quinta-feira, novembro 24, 2011

Os neutrinos e a luz

Depois de abalar o mundo dos físicos, em setembro, ao anunciar que flagraram neutrinos viajando mais rápido que a luz, pesquisadores do laboratório Gran Sasso, na Itália, voltaram aos detectores, fizeram novas medições e insistem que os resultados estão certos. A notícia é tão extraordinária que, para ser aceita, ainda precisa ser confirmada por um centro que não o italiano, mas já podemos ir especulando sobre suas implicações. Neutrinos são partículas subatômicas com massa. De acordo com a teoria da relatividade especial, de Albert Einstein, a do famoso E=mc², não poderiam ser acelerados para atingir velocidade superluminal. Se isso ocorre, boa parte da física precisará ser revista. A primeira vítima pode ser a noção de causalidade. Se a velocidade da luz é violada, a forma como o Universo processa informações fica de pernas para o ar. Torna-se, em princípio, possível que efeitos precedam suas causas.

Uma das soluções aventadas para o problema é propor que os neutrinos chegaram mais rápido porque tomaram um atalho por outras dimensões espaciais e quem sabe até por outros cosmos, o que nos leva às incríveis teorias do multiverso, segundo as quais existiriam ao menos nove modalidades de universos paralelos, todas matematicamente consistentes, mas jamais observadas.

Estamos diante de uma encruzilhada epistemológica. Não são poucos os que acusam a ciência de ponta, em especial a física de partículas e os teóricos das supercordas, de criarem um universo de abstrações matemáticas que não têm como ser testadas com a tecnologia atual (um pecado menor) nem em princípio (a danação eterna para um físico). Segundo esses críticos, tais ramos da ciência estariam se aproximando perigosamente da metafísica e da religião. [Grifo nosso.]

[Nota do blog Desafiando a Nomenklatura Científica: A biologia evolucionária é uma ciência que se encontra numa encruzilhada epistemológica desde 1859, porque tem proposições, cenários que, segundo meu amigo Schwartsman, “não têm como ser testadas com a tecnologia atual (um pecado menor) nem em princípio (a danação eterna para um físico)”. Há mais de uma década, o Darwinismo estaria se aproximando perigosamente da metafísica e da ideologia materialista.]

É claro que não estão, mas esse é um debate fascinante, que inclui, entre outros destaques, a discussão sobre se a matemática é ou não real.

[Nota do blog Desafiando a Nomenklatura Científica: Schwartsman aliviou a barra do pessoal da física como Marcelo Gleiser, mas se estivesse escrevendo sobre a biologia evolucionária, poderia muito bem terminar seu artigo assim: “esse é um debate fascinante, que inclui, entre outros destaques, a discussão sobre se a biologia evolucionária é ou não real.”]

(Hélio Schwartsman, Folha de S. Paulo 19/11/2011)