O
fato de nós termos a capacidade de aprender braile, toda uma linguagem que
consiste apenas em diferentes relevos no papel, tornando possível que leiamos
com a ponta dos dedos, já é impressionante o suficiente. Mas cientistas da
Universidade da Califórnia, San Diego (UCSD) descobriram que o tato humano é
muito mais sensível do que conseguimos perceber: nós podemos sentir diferenças
em nível molecular em superfícies. “Essa é a maior sensibilidade tátil que já
foi demonstrada em seres humanos”, afirmou em um comunicado Darren
Lipomi, professor de nanoengenharia e membro do Centro de Sensores Portáteis da
Faculdade de Engenharia da UCSD. Ele liderou o projeto interdisciplinar ao lado
do renomado neurocientista Vilayanur Ramachandran, diretor do Centro para o
Cérebro e Cognição e professor do Departamento de Psicologia da UCSD.
De acordo com os
pesquisadores, essa descoberta será extremamente importante para o
desenvolvimento de peles eletrônicas, próteses que possam sentir, tecnologia
háptica avançada para realidade virtual e aumentada e outros. Tecnologias
hápticas não sofisticadas já existem em objetos do dia a dia, como controles de
videogame e celulares que vibram.
“Reproduzir sensações tácteis realistas é difícil porque ainda não entendemos
completamente as formas básicas nas quais os materiais interagem com o sentido
do toque”, explicou Lipomi.
No
cotidiano, conseguimos sentir facilmente a diferença entre segurar um copo de
vidro, um de cerâmica e um de plástico, por exemplo, porque essas superfícies
têm diferentes texturas – ou seja, absorvem o calor dos dedos em ritmos
diferentes. A pergunta que os pesquisadores da UCSD se fizeram foi: se
mantivermos todos esses efeitos de larga escala iguais e mudássemos apenas a
camada mais superior de moléculas, humanos conseguiriam sentir a diferença
apenas com o tato? Se sim, como?
“Os
receptores que processam sensações da nossa pele são filogeneticamente os mais
antigos, mas, longe de serem primitivos, eles tiveram tempo para desenvolver estratégias extraordinariamente sutis para
discernir superfícies – seja a carícia de um amante, cócegas ou a sensação tátil
de metal, madeira, papel”, conta Ramachandran. Ele acrescenta que esse é um dos
primeiros estudos a demonstrar a gama de “sofisticação
e sensibilidade extraordinária” das sensações táteis. “Ele abre o caminho,
talvez, para uma nova abordagem da psicofísica tátil.”
Segundo
o artigo publicado no periódico Materials
Horizons, os cientistas testaram se humanos conseguiam sentir a diferença –
arrastando ou batendo o dedo pela superfície – entre bolachas de silício cuja
única diferença era a camada superior de moléculas. Uma superfície tinha uma
única camada oxidada feita principalmente de átomos de oxigênio. Já a outra
tinha uma única camada composta de átomos de flúor e carbono, similar ao
teflon. A aparência de ambas era idêntica e eram suficientemente semelhantes ao
toque que alguns participantes não conseguiram diferenciar uma da outra.
O
fato de que os humanos conseguiram diferenciar uma da outra somente com o tato
se deve a um fenômeno conhecido como stick-slip
(“grudar-deslizar”, em tradução literal), o movimento repentino que ocorre
quando dois objetos em repouso começam a deslizar um contra o outro. É ele o
responsável pelo som emitido quando passamos o dedo pela borda de uma taça de
vinho, o ranger de uma porta ou o barulho de um trem parando, já que cada uma
das superfícies tem frequências de stick-slip
diferente devido às moléculas que compõem sua camada superior.
Em
um dos testes, 15 indivíduos receberam a tarefa de sentir três superfícies e
identificar a diferente entre elas – o índice de sucesso foi de 71%. Em outro,
os participantes receberam três tiras diferentes de bolacha de silício, cada
uma contendo uma sequência diferente de oito pedaços de superfícies oxidadas e
semelhantes ao teflon. Cada sequência tinha, por sua vez, uma cadeia de 8
dígitos de 0s e 1s, que codificava uma letra específica no alfabeto ASCII.
Os
indivíduos deveriam “ler” essas sequências arrastando um dedo de uma
extremidade a outra da tira e observar quais pedaços na sequência eram as
superfícies oxidadas e quais eram as superfícies semelhantes ao teflon. Nesse
experimento, 10 dos 11 indivíduos descodificaram os pedaços necessários para
soletrar a palavra “Lab” (com as letras maiúsculas e minúsculas corretas) mais
de 50% das vezes. Os participantes levaram uma média de 4,5 minutos para
decodificar cada letra.
Os
pesquisadores descobriram que a velocidade e a força do toque do dedo nas
superfícies também colaboram para a identificação pelo tato. As experiências
foram modeladas com um “dedo simulado”, um dispositivo semelhante a um dedo
feito de um polímero orgânico que é conectado por uma mola a um sensor de
força. Ele foi arrastado pelas superfícies usando múltiplas combinações de
força e velocidade de deslocamento, o que levou à conclusão de que ambos os
fatores influenciam na diferenciação.
Lipomi
explica que os resultados revelam uma notável habilidade humana para escolher
rapidamente as combinações certas de força e velocidade necessárias para sentir
a diferença entre superfícies.
“Também
é interessante que o dispositivo de dedo simulado, que não tem nada parecido
com as centenas de nervos em nossa pele, tem apenas um sensor de força e ainda
é capaz de registrar as informações necessárias para sentir a diferença nessas
superfícies. Isso nos diz que não são
apenas os mecanorreceptores na pele, mas os receptores nos ligamentos, juntas,
pulso, cotovelo e ombro que podem permitir que os humanos sintam pequenas
diferenças usando o toque”, acrescentou.
(Phys.org, UCSD, via Hypescience)
Nota:
A matéria acima admite de ponta a ponta algo que é bastante óbvio para qualquer
um: o sentido do tato (como qualquer outro dos sentidos) é de uma engenharia
tremendamente complexa e de tirar o fôlego. No entanto, a doutrinação
evolucionista é tão forte que Ramachandran apela para o deus tempo a fim de “explicar”
a existência dos sensores ultra-avançados que nos dão a sensação tátil. Isso
que não falaram dos neurônios especializados necessários para decodificar e
interpretar os sinais que chegam ao cérebro por meio dos nervos (o que aponta
para a complexidade irredutível). Será que, dado tempo suficiente, sensores
eletrônicos poderiam surgir e se aprimorar? Se não (e a resposta só pode ser
não), por que os sensores orgânicos muito mais complexos do corpo humano
poderiam ter surgido? [MB]
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