18.000 membros e mantém presença em aproximadamente 80% do território colombiano, comandando grande parte dele, a maioria em florestas e selvas a sudeste da base das montanhas dos Andes.
Segundo o governo norte-americano, as Farc obtêm financiamento principalmente por meio de extorsões, sequestros e tráfico de drogas. Muitos combatentes e informantes das Farc são menores – estima-se que cerca de 20 a 30 por cento tenham menos de 18 anos. Todavia, posso também dizer, depois de concluir esta travessia, que este país foi invadido e ocupado estrategicamente por outro exército bem mais poderoso do que as Farc e as Forças Armadas: o exército celestial, cujo comandante-chefe é meu amigo e Criador do Universo, Jesus Cristo.
Por isso digo que o sufoco está passando. Cheguei a Turbo após cruzar de bicicleta todo o território colombiano. Para alcançar essa cidade portuária onde terminam as estradas da Colômbia em direção ao Panamá, foi necessário percorrer 1.580 km. Foi muito complicado galgar o pico das montanhas das Cordilheiras dos Andes Oriental, Central e Ocidental pedalando uma bicicleta. Ainda mais com uma “gorducha”.
A Colômbia é o único país da América do Sul cortado por esses três belíssimos acidentes geográficos. Estive em regiões nas quais havia picos com mais de 4.000 metros de altitude e o frio era insuportável. Como não carrego mochila capaz de levar roupa mais pesada, para aquecer o corpo dependia tão somente do calor produzido pelas pedaladas. Nos momentos em que era obrigado a parar por qualquer motivo – como, por exemplo, um pneu furado –, o frio me congelava os dedos e todo o corpo. Mas, pela compaixão de Deus, raras vezes estive nessa situação. E quando ocorreu, pude suportar.
Então, se apoderou de mim um sentimento profundo de vitória quando cheguei próximo a Turbo e avistei pela primeira vez sítios e fazendas completamente planos. Agora somente olhando para sudoeste, forçando a vista é que se vê muito distante a tênue imagem cinzenta das altas montanhas das cordilheiras. Quando recordo o instante em que cruzei a fronteira da Venezuela para a Colômbia, por Cucutá, e comecei a ziguezaguear por subidas de quase 100 km, as quais me deixavam exausto para vencê-las, é quando entendo que não foram apenas os meus músculos que me fizeram chegar a Turbo. Há outro poder por trás de tudo isso.
Devo regozijar-me e louvar com toda força ao meu Criador e Redentor, o qual me fez com capacidades físicas para superar limites. O incrível também é que esta “máquina humana” vai completar meio século desde que foi criada! Isso mesmo. Os músculos que impulsionam a “gorducha” irão completar 50 anos de existência. E, logicamente, se eu fosse um atleta comum, já estaria “pendurando as chuteiras” e pensando mais em aposentar-me. Todavia, em meu sangue corre um sentimento de missão a cumprir. Só vou poder descansar após ter percorrido todos os continentes da Terra e neles visitado todos os países, divulgando o estilo adventista de vida saudável e anunciando a volta de Jesus.
Somente nesta etapa – o Projeto Atlanta –, estarei cruzando 11 países. São eles: Venezuela, Colômbia, Panamá, Costa Rica, Nicarágua, El Salvador, Honduras, Belize, Guatemala, México e Estados Unidos. Ainda estenderei esta viagem até o Canadá, depois Europa, África, Oriente, Ásia, Oceania e, por último, Austrália. Portanto, mesmo com a idade “dobrando o Cabo da Boa Esperança”, não poderei aposentar ainda meus sonhos e desafios.
Antes deste projeto, já percorri o Brasil (21.000 km) e toda a União Austral (8.200 km passando por Argentina, Uruguai e Paraguai), sempre caminhando, correndo e mais constantemente pedalando uma bicicleta, ou seja, esquadrinho os países como um desportista. Por onde passo vou semeando um rastro de esperança, de fé, de coragem, de garra e determinação e, sobretudo, de que não sou ninguém e nada posso fazer sem o Deus que está adiante de mim. Esta é a grande mensagem. Esta é a tônica básica e motivo maior de minhas viagens: pregar a verdade, dizendo para o mundo temer a Deus e dar-Lhe glória, pois se aproxima a passos largos a hora do Seu Juízo.
Essa é a maneira singela que Deus encontrou para salvar “alguns”, ou seja, enviar-me como atleta para lhes chamar a atenção, para ouvir-me, converterem-se e serem salvos.
Por isso, mesmo sem nenhuma condição, lutei para chegar a Turbo. Agora preciso descobrir como chegar por barco até o Panamá e a alguma cidade que tenha estradas a caminho de Costa Rica.
Em Turbo, fui recebido por dois irmãos adventistas. Eles estavam muito impressionados por eu estar viajando de bicicleta por seu país. Perguntaram por que não tomei um avião em Bogotá para a Cidade do Panamá. Ao saberem que eu estava sem condições financeiras para fazer esse percurso em avião, informaram que as passagens em barco até o Panamá, apesar de serem mais em conta, também não são tão baratas, e é necessário apresentar 600 dólares em espécie (dinheiro vivo) ao serviço de imigração para ter acesso ao território panamenho.
Por isso, saíram logo com a pergunta: “Irmão, quanto você tem em mãos, em dólares, para sua viagem até Puerto Obaldia, primeira cidade panamenha do outro lado?” Respondi: “Irmãos, não tenho dólares. Apenas alguns bolivares (moeda colombiana).” Dito isso, entreguei-lhes todo o dinheiro das ofertas recebidas das igrejas e que não havia gasto até aquele momento. O irmão Cesar Royas fez a contagem e, com a ajuda de uma calculadora, fez a conversão para dólares americanos. Muito surpreso, disse:
“Irmão George, você só dispõe de 52 dólares. Com este dinheiro não dá para viajar até o Panamá. Você terá que viajar daqui até uma cidade chamada Capurgana e ali pegar outra lancha até Puerto Obaldia, onde deverá receber o visto de entrada e ainda outra lancha até Miramar, que é o porto onde existe estrada ligando o resto do país. Só a primeira parte da viagem custa 50 dólares, sem direito a comida. É impossível o que você pretende fazer! São necessários quase mil dólares para se chegar ao Panamá em condições de ingressar no país. A igreja local é pobre, não temos como lhe ajudar. Você deve buscar ajuda com seus irmãos brasileiros. Há muitos adventistas ricos no Brasil. Se você não tiver apoio financeiro, aqui é o fim desse seu sonho de chegar a Atlanta.”
Após escutar atento as orientações, percebi que havia chegado a um beco sem saída. Não tinha recursos para continuar a viagem e muito menos para regressar ao Brasil. Havendo estradas, eu vou até o fim do mundo com muito pouco. Porém, quando sou obrigado a utilizar outro meio de transporte, quer seja barco, ônibus ou avião, a situação se complica porque os gastos aumentam e não tenho um patrocinador que banque despesas de grande vulto. O dinheiro da minha aposentadoria mantém minha esposa e filhos no Brasil.
Estou com um problema de difícil solução... Onde conseguir mil dólares (600 para apresentar ao serviço de imigração para o carimbo do passaporte e outros 400 para pagar passagens em barcos, comida e hotéis nas vilas portuárias até ingressar no Panamá?
Enquanto o irmão Cezar coçava a cabeça e repetia que não tinha meios de me ajudar, eu orava e a comunhão com Deus dava-me a certeza de que de alguma forma iria sair dessa situação.
Então, passados alguns minutos, meu anfitrião da igreja adventista em Turbo me disse que há uma única alternativa para que eu continue avançando rumo ao Panamá: terei que tomar um barco em direção a um povoado marítimo chamado Unguia e dali seguir por trilhas até outra cidade chamada Acandi. No entanto, ele me advertiu de que ninguém faz esse caminho em bicicleta por ser muito perigoso. Além do risco de se perder (uma vez que é preciso passar por rios, trilhas na selva, cortar por fazendas), corre-se o risco de assaltos e sequestro.
Ah, Senhor, o que devo fazer? Um único caminho. Uma única alternativa para seguir viajando. Lembro-me da Tua Sagrada Escritura que diz assim: “Entrai pela porta estreita, pois largo e espaçoso é o caminho que conduz à perdição.” Ou seja, há muitas direções, mas apenas uma deixa na entrada do Céu.
Deus meu, se não tenho outro rumo para alcançar o Panamá, seguirei por esse estreito, espinhoso e perigoso caminho. Venha, Senhor dos Exércitos! Passe adiante de mim mais esta vez. Avancemos juntos!
Duas horas após essas meditações, depois do pagamento de 25 dólares por mim e mais 15 pela “gorducha”, estava embarcando em uma “palanca” (lancha pequena) na direção de Unguia.
Não sei o que me espera do outro lado. Todavia, de algo tenho certeza: Deus vai adiante de mim.
Meu nome é George Silva. Meu apelido: Atleta da Fé. Triatleta brasileiro viajando sobre duas rodas para os Estados Unidos. Sou um “caçador”. Um “caçador celeste”.
Vamos juntos. Embarque comigo nestes relatos. Viva o que estou passando. Sinta o que tem feito o Deus a quem sirvo, pois Ele está aqui. Venha comigo. Atlanta nos espera!
(George Silva de Souza, atleta e autor livro Conquistando o Brasil)
Nota: O Atleta da Fé, George Silva, está enfrentando grandes dificuldades financeiras para prosseguir nessa missão esportivo-evangelística e precisa urgentemente fazer uma revisão na bicicleta. Ele não me pediu isso, mas eu convido: se você puder colaborar de alguma maneira, escreva para ele: georgepalestras@yahoo.com.br