A
revista Veja da semana passada publicou
uma entrevista interessante com a jornalista inglesa especializada em ciência
Angela Saini, aproveitando como “gancho” o lançamento do livro dela, Inferior: How Science Got Women Wrong
(Inferior: Como a ciência se enganou com as mulheres, em tradução livre). Saini
afirma que a ciência nasceu dentro de um contexto cultural em que a mulher era
vista de forma diferente do homem, em uma sociedade sexista que fragilizava e
inferiorizava o feminino. “Então, não é surpreendente que a ciência tenha
seguido o mesmo caminho, reproduzindo estereótipos e baseando seus estudos em
suposições herdadas da sociedade”, diz ela, deixando claro que, a despeito de
sua especialização, não compreende o que é ciência. Mas tem mais: Saini também
não compreende a religião bíblica.
Quando
lhe foi perguntado se a forma como a religião retrata a mulher influenciou a
ciência supostamente sexista, ela respondeu que sim, e definiu a religião que,
para ela, é machista: “Adão e Eva foram a fonte primária de informação sobre a
relação entre homem e mulher para o mundo cristão.” Para ela, a história do
primeiro casal reforçaria o estereótipo da mulher como segundo elemento. Mas de
onde ela tirou essa ideia? Escolher o relato da criação foi um tiro no pé em
seu discurso feminista. Se ela ainda tivesse usado passagens bíblicas pós-pecado
que refletem a ascensão diabólica do machismo e a subjugação da mulher por
homens pecadores, ainda daria para compreender (deixando de lado o fato de que
quando a Bíblia descreve aspectos culturais reprováveis não significa que Deus
os esteja aprovando).
No
relato bíblico da criação fica evidente que a mulher – a obra-prima de Deus, o
último ser criado em uma ordem crescente de relevância e complexidade – é tão
importante quanto o homem, embora ambos tivessem (e ainda têm) funções
diferentes. O fato de ser usada no relato a palavra “ajudadora” ou “adjutora
idônea” não diminui em nada a esposa de Adão. Na verdade, a expressão original hebraica
ezer kenegdo também é aplicada a Deus
como nosso ajudador. Isso significa
que o Senhor é inferior a nós? Claro que não!
Infelizmente,
Saini parece entender pouco de Bíblia e menos ainda de ciência. Como é muito
comum, ela confunde ciência com filosofia ou paradigmas, e pensa que as
afirmações dos cientistas equivalem à ciência. Esta é uma confusão recorrente: atribui-se
à ciência coisas que os cientistas dizem. A ciência não diz nada. Ciência é uma
caixa de ferramentas que usamos para compreender o mundo que nos rodeia. Ciência não é uma invenção humana. Não foi inventada.
Foi descoberta.
A
própria Saini dá um exemplo interessante na entrevista, que ajuda a compreender
a diferença entre ciência e paradigma filosófico. Ela conta que em 2013 um
grupo de cientistas da Universidade McMaster publicou um artigo sobre a origem
da menopausa no qual afirmam que a mulher deixa de menstruar na meia-idade
porque os homens não mais as consideram atraentes, sendo, então, a menopausa um
efeito evolutivo da falta de atração masculina por mulheres mais velhas. Para
rebater essa pesquisa, a jornalista cita o trabalho de outro evolucionista, o
biólogo George Williams. Para ele, a menopausa surgiu em nossa espécie como um
mecanismo para proteger as mulheres mais velhas dos riscos do parto. O que há
de ciência nessas afirmações? Praticamente nada. São meras opiniões
evolucionistas que mostram uma casa dividida.
Para
ser justo, Saini acerta no alvo em um ponto: quando afirma que Charles Darwin
foi o cientista que causou mais dano para a percepção dos cientistas em relação
à mulher. Isso porque o naturalista inglês afirmou categoricamente sem base
alguma que a mulher seria naturalmente inferior ao homem, sustentando que as mulheres estavam atrás dos homens na escala
evolutiva. Por não fazer ciência de verdade, Darwin deixou de considerar o
contexto social de seu tempo, que impedia as mulheres de terem acesso à
educação, à informação, à possibilidade de participar das descobertas
científicas da época, etc. “O poder [das ideias de Darwin] e seu status fizeram com que suas teses
embasassem muitos trabalhos de cientistas nos séculos seguintes”, diz Saini,
sem perceber que, na verdade, está reconhecendo que o darwinismo contaminou
muitas áreas do saber, influenciando filosoficamente inúmeras pesquisas e
trabalhos.
Ao
responder à última pergunta da entrevista, Saini diz que “o que feminismo está
fazendo com a ciência é melhorá-la, confrontá-la. O feminismo tem ajudado a
questionar estereótipos que são, justamente, irracionalidades que faziam parte
da ciência”. Errado, pois, como eu já disse, a ciência não é machista nem
feminista. Machistas ou feministas são os cientistas. Assim como Deus e a
Bíblia não são machistas nem feministas. Machistas e feministas são as pessoas
e as culturas retratadas na história bíblica.
Esses
são os verdadeiros estereótipos que precisam ser derrubados. Mas não serão
graças ao feminismo radical ou a qualquer outro ismo. Serão derrubados pela verdadeira religião e pela verdadeira
ciência – quando as pessoas estiverem dispostas a compreendê-las.
Michelson Borges