Com
15 anos, li Uma Breve História do Tempo,
de Stephen Hawking e fiquei ainda mais apaixonado por cosmologia e passei a
admirar o cientista cuja mente tem viajado tão longe, mas que, ironicamente,
está há décadas preso a uma cadeira de rodas, devido à esclerose lateral amiotrófica
que tem limitado seus movimentos e foi diagnosticada quando ele tinha 21 anos
de idade. Depois li O Universo Numa Casca
de Nós, um primor gráfico, também dele. E quando soube que ele havia
lançado Minha Breve História, não
perdi tempo e comprei o livro. A história é breve, realmente. Tem apenas 140
páginas (na edição em português publicada pela editora Intrínseca). Mas nelas
Hawking revela lances curiosos de sua infância e muita coisa dos bastidores do
mundo da ciência. Continuo admirando o intelecto de Hawking, apesar de algumas
“bobagens” que ele andou dizendo a respeito da fé e de outros assuntos (confira
aqui,
aqui
e aqui).
Aliás, lendo o livro, pude perceber nas entrelinhas o porquê da ligeira aversão
do cientista pela religião (nada tão escancarado como acontece com Dawkins, por exemplo).
Hawking
nasceu em Oxford, na Inglaterra, no dia 8 de janeiro de 1942. Filho de um
médico pesquisador e de uma secretária escocesa, ambos formados pela
Universidade de Oxford, o menino desde cedo manifestou interesse por matemática
(o que causou certo descontentamento no pai, que queria que ele também fosse
médico) e pelas grandes questões da vida, como de onde viemos e para onde
vamos. Com cerca de dez anos, esteve sob os cuidados de um tutor na Espanha
que, mais interessado em escrever uma peça para o festival de Edimburgo do que
em ensinar, obrigava o menino a ler capítulos da Bíblia todos os dias e a fazer
uma redação a respeito, segundo ele, para lhe ensinar a beleza do idioma
inglês. Hawking parece não ter gostado disso, até porque a versão que ele teve
que ler foi a tradicional e antiquada King James. A falta de religião no lar e
essa experiência negativa com a Bíblia não foram coisas positivas na vida dele,
como veremos mais adiante.
Hawking
fala de sua doença, de suas esposas, de seus três filhos e dois divórcios, e
dedica mais espaço para discursar a respeito dos assuntos que sempre mais o
atraíram: física e cosmologia. Um dos trechos mais reveladores e interessantes,
para mim, está nas páginas 71 e 72. Nos anos 1960, a teoria do universo
estacionário vinha apresentando problemas (e Hawking chega a agradecer por não
ter sido aluno de um professor que defendia essa teoria) com crescentes
evidências apontando para um universo em expansão. Hawking escreveu que “dois
russos, Evgeny Lifshitz e Isaak Khalatnikov, alegaram ter provado que uma
contração geral sem uma simetria exata sempre provocava um repique, com a densidade
se mantendo finita. O resultado foi muito conveniente para o materialismo
dialético marxista-leninista, uma vez que evitava indagações inconvenientes sobre
a criação do Universo. Portanto, tornou-se um artigo de fé para os cientistas
soviéticos”.
Isso
mostra que a ciência não é um empreendimento isento de interesses escusos. Fico
me perguntando, também, a quem interessam os supostos bilhões de anos
atribuídos à vida neste planeta... A quem interessa a ideia de que vida pode
surgir de não vida e que a complexidade pode surgir a partir do rudimentar,
contrariando a própria ciência...
Outros
dois relatos que me chamaram a atenção estão nas páginas 91e 92. Certa ocasião,
Hawking fez uma aposta com Kip Thorne. Caso a teoria de Kip fosse a vencedora,
Hawking propôs dar-lhe a assinatura de uma revista pornográfica. Caso ele
vencesse, Kip lhe daria a assinatura de outra revista pornográfica. Hawking
conta: “Nos anos que se seguiram à aposta, a evidência em favor dos buracos negros
ficou tão forte que capitulei e dei a Kip a assinatura da Penthouse, para grande desgosto da esposa dele.”
Hawking
perdeu dois casamentos. Não deveria atrapalhar o dos outros...
Eu
já sabia da moral duvidosa do cientista e que ele era (ou é, não sei)
frequentador assíduo de um clube de swing
(confira),
mas o pior foi saber que ele acabou desperdiçando novamente uma oportunidade de
conhecer o Criador do Universo. Eis o segundo relato que começa na página 91: “Enquanto
estive na Califórnia, trabalhei com um aluno de pesquisa no Caltech chamado Don
Page. Don tinha nascido e fora criado em uma aldeia do Alasca, onde seus pais
eram professores da escola e, junto com ele, eram os únicos não esquimós da
região. Ele era cristão evangélico e fez o possível para me converter quando,
mais tarde, veio morar conosco em Cambridge. Don costumava ler histórias da
Bíblia para mim durante o café da manhã, mas eu lhe disse que conhecia bem a
Bíblia do tempo em que morava em Maiorca e porque meu pai costumava lê-la para
mim. (Meu pai não era crente, mas achava que a Bíblia do rei James era
culturalmente importante.)”
Não,
Hawking não conhecia a Bíblia, apenas havia tido uma experiência de leitura
forçada na infância que o marcou negativamente e levantou nele uma espécie de “blindagem”
contra a Palavra de Deus. Que pena... Outra oportunidade perdida (aliás,
Hawking também conhece alguma coisa do adventismo: confira).
No
entanto, embora não dê importância à religião, o físico admite que a menção a
Deus em seu livro Uma Breve História do
Tempo ajudou a alavancar as vendas: “No estágio de provas, quase cortei a frase
final do livro, que era que iríamos conhecer a mente de Deus. Se eu tivesse
feito isso, as vendas talvez houvessem caído para a metade” (p. 110).
De
qualquer forma, Minha Breve História
acaba sendo uma lição de superação e de que nada deve nos impedir de sempre
aprender mais e mais. O autor diz: “Tive e tenho uma vida completa e prazerosa.
Acredito que pessoas com deficiência devem se concentrar nas coisas que a desvantagem
não as impede de fazer, e não lamentar as que são incapazes de realizar. No meu
caso, consegui fazer quase tudo o que queria” (p. 137).
Michelson Borges