Exercício da cidadania |
De
dois em dois anos somos convocados a exercer nosso direito de escolher nossos
representantes. Falando assim, parece até um paradoxo ser convocado a exercer
um ato que, para ser um direito, deveríamos ser apenas convidados e não convocados. Mas, seja lá como for, o fato é que,
de dois em dois anos, temos eleições no Brasil e temos que comparecer perante
as urnas para exercer esse “direito-dever”. O problema é que para nós
adventistas está se tornando cada vez mais difícil escolher alguém que, além de
honesto, tenha um plano de governo que contemple toda a sociedade e, além
disso, tenha pelo menos respeito aos valores que defendemos. Acompanho a política
há muitos anos, porém, não consigo achar um candidato que reúna ao mesmo tempo
qualidades como honestidade, interesse pelo social, capacidade administrava e que,
pelo menos, tenha simpatia pelos valores que defendemos, além, é claro, de ser
um ardente defensor da democracia.
Quando
encontro alguém que tem simpatia pelos valores cristãos, por outro lado, é extremamente
conservador com relação ao social e ardente defensor do laissez-faire, onde se acredita que o mercado pode resolver todos
os problemas da humanidade. Por outro lado, quando encontramos alguém com maior
sensibilidade para as causas sociais, em contrapartida, é uma pessoa que
defende abertamente o aborto, o casamento entre pessoas do mesmo sexo e tem
aversão ao criacionismo, etc. E, por fim, temos nossa mais completa falta de
interesse pela política e pelos assuntos políticos, aos quais só nos referimos
de dois em dois anos, assim mesmo de forma acanhada e efêmera. Alguém pode justificar
essa conduta ou atitude argumentando que a política contém muito vícios e pouca
virtude, daí que o cristão deva se afastar dela para “não se contaminar”.
Contudo,
não vejo nessa justificativa algo muito saudável para a cidadania e para as mudanças
que almejamos. Não penso que alguém consiga ter bom discernimento político ou
faça uma boa escolha de seu representante atentando para o assunto somente em
época de eleições. Além disso, devemos ter em mente que não existem espaços
vazios no poder: se os bons ou melhores não ocupam esses espaços, obviamente
eles serão ocupados pelos piores ou coisa parecida. Não estou com isso
defendendo que o cristão se filie a um partido e saia por aí levantando
bandeiras ou participando de comícios de forma apaixonada. Não é isso. Falo de
estar cotidianamente informado dos assuntos relacionados à politica,
acompanhando o trabalho do seu deputado, senador, vereador; procurando conhecer
a historia dos partidos, comparando o que seu parlamentar defendeu no passado
com o que ele está defendendo no presente, etc.
É
assim mesmo. Ser politizado dá um pouco de trabalho, e para isso não se esqueça
de ler muito e filtrar as informações, principalmente aquelas vindas da TV e do
resto da grande imprensa. Lembrando sempre que não se deve usar a breve volta
de Jesus como desculpa para se eximir de suas responsabilidades como cidadão,
invocando aqueles velhos argumentos (clichês) de que tudo que está acontecendo é
cumprimento de profecias; que a sociedade não tem mais jeito; que na política
todo mundo é corrupto; coisas desse tipo, que podem nos deixar cada vez mais
insensíveis à dor do outro. Devemos votar e votar de forma consciente, sabendo
que com esse gesto podemos contribuir
para a melhoria da sociedade em que vivemos, levando em consideração que somos
somente candidatos ao Céu, mas que o nosso passaporte é adquirido com base na
vida que levamos agora.
Não
tente construir o Paraíso aqui nem contribua para o crescimento do inferno que
já estamos vivenciando. Use o bom senso e cumpra com seu dever de “forasteiro
terrestre” e futuro cidadão do Céu, onde tudo será perfeito; onde teremos nossa
sede de justiça saciada; onde todos estaremos sob o governo do amor e da
justiça; onde o Rei é o Criador e mantenedor de todas as coisas.
(Kleiner Michiles, sociólogo e membro do Núcleo de Cultura Política
do Amazonas)