As recentes tensões entre estudantes da USP e a Polícia Militar (leia aqui ótimo artigo sobre esse assunto) trouxeram novamente à tona o problema do uso da maconha. Seria a Cannabis sativa realmente inofensiva, como pregam alguns? Segundo o Dr. Bernell Baldwin, Ph.D, em artigo publicado no Journal of Health and Healing, em 2010, a substância mais usada na marijuana ou maconha é o tetrahidrocanabinol (THC). “Muitos componentes da maconha são encontrados no tabaco, mas o THC é característico dela”, explica Baldwin. O conteúdo de THC na planta varia muito dependendo da maconha. Um laboratório pode trabalhar com uma qualidade bem menos tóxica dela que pode ser muito diferente da que é usada em várias partes do mundo. “Assim, alguns cientistas dizem que a marijuana é inocente, enquanto outros, em outras partes do mundo, tendo acesso aos cultivos potentes, encontram efeitos no corpo que são realmente perigosos.”
Ainda segundo o artigo de Baldwin, estudos têm demonstrado que o THC da maconha passa dos pulmões através do sangue para o cérebro. Enzimas no cérebro não podem quebrar o THC como conseguem mais rápida ou completamente com a nicotina do cigarro comum. Assim, os efeitos agudos da marijuana são de muito mais longo tempo do que os da nicotina. Traços de THC podem permanecer por até uma semana no corpo.
De acordo com Baldwin, os fumadores de maconha geralmente inalam com muito mais força e profundamente para tentar conseguir mais THC. “Isso pode lesar mais devido ao monóxido de carbono e alcatrão absorvidos mais do que no cigarro comum”, diz ele. A Associação Britânica do Câncer relata que o alcatrão de cigarros de maconha contém 50% mais concentrações de carcinógenos como o benzopireno e o benzantraceno do que o cigarro comum. A média de cigarros de maconha fumados em 1960 continha 10 mg de THC. Hoje em dia eles podem ter cerca de 150 mg.
O THC também pode inibir o sistema imune no cérebro causando encefalite, suprimir a proliferação de células T importantes para defesa do corpo e inibir a liberação de interferon com GABA, substâncias naturais da imunidade humana.
Ainda assim, a despeito dos malefícios físicos, o maior problema da maconha reside no fato de que ela interfere nas ondas cerebrais normais e deprime a atividade elétrica do córtex frontal, “sede” do caráter e do poder moral. A memória recente fica prejudicada com o uso modesto de maconha. Além disso, ela reduz a motivação, a cognição (raciocínio), o aprendizado e a habilidade de se concentrar. Pesquisadores verificaram que, quando deram maconha a animais de laboratório que estavam muito estressados, eles começaram a se automutilar. “Isso sugere que algo parecido seria ligado às tentativas de suicídio em usuários de maconha. Já que esses animais normalmente não se automutilam, eles agiram assim por ação da droga”, conclui o Dr. Baldwin.
O Dr. Strongsky, da Fundação Nacional de Ciência da Suíça, num estudo com 9.268 adolescentes suíços, verificou que um quarto deles foram classificados como usuários de maconha, no presente ou no passado, e que, comparados com não usuários, houve maior prevalência de risco de comportamentos antissociais, acidentes e tentativas de suicídio nos usuários da droga.
Um estudo na Austrália envolveu 311 pares de gêmeos idênticos e não idênticos do mesmo sexo. Os que tinham usado maconha aos 17 anos de idade foram duas a cinco vezes mais propensos ao uso de drogas adicionais, dependência de álcool e abuso de drogas do que os que não usaram maconha na mesma idade. Os pesquisadores controlaram outros fatores de risco nesse estudo, tais como início precoce do consumo de álcool e tabaco, conflitos familiares, separação dos pais, abuso sexual, depressão e ansiedade. Não houve diferença entre os gêmeos idênticos e não idênticos, sugerindo, assim, que os fatores principais foram mesmo o ambiente e o uso da maconha como causas das complicações comportamentais.
Num artigo publicado no jornal A Voz da Serra, o médico psiquiatra Dr. Cesar Vasconcellos de Souza afirma que “a ideia de que a maconha não produz efeitos negativos sobre a saúde humana foi desenvolvida durante os anos 60 e 70, quando grupos de rock e outras figuras pops na cultura da época inadvertidamente caracterizaram a droga como benigna. Agora, décadas depois, ainda persiste essa ideia de ela ser inofensiva, apesar do fato de que mais adolescentes são encaminhados para tratamento pela dependência (ou adicção) da maconha do que por todas as outras drogas ilícitas combinadas”.
John P. Walters, diretor do Escritório Nacional para o Programa de Controle da Droga dos Estados Unidos, afirma que “a maconha é mais perigosa do que as pessoas pensam e ela pode realmente levar a significativos problemas de saúde, abalar famílias e comprometer o futuro dos jovens, precisando ser dissipados enganos sobre ela” (“Dispelling the Myths About Marijuana”, Hazelden Foundation, outubro de 2002).
Na América do Norte, em 2001, fizeram uma pesquisa com 70 mil jovens acima de 12 anos e encontraram que a porcentagem de usuários de maconha (os que haviam usado pelo menos uma vez no mês anterior) havia aumentado de 4,8% em 2000 para 5,4% em 2001, sendo a droga ilícita mais usada entre a juventude norte-americana. Cerca de 60% dos jovens que usam drogas ilícitas, usam apenas maconha. Jovens da oitava série experimentam essa droga duas vezes mais do que há dez anos. Novos consumidores entre 12 e 17 anos dobraram de 800 mil, em 1990, para 1,6 milhão, em 1996. No ano 2000, cerca de 60% desses jovens achavam que a maconha era de grande risco, e em 2001 o número caiu para 53,5%. A redução da percepção do risco é um indicador importante para o uso futuro da droga. Então, espera-se um aumento do uso de maconha entre os jovens.
“Daí ser importante que pais éticos, jovens livres da dependência química, ex-drogados e a mídia (que às vezes faz o papel irresponsável e maléfico de apresentar pessoas com algum grau ou posição cultural que defendem a ideia de que a maconha é inofensiva) divulgarem a verdade sobre os efeitos danosos do consumo da maconha sobre o corpo humano, a família e o futuro do jovem e da sociedade”, defende o Dr. Cesar, e ele lista alguns desses efeitos danosos:
A maconha hoje é muito mais potente – a média da concentração do princípio ativo da marijuana (THC), responsável pelo “barato” ou “onda”, aumentou de 1% em 1974 para 5% em 1997.
Efeitos agudos – prejuízo da fala, do pensamento, do julgamento, da memória de curto prazo, da coordenação e equilíbrio motores. Pode causar sonolência, ilusões, visão prejudicada, vômito severo, dor de cabeça, vertigem, sendo todas alterações perigosas no conduzir veículos.
Problemas respiratórios e câncer – uso crônico de maconha favorece o surgimento de tosses, inflamações na garganta, bronquite, pneumonia. Ela contém agentes causadores de câncer como o tabaco. O nível de monóxido de carbono absorvido pelo fumante dessa droga é de três a cinco vezes maior do que os fumantes de cigarro comum. Fumar cinco “baseados” (cigarros de maconha) por semana expõe o usuário a substâncias cancerígenas mais do que aquele que fuma um maço de cigarros por dia.
Adicção – cerca de 200 mil pessoas que iniciam o tratamento de Dependência Química (DQ) a cada ano, referem-se à maconha como sua primeira droga de escolha. 60% dos adolescentes em tratamento se submetem a ele por causa da maconha.
Risco aumentado sobre o comportamento – jovens usuários de maconha têm maior probabilidade de se envolver em comportamento de risco, tais como ter sexo, cometer atos de violência e dirigir sob sua influência. Usuários semanais têm cinco vezes mais chances de roubo e quatro vezes mais chance de se envolver em violência do que os que não usam a droga.
Pobre desempenho acadêmico – pesquisas sugerem que a maconha está ligada à queda da motivação e de energia e seus usuários vão pior nos estudos. Estudantes que obtêm letra “D” ou “E” (“A” é o melhor, “E” o pior) tiveram mais do que quatro vezes probabilidade de serem usuários de maconha do que os com conceito “A”.
Influência sobre o sistema imune e reprodutor – há evidências de que a maconha afeta as defesas imunológicas do organismo humano e diminui o número de espermatozoides, podendo gerar incapacidade no homem de fecundar a mulher.
Síndrome de abstinência – tolerância (precisar de mais droga para obter os mesmos efeitos) e efeitos negativos da retirada da droga têm sido observados nos consumidores de maconha.
Desculpas – todo dependente químico vive a negação, que é um mecanismo de defesa psicológico que protege a pessoa da verdade que ela pode não estar pronta ou disposta a encarar. Quando a pessoa estiver pronta – o que significa que aceitou a dependência e parou com a negação –, ela pode começar a se libertar da adicção. Antes disto, usará desculpas “científicas” ou não.
Conclusão do Dr. Cesar (e de muitos outros): “Maconha é maléfica para consumo humano. Não é uma droga ‘inocente’. Ela pode romper com o processo de aprendizagem e o desenvolvimento, especialmente do jovem.”
Leia também: “Smoking marijuana: innocuous pastime or slippery slope?”, Hazelden Voice, Summer 2003 (a Hazelden Foundation é uma das melhores e mais antigas instituições especializadas no tratamento e prevenção do alcoolismo e dependência de outras drogas).
Leia também: “Loucura: maconha deixa regiões do cérebro fora de sincronia umas com as outras”, “Heavy marijuana use shrinks brain parts: study” e "A ciência adverte: fumar maconha emburrece"