Por uma
ironia do destino, uma das primeiras pessoas a levantar a questão de onde
vieram os habitantes do continente americano foi um padre jesuíta chamado José
de Acosta, naturalista e antropólogo, nascido em Medina del Campo, em 1539 (Encyclopaedia Britannica, 2018).
Ele visitou o Peru e o México, e escreveu em seu livro Historia natural
y moral de las Indias:
“Ficamos, sem
dúvida, obrigados a confessar que homens da Europa, Ásia ou África passaram por
aqui (na América); porém, como e por qual caminho vieram ainda é uma pergunta
que fazemos e desejamos saber. O certo é que não houve outra arca de Noé para
trazê-los às Índias, nem muito menos que um anjo os trouxe pendurados pelos
cabelos.” (de Acosta, 1590, p. 57).
Um fato
histórico é simplesmente um acontecimento até ser estudado e interpretado. Essa
interpretação é o passo mais importante, porque dependendo da base teórica
poderemos entender ou não o que aconteceu. Diante disso, este artigo não é
nenhuma novidade. Os autores não estão apostando em uma nova teoria. O que
mostramos aqui são fatos. Evidências históricas não podem ser refutadas. Podem,
sim, ser reinterpretadas ou ignoradas.
Hoje, nas
ditas “ciências” modernas, tem se ignorado ou silenciado de modo sistemático
muitas evidências históricas que de alguma forma contradizem os paradigmas
“modernos”.
Essas “novas ciências” surgem após o século 15 e negam
seletivamente toda verdade descoberta em parceria com a religião —
especialmente se for a religião cristã. Desse modo, descontrói-se todo o fazer científico.
Fatos não se negam devido a um gosto pessoal ou falta de entendimento. Fatos se
interpretam; e, se nossa interpretação não consegue explicá-los, devemos pensar
que nosso paradigma pode não ser a ferramenta ideal para entender esses fatos.
Neste artigo,
mediante evidências históricas colhidas por antigos cronistas, iremos estudar e
comentar as possíveis rotas tomadas pelos povos que colonizaram o continente
americano. É chegada a hora de discutir fatos à luz da História e suas
evidências.
Como iremos
falar de tempos e datas, nosso primeiro desafio é determinar qual deve ser o ponto
de referência na História. Acreditamos que isso seja o mais importante, porque
um fato histórico pode ser interpretado a partir de uma perspectiva marxista
(que exclui a existência de Criação) ou sob uma perspectiva verdadeiramente
histórica, e chegar à conclusão de que houve, sim, migrações recentes (no mais,
de cerca de quatro mil anos atrás) e feitas por povos cultural e tecnologicamente
avançados.
Os autores
usados aqui como referência recolheram a maior parte dos dados de homens sábios
entre os povos andinos e americanos. Surge, então, a pergunta: Os povos andinos sabiam calcular
o tempo corretamente? A resposta é sim! Eram doutos no estudo de
tempo e astronomia.
Diz o cronista
Fernando de Montesinos, em sua obra Memorias Antiguas Historiales
y Políticas del Perú: “Dizem os
amautas, que
sabiam as coisas desses tempos por tradições dos antigos comunicadas de mão em
mão que, quando esse príncipe reinava, havia letras e homens doutos nelas, que
se chamavam amautas, e estes ensinavam a ler e escrever; a principal
ciência era a astrologia.” (Montesinos,
1882, p.24).
Eles
calculavam os milênios chamando-os “sóis”; assim mencionam o “primeiro” e
“segundo” sóis: “Dicen los amautas
que el segundo ano del reinado de Manco Capac se cumplió el cuarto sol de La Creacion,
que son cuatro mil anos, poco menos, y dos mil novecientos y tantos después del
Diluvio general.” (Montesinos, 1882,
p. 77).
Tradução:
“Dizem os
amautas que o segundo ano do reinado de Manco Capac cumpriu o quarto sol da
Criação, que significa quatro mil anos, pouco menos, e dos mil novecentos e
tantos depois do dilúvio geral.”
É
interessante notar que nessa época, logo após os episódios do dilúvio e da
Torre de Babel, ou seja, segundo a perspectiva criacionista durante ou após o
início do período do gelo (ver artigo “A Atlântida e a migração para as Américas após o período do gelo”), os
descendentes de Noé já haviam migrado para as Américas. Notemos que a
nação de Israel nasce somente no fim desse milênio; portanto, acreditamos que
eles vieram para a América antes mesmo de Israel e suas tribos existirem,
isto é, antes de os hebreus estarem organizados como nação.
E sobre
o Dilúvio? O que sabemos?
O arcebispo
irlandês James Ussher (1581-1656), um famoso cronologista bíblico, estudando
muito seriamente as gerações mencionadas na Bíblia, numa demonstração de
matemática, calculou que a criação da vida no planeta teria ocorrido em 22 de
outubro de 4004 a.C., e o dilúvio teria ocorrido 1656 anos após a criação (ou 2348
a.C.). (Cooper, 2008, pp. 99 e 202). Ainda
há registros históricos de datas surpreendentemente próximas a esta calculadas
por Scaliger e pelos Maias. (Cooper,
2008, pp. 100-103).
No entanto,
nos basearemos num registro antigo (escrito em castelhano antigo), que remonta
à chegada às Américas dos colonizadores espanhóis, os quais mostravam como os
povos andinos receberam o mesmo relato dos ancestrais deles. No já mencionado
livro Memorias Antiguas Historiales y Políticas del Perú, de
autoria de Fernando de Montesinos (1593-1652), o qual esteve no Peru em 1628, é
registrado que os povos entendiam que houve um dilúvio, e que este teria
ocorrido, segundo seus ancestrais, no ano 1660 após a criação —uma data muito próxima
da que havia sido estabelecida por Usher:
“Depois de
Ophir povoar a América, instruiu seus filhos e netos no temor de Deus e na observância
da lei natural. Viveram debaixo dela por muitos anos, passando o
conhecimento do Criador de todas as coisas de pai para filhos, pelas bênçãos
recebidas, em especial pelo dilúvio, mediante o qual livrou seus progenitores.
Duraram eles muitos anos; e segundo o cálculo do manuscrito citado, seriam
quinhentos, contando os do livro. Ainda pela conta dos amautas e historiadores peruanos,
foi a partir do segundo sol [milênio] depois da criação do mundo, que
calculando o tempo pelos anos comuns, vem a ser 2000 anos, dado que foi o
último do segundo sol [milênio]; e porque ainda não tinham se cumprido esses
dois sóis [milênios] quando aconteceu o dilúvio, porque faltavam para seu
cumprimento 340 anos, segundo nossa conta mais comum, vem, de acordo com esses
amautas, a ser esse período o tempo dos ditos 340 anos.” (Montesinos, 1882, p. 3).
“Mas eles
erraram, porque Ophir, neto de Noé, disse que, quando chegou à América, depois
dos 340 anos do dilúvio, os 160 [anos] restantes eram aqueles que viveram seus
filhos, decentes no temor a Deus e ao próximo, com toda a paz, sem anciãos nem
dissensões.” (Montesinos, 1882, p. 3).
Essas
evidências históricas recolhidas por Montesinos nos situam na chamada Rota
Atlântica Antiga, que pode ser melhor visualizada no mapa ao final deste texto.
À luz dos atuais dados científicos, é fato que houve diversas migrações em diversos
momentos e por diversas rotas. Em relação a essas rotas, há indícios de que,
além de cruzarem por pontes de terra/gelo (Estreito de Bering, por exemplo),
através do Atlântico e pelos mares do norte, parte desses povos antigos veio pelo mar do
Sul (pelo Chile e Andes, vindos, talvez, da Nova Zelândia ou Austrália):
“Neste tempo,
o qual, segundo o que pude descobrir, seria 600 anos após o dilúvio, todas
essas províncias estavam cheias de moradores. Muitos vieram pelo Chile, outros
através dos Andes, outros através da Terra Firme e Mar do Sul, com a qual as
costas da ilha de Santa Elena e Puerto Viejo ao Chile foram povoadas. Isso foi
recolhido a partir dos antigos poemas e canções dos índios.” (Montesinos, 1882, p. 4).
Montesinos
também nos informa o tipo de embarcação que eles usavam para navegar (ver
Kon-Tiki, 1947): “Ele cuidou
disso para o rei e, depois de alguns dias, veio de novo e contou como haviam
desembarcado nas planícies em balsas e canoas, e que faziam uma grande frota
com um grande número de pessoas estranhas, e que iam povoando especificamente as
margens dos rios, e que homens de grande estatura passaram adiante.” (Montesinos, 1882, p. 53).
A
movimentação migratória marítima na direção contrária também se deu, e isso é
mencionado pelo autor Gregório Garcia, em seu livro Origen de los Indios
de el Nuevo Mundo, e Indias Occidentales: “Também
contam os índios de Ica e os de Arica que antigamente costumavam navegar a umas
ilhas no poente, muito longe, e que a viagem era realizada nuns couros de lobo
marinho inchados.” (Garcia, 1729,
p. 35).
Evidências
científicas atuais têm mostrado que essas rotas marítimas via oceano Pacífico
podem realmente ter acontecido bem antes das migrações às Américas via estreito
de Bering. Em 2016, por exemplo, um estudo pôs em xeque a hipótese mais aceita,
de que as primeiras migrações às Américas teriam acontecido via estreito de
Bering há 15 mil anos, segundo escala evolutiva do tempo. (Pedersen et al., 2016). De acordo com
a análise, essa rota só teria se tornado viável se houvesse um ecossistema com
plantas e animais que fornecessem alimento para os humanos que vinham da Ásia
para a América, milhares de anos depois do que se supunha.
Inclusive,
evidências arqueológicas e paleoantropológicas encontradas em ilhas canadenses revelam
os mais antigos vestígios de imigração marítima na América do
Norte, apoiando a ideia de que alguns humanos da Ásia se aventuraram rumo
à América via costa do Pacífico, em vez de viajar pelo interior, bem antes do
que se supunha. (McLaren et al., 2018). Também existem evidências de que humanos já ocupassem
o Canadá há cerca de 24 mil anos. (Bourgeon,
Burke e Higham, 2017) [opinião desses autores].
Além disso,
mais evidências arqueológicas têm sido acumuladas ao longo dos anos, revelando
que os crânios encontrados em Lagoa Santa, por exemplo, eram semelhantes aos
crânios antigos do Equador, mas diferentes da morfologia dos índios atuais,
mostrando que a migração mais antiga para o continente americano ocorreu
através de viagens transpacíficas, com origem na Oceania (Rivet, 1908); um acampamento antigo no
Texas com 16 mil artefatos e a possibilidade da chegada de barcos (Waters et
al., 2011); e acampamentos antigos em cavernas no estado do Oregon com
presença de ferramentas de pedras e coprólitos [excrementos animais ou humanos
petrificados]. (Gilbert et al.,
2008; Shillito et al., 2018).
Em 2018, uma
equipe de geólogos analisou rochas de ilhas próximas ao Alasca e concluiu que
os primeiros americanos colonizadores tomaram uma rota costeira ao longo
da fronteira do Pacífico do Alasca para entrar no continente bem antes da
travessia pela Sibéria via estreito de Bering, e que essa região possivelmente
continha fauna e flora tropical exuberante. (Lesnek et al., 2018).
Mas essas hipóteses e evidências não se concentram apenas em territórios internacionais. No Brasil, nomes como Walter Neves, bioantropólogo da Universidade de São Paulo, ao analisar morfologicamente fósseis de Homo sapiens pré-colombianos, chegou à conclusão de que a América recebeu duas levas migratórias, uma anterior e que acabou extinta, de indivíduos semelhantes aos da África e aos da Oceania; e outra seguinte, que prosperou, supostamente vinda da Ásia, embora nunca tenha proposto uma migração direta da Austrália ou da África. (Neves e Hubbe, 2005).
Essa primeira leva de migrações, bem mais antiga do que se supunha, é confirmada por análises recentes de DNAs antigos, extraídos de amostras de ossos encontrados em diversas cavernas da América central e do sul. (Moreno-Mayar et al., 2018; Posth et al., 2018). Os resultados mostraram que antigos sul-americanos como, por exemplo, de Lagoa Santa, Minas Gerais, tiveram ancestrais vindo da australásia. Esse achados deixaram os pesquisadores evolucionistas confusos, pois eles não sabem como esses ancestrais poderiam ter chegado até lá, sem se misturar com outros grupos migratórios de ancestrais nativos americanos que supostamente também teriam vindo através da Beríngia e das Américas. (Mas, nós criacionistas sabemos que a rota certa foi a transpacífica!)
Mas essas hipóteses e evidências não se concentram apenas em territórios internacionais. No Brasil, nomes como Walter Neves, bioantropólogo da Universidade de São Paulo, ao analisar morfologicamente fósseis de Homo sapiens pré-colombianos, chegou à conclusão de que a América recebeu duas levas migratórias, uma anterior e que acabou extinta, de indivíduos semelhantes aos da África e aos da Oceania; e outra seguinte, que prosperou, supostamente vinda da Ásia, embora nunca tenha proposto uma migração direta da Austrália ou da África. (Neves e Hubbe, 2005).
Essa primeira leva de migrações, bem mais antiga do que se supunha, é confirmada por análises recentes de DNAs antigos, extraídos de amostras de ossos encontrados em diversas cavernas da América central e do sul. (Moreno-Mayar et al., 2018; Posth et al., 2018). Os resultados mostraram que antigos sul-americanos como, por exemplo, de Lagoa Santa, Minas Gerais, tiveram ancestrais vindo da australásia. Esse achados deixaram os pesquisadores evolucionistas confusos, pois eles não sabem como esses ancestrais poderiam ter chegado até lá, sem se misturar com outros grupos migratórios de ancestrais nativos americanos que supostamente também teriam vindo através da Beríngia e das Américas. (Mas, nós criacionistas sabemos que a rota certa foi a transpacífica!)
Por fim, outra pesquisa publicada por arqueólogos da Universidade de São Paulo revelou artefatos de povos pré-colombianos em um sítio de São Manuel, no interior de São Paulo. As estimativas são de que os itens sejam de 11 mil anos atrás – antes do período que se supunha ser o tempo correto para a ocupação da região. (Troncoso, Correa e Zanettini, 2016).
Quadro ilustrativo
de como e quais teriam sido as rotas:
Referências:
Bourgeon L, Burke A,
Higham T. Earliest Human Presence in North America Dated to the Last Glacial
Maximum: New Radiocarbon Dates from Bluefish Caves, Canada. PLoS One. 2017 Jan
6;12(1):e0169486.
Cooper B. Depois do dilúvio. Brasília: SCB, 2008.
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De Acosta, Jose. Historia
natvral y moral de las Indias, en que se tratan las cosas notables del cielo. Sevilla:
Casa de Juan de Leon, 1590.
García,
Gregorio, Origen de los indios de el
Nuevo Mundo, e Indias Occidentales, Madrid: Impr. de F. Martinez, 1729; ele publica o livro em 1607, mas a
versão consultada por nós é de 1729.
Gilbert MT, et al. DNA from pre-Clovis human coprolites in Oregon, North America. Science. 2008 May 9;320(5877):786-9.
Gilbert MT, et al. DNA from pre-Clovis human coprolites in Oregon, North America. Science. 2008 May 9;320(5877):786-9.
Gómara, Francisco López de. La historia general de las Indias y nuevo mundo, con mas la conquista del Peru y de Mexico. Çaragoça, 1555; a abreviação “Fo. Lv” significa fólios, o livro era como pergaminhos, portanto não tinha folhas.
Lesnek AJ, et al. Deglaciation
of the Pacific coastal corridor directly preceded the human colonization of the
Americas. Science Advances
2018; 4(5):eaar5040.
Montesinos, Fernando de. Memorias antiguas historiales y políticas del Perú. Madrid : Impr. de M. Ginesta, 1882. 259p.; essa primeira obra foi copiada de um manuscrito do ano 1644 que se encontra na biblioteca da Universidade Sevilla e cujo título é: “Ophir de España; mémorias historiales políticas del Pirv...”
Moreno-Mayar JV, et al. Early human dispersals within the Americas. Science. 2018 Nov 8. pii: eaav2621.
Neves WA, Hubbe M.
Cranial morphology of early Americans from Lagoa Santa, Brazil: implications
for the settlement of the New World. Proc Natl Acad Sci U S A. 2005 Dec
20;102(51):18309-14.
Pedersen MW, et al.
Postglacial viability and colonization in North America’s ice-free corridor.
Nature. 2016 Sep 1;537(7618):45-49.
Posth C, et al. Reconstructing the Deep Population History of Central and South America. Cell. 2018 Nov 15;175(5):1185-1197.e22.
Rivet P. La race de Lagoa Santa chez les populations précolombiennes de l'Equateur. Bulletins et Mémoires de la Société d’Anthropologie de Paris 1908; 9(1):209-274.
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Rocha, Diego Andrés. Tratado único y singular del origen de los indios del Perú, Méjico, Santa Fe y Chile. V. 1. Madrid: [Impr. de Juan Cayetano García], 1891. Fondo Antiguo.
The Editors. Jose de Acosta. Encyclopaedia Britannica, 2018. Disponível em: https://www.britannica.com/biography/Jose-de-Acosta
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