As prisões estão repletas de psicopatas. Dizem as más línguas que os conselhos empresariais também. A combinação de uma propensão a correr riscos de maneira impulsiva com a ausência de culpa ou vergonha (as duas principais características da psicopatia) pode levar o indivíduo a uma carreira no crime ou no mundo dos negócios. Essa conclusão levou a um debate se o fenômeno é uma aberração ou se algo favorecido pela seleção natural, ao menos nos casos em que a incidência é rara entre a população. Afinal, o conselho é um local desejável, e, antes da invenção das prisões, o crime compensava. Para analisar o caso, Elsa Ermer e Kent Kiehl da Universidade do Novo México, em Albuquerque, decidiram testar as sensibilidades morais dos psicopatas e suas atitudes em relação aos riscos. Os resultados não provam que a psicopatia é adaptável, mas sugerem que ela depende de mecanismos específicos (ou de uma ausência específica deles). Essa especificidade costuma ser um resultado da evolução.
Estudos anteriores mostraram que os psicopatas têm níveis normais de inteligência (eles raramente são gênios como Hannibal Lecter, o sinistro serial killer de filmes como “O Silêncio dos Inocentes”). Sua ausência de culpa e vergonha não é fruto de concepções erradas sobre o certo e o errado. Pergunte a um psicopata o que ele faria em uma situação específica, e ele certamente lhe dará aquilo que os não-psicopatas chamariam de resposta certa. A grande questão é que o psicopata não agiria de acordo com esse conhecimento.
Ermer e Kiehl suspeitam que embora os psicopatas tenham a habilidade de dar a resposta apropriada quando confrontados com um problema moral, eles não chegam a essa resposta pelo processo psicológico normal. Em particular, os pesquisadores creem que os psicopatas talvez não tenham a noção instintiva dos contratos sociais – as regras que regem as obrigações – que outros têm. [...]
Ermer e Kiehl recrutaram 67 prisioneiros e os testaram para avaliar se eles exibiam traços de psicopatia. Dez deles eram inegavelmente psicopatas. Trinta não eram. O resto teve resultados intermediários. Quando a dupla testou as habilidades dos prisioneiros no teste geral, eles perceberam que os psicopatas foram tão bem quanto os outros. No caso de problemas apresentados como contratos sociais, ou questões envolvendo riscos a serem evitados, os não-psicopatas tiveram um índice de acertos próximo dos 70%, os psicopatas acertaram uma média de 40%, e os intermediários tiveram resultados entre esses níveis.
Os testes Wason sugerem que a análise dos contratos sociais e dos riscos representa o que os psicólogos evolucionários chamam de “pacotes de módulos cognitivos” de adaptações mentais que atuam como órgãos especializados para algumas tarefas. Os novos resultados sugerem que, nos psicopatas, esses módulos teriam sido desligados.
Pesquisas mais aprofundadas serão necessárias para determinar como os módulos de risco e contrato social que governam a psicopatia são controlados. Mas outros fenômenos que se assemelham a doenças são comprovadamente mantidos pela seleção natural. A anemia falciforme, causada por genes que protegem o organismo contra a malária, é o melhor dos exemplos. A explicação para a psicopatia pode estar aí.
(Opinião e Notícia)
Nota: Como evolução é uma palavra tremendamente elástica e adaptável aos mais variados contextos (desde a sobrevivência das bactérias a antibióticos ou a diferenciação de formato no bico dos tentilhões – microevolução –, até o surgimento de um dinossauro a partir de um ser unicelular – macroevolução), mesmo a perda, a desvantagem ou a doença podem ser consideradas como “evolução”. Já dissemos aqui que o darwinismo “explica” o adultério e outros comportamentos. Agora até a psicopatia tem explicação darwinista.[MB]
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