A revista Veja desta semana (edição 2114, data de 27/05) dedica a sua capa a uma reportagem de incríveis 42 páginas editoriais (considerando os anúncios, são 57 páginas) intitulada “Emagrecer pode ser uma delícia”. Sim, deve ser uma delícia, até porque a concorrente Época também deu capa, na semana anterior (edição 574, de 16/5), para matéria bastante parecida – “Comer para viver melhor”. No caso de Veja, porém, trata-se de um arrazoado que ganhou status diferenciado, qual seja o de “Especial Mulher”. É claro que os homens são mais gulosos e relapsos, mas não parece ter sido este o critério da Redação para a identificação da pauta com o gênero feminino. Ao longo das 57 páginas do tal “Especial Mulher”, os anúncios são todos dirigidos ao público feminino, à exceção de um, do automóvel Outlander, da Mitsubishi. Os anunciantes “compareceram” e a pauta saiu do forno. Redação e Departamento Comercial, irmanados, produziram um belo material de utilidade pública para a mulher moderna que compra ou assina a Veja. (...)
De fato, Veja conseguiu presentear suas leitoras com um projeto muito especial, especialíssimo. No ponto alto da edição, aparecem duas geladeiras abertas, uma com substâncias (não dá para chamar de outra coisa) que perfazem 7 mil calorias, e a outra, de gente normal, contendo 70 mil calorias. Entre as duas geladeiras, um anúncio esperto da linha de produtos Becel (leite, iogurte e margarina que reduzem “a absorção do colesterol dia após dia*”). Nas letrinhas miúdas e publicadas na vertical, a explicação do misterioso asterisco da propaganda: “*seu consumo deve estar associado a uma dieta equilibrada e a hábitos de vida saudáveis”).
Tudo somado, resta dizer que é realmente bonito quando o trabalho da Redação complementa com tanta felicidade precisão a competência da turma do Departamento Comercial. Só não é jornalismo.
(Luiz Antonio Magalhães, Observatório da Imprensa)
Nota: É o tipo de matéria que mostra os interesses da “grande imprensa”, o que vai nos bastidores da mídia. Se interesses comerciais de vez em sempre se sobrepõem aos editoriais, será que isso também ocorre no aspecto ideológico? Não tenho dúvidas. Na semana passada, pela enésima vez, enviei e-mail para a Veja com sugestão de pauta para uma entrevista com Anthony Flew, o maior ateu (hoje ex-ateu) do século 20, para contrabalançar as muitas matérias e entrevistas com pensadores ateus e céticos. Nada. Também já sugeri que contatassem Michael Behe ou Phillip Johnson, teóricos do design inteligente (já que para criacionistas não abrem mesmo espaço), e nada. Essa é a nossa mídia, com raras e honrosas exceções.[MB]