Há alguns dias, li o resultado de uma pesquisa que afirmava que a taxa de suicídio tem sido
maior entre os evangélicos. Fiquei surpreso com esse resultado, porque o
verdadeiro evangelho é caracterizado pela paz que a graça de Cristo implanta no
coração do ser humano; que não precisamos fazer mais nada, pois tudo Ele já fez
por nós; agora, só nos resta amá-lo. Parece um paradoxo afirmar que o número de
suicídios tem sido maior entre os adeptos de uma religião que ensina que o seu
Deus os ama e que nunca os abandonará; que tudo já foi feito em seu favor; um
Deus que diz: “Venham a Mim, todos os que estão
cansados e sobrecarregados, e Eu lhes darei descanso. Tomem sobre vocês o Meu jugo e aprendam de Mim, pois sou
manso e humilde de coração, e vocês encontrarão descanso para as suas almas”
(Mateus 11:28, 29).
Geralmente,
as pessoas que se suicidam estão sobrecarregadas dos anseios e fardos desta
vida, se sentem sós, deprimidas, confusas. A fé é um sentimento que, de certa
forma, consegue superar tudo isso, pois Deus Se apresenta nos evangelhos como
Aquele que está com Seus filhos em meio às tempestades da vida. Por que, então,
o suicídio tem maior incidência em grupos de pessoas que deveriam se sentir
seguras e felizes? Nunca fiquei sabendo que alguém tirou a vida porque se
sentia feliz. Então, como explicar o resultado dessa pesquisa? Os evangélicos
são mais infelizes?
Concordo
que deve haver vários fatores que influenciaram para que esse resultado
contrariasse a todos nós que defendemos o evangelho como fonte de felicidade.
Entretanto, quero dedicar este breve artigo somente a um desses fatores que, no
meu modo de ver, é um dos mais relevantes: a teologia da prosperidade.
Durante anos, a humanidade sofreu
sob o julgo de uma mensagem que a oprimia. Afirmava-se que deveríamos fazer
penitências, comprar indulgências e fazer sacrifícios sobre-humanos, se
quiséssemos alcançar o favor divino. Muitos perderam os bens e a vida por causa
da culpa que os assolava. De certa forma, o ateísmo existente hoje se deve ao
grande mal cometido em nome da religião durante a Idade Média.
A opressão existente naqueles dias
levou vários homens a empreender uma reforma na igreja dominante. Essa reforma
ganhou o nome de Protestantismo. Esse movimento cresceu e se espalhou pelo
mundo. Ele tinha como objetivo libertar a humanidade de uma pena que já tinha
sido paga, trazendo felicidade a uma raça de pecadores culpados que só
precisava de arrependimento e fé para ter de volta a Graça que lhe fora
roubada. Afirmavam, ainda, que a humanidade não precisava de intermediários
para chegar até Deus; que Ele a amava e desejava habitar com ela. Isso deu novo
alento às pessoas angustiadas e oprimidas que só precisavam de uma coisa: esperança.
Uma luz brilhou no horizonte para
os homens de boa vontade. Muitos, de todas as partes, se uniram para proclamar
a mensagem da esperança em Cristo. Que maravilha! O dinheiro, que antes era
para o benefício do clero, foi utilizado para levar esperança ao mundo.
Foi com esse propósito que o
Protestantismo surgiu. Mas, infelizmente, alguns o perderam de vista. O
evangelho virou comércio; as bênçãos, mercadorias; e as igrejas, lojas. Onde
vamos parar? Até onde precisamos ir para descobrir que estamos perdidos? Se
Lutero ressuscitasse hoje, sentiria vergonha ao ver em que a Reforma se
transformou.
Quando eu
era pastor de uma dessas igrejas praticantes da teologia da
prosperidade, diversas vezes entraram em minha sala pastoral membros infelizes,
decepcionados porque já tinham tentado de tudo, realizado diversas correntes,
feito votos além da capacidade do orçamento financeiro da família. Votos que,
para cumprirem, tiveram que vender bens como geladeiras, carros, etc. Muitos
lamentavam o fato de que não obtiveram sucesso em cumprir seus votos e, agora,
além de o problema continuar, estavam em dívida com Deus, assim pensavam. Isso
os atormentava. Muitos simplesmente desistiam, desapareciam e nunca mais
tínhamos notícias deles.
A teologia da prosperidade ensina
que devemos doar acima do que podemos para mover o coração de Deus em nosso
favor. Como se sentir feliz em uma religião que ensina que seu Deus só abençoa
mediante sacrifícios? “Se não houver sacrifícios, não haverá bênçãos”, é o lema
de muitos pregadores. Isso significa que se você já tentou de tudo e ainda não
foi abençoado, é porque ainda não sacrificou o suficiente, por isso muitos se
desfazem de bens essenciais dentro do lar para tentar convencer Deus de que
necessitam do que estão pedindo. Quando a bênção não vem, entram em desespero.
Resultado: desejo de morrer, porque, na compreensão deles, Deus não mais os
ama.
Certa vez, num dos muitos eventos a
que tenho sido convidado, uma senhora me chamou para conversar. Disse-me ela
que era membro de uma dessas igrejas, e alguém a convidou para a programação,
porque afirmava que ela precisava me ouvir. A história dessa mulher é muito
triste. Ela vendeu tudo que tinha em casa: móveis e eletrodomésticos; estava
dormindo no chão. Falei para ela da graça e do amor de Deus. Os olhos dela
brilharam e lágrimas escorreram por aquele rosto sofrido. Hoje, ela é membro da
Igreja Adventista do Sétimo Dia. Louvado seja o Senhor!
A teologia da prosperidade é um mal
que precisa ser combatido por todos aqueles que têm amor ao verdadeiro
Evangelho. É assustadora a grande proporção que essa
teologia ganhou nos últimos anos no meio protestante com seu evangelho dos
milagres. Muitas pessoas estão aderindo ao mundo evangélico por causa dos
milagres, das bênçãos financeiras que muitos afirmam ter recebido.
Alguns
são levados a colocar Deus à prova, oferecendo aos pés dos pastores seus bens mais
valiosos. Eu afirmo a você que a grande maioria fica decepcionada com o
resultado. Tenho me encontrado com pessoas em estado de depressão porque doaram
carros, casas, apartamentos, dinheiro que, com muito sacrifício, foi poupado
durante anos a fim de pagar a faculdade dos filhos, realizar o sonho da casa
própria e tantas outras necessidades, e, agora, ficaram sem nada, perderam
tudo. Muitos confessaram que sentiram vontade de morrer com vergonha dos
filhos, parentes e amigos. E para piorar o estado psicológico dessas pessoas,
os pastores lhes disseram que faltou fé da parte delas; que estavam cometendo algum
pecado, por isso não foram abençoadas. Por favor, até onde isso irá? O amor
pelo dinheiro cegou muitos pastores da atualidade.
Os
pastores dessas igrejas sabem do que estou falando, e não adianta vir com
desculpas! Para cada um que testemunha, centenas estão sofrendo porque não têm
o que testemunhar, a não ser desgraça.
Com um
cenário desses, não é de admirar que a taxa de suicídios tivesse maior
incidência entre os evangélicos.
Está na hora de buscar coragem para
enfrentar essa situação. Utilizar o sofrimento das pessoas para tirar delas o
que têm é um ato imoral, comparável ao que se fazia numa época em que o mundo
vivia na escuridão espiritual e intelectual. Onde estão os defensores dos
direitos humanos? Estão fazendo alguma coisa? Eu gostaria de saber.
O evangelho verdadeiro nos oferece
a companhia de um Deus que nos ama. Um Deus que permanecerá conosco até fim,
mesmo que venham problemas. Ele permanecerá ao nosso lado, não nos abandonará.
Muitos cristãos enfrentam um
conflito interno. Eles acreditam em um Deus santo, puro, imaculado, um Deus que
tudo pode; e ao olhar para dentro de si mesmos, encontram um ser pecador,
indigno, imundo – aí surge o conflito: Como posso alcançar as bênçãos de um
Deus assim, sendo eu tão impuro? Então pensam que somente por meio de grandes
sacrifícios Deus será movido a abençoá-los. Alguns pregadores ensinam que se
você quiser ser abençoado, deve doar todo o seu dinheiro ao pastor mais rico,
pois se ele é rico, é porque é santo, e o que ele pedir Deus concederá. Que
sofisma!
“Quando virdes vossa
pecaminosidade, não espereis até que vos tenhais melhorado. Quantos há que
julgam não ser suficientemente bons para ir a Cristo! Tendes esperança de
tornar-vos melhor mediante vossos próprios esforços? ‘Pode o etíope mudar a sua
pele ou o leopardo as suas manchas? Nesse caso também vós podereis fazer o bem,
sendo ensinados a fazer o mal’ (Jr 13:23). Só em Deus é que há socorro para
nós. Não devemos esperar persuasões mais fortes, melhores oportunidades ou um
temperamento mais santo. De nós mesmos nada podemos fazer. Temos de ir a Cristo
exatamente como nos achamos” (Ellen G. White, Caminho a Cristo, p. 31).
Amigo, realmente somos indignos,
pecadores, imundos, mas aí vem a boa-nova: Deus nos ama mesmo assim. “Mas Deus demonstra Seu amor por nós: Cristo morreu em nosso
favor quando ainda éramos pecadores” (Rm 5:8). Perceba que Cristo morreu por
nós quando estávamos em estado de alienação total. Ele foi capaz de morrer e
enfrentar tudo e todos em nosso favor quando éramos contrários à vontade de dEle,
e não cobrou um centavo por isso. Agora que O aceitamos, não fará Ele por nós
tudo de que temos necessidade, e gratuitamente? É claro! Você não precisa doar todo
o seu dinheiro, fazer enormes sacrifícios; Deus só quer seu coração. Nele Ele
tem que ser o primeiro.
“O preço
pago por nossa redenção, o infinito sacrifício de nosso Pai celestial em
entregar Seu Filho para morrer por nós, deveria inspirar-nos ideias elevadas
sobre o que nos podemos tornar por meio de Cristo. Quando o inspirado apóstolo
João contemplou a altura, a profundidade e a amplidão do amor do Pai para com a
raça perdida, foi possuído de um espírito de adoração e reverência; e, não
podendo encontrar linguagem apropriada para exprimir a grandeza e ternura desse
amor, chamou para ele a atenção do mundo. ‘Vede quão grande amor nos tem
concedido o Pai: que fôssemos chamados filhos de Deus’ (1Jo 3:1). Em que grande
valor é tido o homem!” (Caminho a Cristo,
p. 15).
Você é
muito valioso para Deus. Não há nada que Deus não saiba sobre você: seu
passado, seu presente, seu futuro, suas dores, o motivo do seu choro, o motivo
pelo qual você tem passado noites sem dormir, o filho que está sofrendo, o
marido que a deixou, a esposa que o abandonou, a família que está se
destruindo, a lágrima que escorre pelo seu rosto, um cabelo que cai de sua cabeça,
as decisões erradas que você tomou. Deus conhece também suas alegrias, mesmo
que elas tenham se tornado raras. Ele deseja que elas retornem para você. Ele
não quer, de forma alguma, que você pague para tê-las de volta. Ele já pagou
por elas.
“O coração
de Deus anseia por Seus filhos terrestres com amor mais forte que a morte.
Entregando Seu Filho, nesse único Dom derramou sobre nós todo o Céu. A vida,
morte e intercessão do Salvador, o ministério dos anjos, o pleitear do
Espírito, o Pai operando acima de tudo e por tudo, o interesse incessante dos
seres celestiais – tudo se empenha em favor da redenção do homem” (Caminho a Cristo, p. 21).
“Descrevendo
Sua missão terrestre, disse Jesus: ‘O Espírito do Senhor é sobre Mim, pois que
Me ungiu para evangelizar os pobres, enviou-Me a curar os quebrantados de
coração, a apregoar liberdade aos cativos, e dar vista aos cegos, a pôr em
liberdade os oprimidos’ (Lc 4:18, 19). Essa foi a Sua obra. Andava fazendo o
bem, curando os oprimidos por Satanás. Havia aldeias inteiras onde não existia
mais nenhuma casa em que se ouvissem lamentos de enfermo, porque Jesus por elas
passara e lhes curara os doentes. Sua obra dava testemunho de Sua unção divina.
Amor, misericórdia e compaixão se patenteavam em cada ato de Sua vida. Seu
coração anelava com terna simpatia pelos filhos dos homens. Revestiu-Se da
natureza humana para poder atingir as necessidades do homem. Os mais pobres e
humildes não receavam aproximar-se dEle. Mesmo as criancinhas para Ele se
sentiam atraídas. Gostavam de subir-Lhe aos joelhos e contemplar-Lhe o rosto
pensativo, que refletia bondade e amor” (Caminho
a Cristo, p. 12, 13).
Tudo Ele
fez e não cobrou nada, nem um centavo. É Seu prazer aliviar o sofrimento
humano. Esse é o nosso Deus.
(Hilton Bastos, ex-pastor da IURD)