quinta-feira, abril 26, 2018

Cérebro humano é capaz de trabalhar com onze dimensões


Usando a topologia algébrica, um campo da matemática que faz a associação entre estruturas algébricas e um espaço topológico com o objetivo de obter informações sobre esse espaço, uma equipe de pesquisadores descobriu um universo de estruturas geométricas multidimensionais e espaços dentro das redes do nosso cérebro. Essa abordagem, nunca usada na neurociência, apresentou resultados surpreendentes. Segundo o estudo, realizado no ano passado, o cérebro humano está cheio de estruturas geométricas multidimensionais operando em até 11 dimensões. Estamos acostumados a pensar no mundo a partir de uma perspectiva 3D, então isso pode soar um pouco complicado, mas os resultados desse estudo podem ser o próximo passo na compreensão do tecido do cérebro humano, a estrutura mais complexa que nós conhecemos.

Esse modelo cerebral foi produzido por uma equipe de pesquisadores do Blue Brain Project, uma iniciativa de pesquisa suíça dedicada a fazer uma reconstrução do cérebro humano alimentada por um supercomputador. Os pesquisadores descobriram que os neurônios se conectam em “grupos”, e que o número de neurônios em um grupo levaria ao seu tamanho como um objeto geométrico de alta dimensão (um conceito dimensional matemático, não do espaço-tempo).

“Encontramos um mundo que nunca havíamos imaginado”, disse o pesquisador-chefe, o neurocientista Henry Markram, do Instituto EPFL, na Suíça. “Há dezenas de milhões desses objetos, mesmo em uma pequena partícula do cérebro, através de sete dimensões. Em algumas redes, encontramos estruturas com até 11 dimensões.”

Essas dimensões não são as mesmas que vemos em nosso mundo – as três espaciais e mais uma dimensão de tempo. Em vez disso, elas se referem a como os pesquisadores analisaram os grupos de neurônios para determinar como eles estão conectados. “As redes são frequentemente analisadas em termos de grupos de nós que estão todos conectados a todos, conhecidos como cliques. O número de neurônios em um grupo determina seu tamanho, ou mais formalmente, sua dimensão”, explicam os pesquisadores no artigo.

Markram sugere que isso pode explicar por que é tão difícil entender o cérebro. “A matemática geralmente aplicada para estudar redes não consegue detectar as estruturas e espaços de alta dimensão que agora vemos claramente.” Calcula-se que os cérebros humanos tenham impressionantes 86 bilhões de neurônios, com múltiplas conexões de cada célula em todas as direções possíveis, formando a vasta rede celular que de alguma forma nos torna capazes de pensar e ter consciência. Com um número tão grande de conexões para trabalhar, não é de admirar que ainda não tenhamos uma compreensão completa de como funciona a rede neural do cérebro.

A estrutura matemática construída pela equipe nos leva um passo mais perto de um dia ter um modelo cerebral digital. Para realizar os testes matemáticos, a equipe usou um modelo detalhado do neocórtex que eles mesmos criaram em 2015. Acredita-se que o neocórtex seja a parte mais recentemente desenvolvida [sic] de nossos cérebros, e esteja envolvida em algumas de nossas funções de ordem superior, como a cognição e percepção sensorial.

Depois de desenvolver sua estrutura matemática e testá-la em alguns estímulos virtuais, a equipe também confirmou seus resultados em tecido cerebral real de ratos. De acordo com os pesquisadores, a topologia algébrica fornece ferramentas matemáticas para discernir detalhes da rede neural tanto em uma visão de perto no nível de neurônios individuais, quanto em uma escala maior da estrutura do cérebro como um todo. Ao conectar esses dois níveis, os pesquisadores puderam discernir estruturas geométricas de alta dimensão no cérebro, formadas por coleções de neurônios fortemente conectados e os espaços vazios entre eles.

“Encontramos um número e uma variedade notavelmente elevados de grupos e cavidades dirigidas de alta dimensão, que não haviam sido vistas antes em redes neurais, biológicas ou artificiais”, escreveu a equipe no estudo. “A topologia algébrica é como um telescópio e um microscópio ao mesmo tempo”, explica a matemática Kathryn Hess, da EPFL. “Ele pode ampliar as redes para encontrar estruturas escondidas, as árvores na floresta e ver os espaços vazios, as clareiras, tudo ao mesmo tempo.”

Essas clareiras ou cavidades parecem ser criticamente importantes para a função cerebral. Quando os pesquisadores deram um estímulo ao tecido cerebral virtual, viram que os neurônios estavam reagindo de maneira altamente organizada. “É como se o cérebro reagisse a um estímulo construindo e depois destruindo torres de blocos multidimensionais, começando com hastes (1D), depois pranchas (2D), depois cubos (3D) e geometrias mais complexas com 4D, 5D, etc.”, explica outro membro da equipe, o matemático Ran Levi, da Universidade Aberdeen, na Escócia. “A progressão da atividade através do cérebro se assemelha a um castelo de areia multidimensional que se materializa a partir da areia e depois se desintegra.”

Essas descobertas fornecem uma nova imagem de como o cérebro processa informações, mas os pesquisadores apontam que ainda não está claro o que faz com que os grupos de neurônios e as cavidades se formem em suas formas altamente específicas.

Outras pesquisas serão necessárias para determinar como a complexidade dessas formas geométricas multidimensionais formadas por nossos neurônios se correlaciona com a complexidade de várias tarefas cognitivas.

Agora os pesquisadores querem saber se a complexidade das tarefas que podemos realizar depende da complexidade dos “castelos de areia” multidimensionais que o cérebro pode construir. A neurociência também tem lutado para descobrir onde o cérebro armazena as nossas memórias. Markran tem um palpite: “Elas podem estar ‘escondidas’ em cavidades de alta dimensão.”


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