quarta-feira, dezembro 16, 2015

Ex-militante lança livro sobre desilusão com o feminismo


Aos 23 anos, Sara Winter está numa fase de partos: há menos de três meses deu à luz, em casa, Hector Valentim, seu primeiro filho, e nesta semana traz a público seu livro digital de estreia: Vadia, Não! Sete Vezes que Fui Traída pelo Feminismo (R$ 12,50, disponível na internet). Como o título permite entrever, as 50 páginas são uma narrativa da desilusão da ex-ativista com o movimento por igualdade de gênero. Entre os episódios, há um em que uma colega de luta a deixa passando frio na rua, sem ter onde dormir, porque conseguiu beijar o homem que desejava há meses. Outro narra uma passagem em que um grupo insiste que ela experimente cocaína, à revelia de sua vontade. “Tinha muitas outras que ficaram de fora”, diz Winter, que se tornou figura pública aos 19 anos, por ter sido a primeira brasileira a integrar o Femen, grupo ucraniano de piqueteiras que protestam com o busto nu. Ainda responde a 13 processos, a maior parte deles por ato obsceno. “Não sei se vou ter dinheiro para comprar as cestas básicas.”

Rompeu com o Femen menos de dois anos depois, sob acusações de que era fascista e que havia roubado dinheiro – ela refuta ambas. “Fazia mais de um ano que eu tinha vontade de mostrar o que aconteceu comigo, mas eu achava que seria heresia se falasse mal do feminismo.”

Decidiu escrever os causos motivada pela raiva de ex-colegas que, segundo ela, a perseguem na internet, chamando-a de traidora ou coisa pior. “Começaram a dizer coisas sobre meu filho. Foi quando eu decretei: chega. É guerra, então é guerra. Vou contar parte dos perrengues que passei na mão delas.”

Sentou-se ao computador e escreveu em dez dias a obra, uma leitura de meia hora para um leitor habituado. Não há menções diretas ao Femen, mas é possível adivinhar quem são alguns personagens que ela mantém no anonimato. “Não queria comprar mais briga com essas mulheres de esquerda. As mulheres que mais me acolheram em toda a minha vida eram mulheres de direita ou que não têm ideia nenhuma de feminismo.”

Há dois meses, assumiu uma mudança de postura. Passou a se denominar pró-mulher. Diz ter recebido mais de 600 mensagens de mulheres que quiseram ser feministas e “foram humilhadas por não conhecerem temas específicos, serem apolíticas ou religiosas”. A terminologia não mudou o grosso de suas causas, assegura. “Eu estou praticando um feminismo diferente. O problema é que a palavra feminismo assusta muito, então parei de usar.”

“[O feminismo] virou mainstream. Isso ilude muito as meninas: o movimento não é essa coisa bonita que elas pensam ser.” Sua nova posição não é contrária ao feminismo, diz. “É um movimento que faz coisas boas para as mulheres? Faz, mas a maioria delas é burguesa, universitária, tem acesso à internet. Não chega até a mulher periférica.”

Ela mesma diz nunca ter sido ajudada pelas irmãs de causa. Durante a gravidez, uma ideia que considerara “absurda” até se concretizar, buscou ajuda de médicos que atendiam de graça em programas universitários. Em um deles, conheceu uma ONG que cuida de mulheres que querem dar continuidade à gravidez, ainda sem condições para tanto. Pré-natal, médico, psicólogo, um lugar para dormir. “Achei isso muito feminista.”

Gostou tanto da iniciativa que promete doar um real de cada livro vendido para organizações pró-vida. “O ato de abortamento eu sou contra. Sou a favor da legalização, mas só até 12 semanas de gravidez. Só sou a favor porque acho que a legalização diminui o número de abortos e a morte daquelas que não têm condição de fazer.” Ela afirma que não lutará para que a interrupção de gravidez seja descriminalizada.

Quando se viu grávida, voltou para a cidade interiorana de São Carlos, para ficar perto da mãe. Até então morava no Rio e havia saído há pouco do enlace com um militar, com quem casou-se em outubro para se separar em junho. O atual namorado, com quem ela tem “o melhor relacionamento da vida”, mora longe.

Mas Sara quer fincar raízes no interior. O ativismo nu foi uma época muito boa, mas que não pretende retomar. “Tenho pretensão de entrar para a política. Estou procurando um partido para me filiar e decidir a que cargo eu vou me candidatar.” Cogita concorrer a vereadora em São Carlos. “Eu quero fazer a diferença na vida das mulheres com políticas públicas.”