Em defesa da vida |
A
escritora Adélia Prado concedeu ao jornal O Globo uma entrevista interessante. Destaco aqui especialmente as respostas que
ela deu a duas perguntas sobre feminismo e aborto:
O movimento feminista,
que cada vez ganha mais força nas ruas, reunindo milhares de pessoas em
marchas, já sendo chamado de “primavera das mulheres”, a anima?
Não.
Homicídio tornou-se uma palavra fraca. Por que “feminicídio”? Me lembra
bandeiras, discursos irados, passeatas. O assassinato de mulheres é horrível
não porque é de mulheres, mas porque a mulher é também uma pessoa. Qualquer
assassinato é hediondo até prova em contrário. Enquanto nos distraímos com
bandeiras e neologismos, o crime segue fagueiro e impune contra homens,
mulheres, crianças, velhos, povos, contra a Humanidade. Dizer “feminicídio” não
muda a questão. A revolução é de outra ordem. É moral, educacional, religiosa,
civil, espiritual. Supõe um país que se dê ao respeito em suas instituições, um
povo educado, igrejas não mercenárias. Onde está o líder civil ou um santo que
nos leve a verdes pastagens e água pura?
Qual sua opinião sobre os
projetos de lei que criminalizam todo tipo de aborto, como o PL 5069?
“Não
matarás.”. Salvo se em legítima defesa. Como tornar legal o aborto se a
criança, inocente, incapaz, dependente da mãe para viver também é titular do
direito inalienável à vida? Qual vida vale mais? É bom não esquecer: a vida de
qualquer um é um valor em si mesma. Se a gravidez é uma ameaça real à vida da
mãe, instala-se uma situação das mais terríveis e complicadas que conheci até
hoje. Faz-se aborto por miséria, desespero, vergonha e egoísmo na maioria das
vezes. As leis civis e religiosas se turvam diante desse problema, antes de
tudo moral, de profunda complexidade e consequência. Necessita para sua
resolução muita coragem e discernimento, que nem sempre andam juntos. As
legislações, reconhecendo a natureza dramática do assunto, tentam contorná-lo
para resolvê-lo. A letra é fria e muitas vezes mata. Apelo ao último juiz para
o qual só existe um tribunal, o da consciência. Será sempre trágico agir contra
a luz desse juiz. Não há, fora da minha consciência, quem me proíba ou me
libere para o aborto. Obedecer à lei – para o sim ou para o não – nunca é
garantia de paz interior. Decidir pela vida é obrigação do legislador.
Considero “Meu corpo, minhas regras” uma empáfia, militância, cunha para extrair
variadas vantagens, inclusive a tentativa de descartar a consciência com aval
político.