sexta-feira, março 03, 2017

O milagre e a coragem na sala de aula

A incoerência deve ser revelada
Quando era jovem, lá pelos meus 17, 18 anos, comecei a estudar a Bíblia mais a fundo e passei a incomodar meus amigos católicos com minhas perguntas insistentes. Eram perguntas sinceras, como: “Por que cremos que devemos orar pelos mortos, se a Bíblia diz que eles estão ‘dormindo’ até a volta de Jesus?” “Por que devemos pedir a intercessão de Nossa Senhora e dos santos, se a Bíblia diz que somente Jesus é nosso único e suficiente intercessor?” “Por que batizamos crianças, se a Bíblia diz que os candidatos ao batismo devem crer e ser ensinados?” “Por que veneramos imagens, se a Bíblia, nos Dez Mandamentos, diz para não nos prostrarmos diante delas?” “Por que rezamos para a Virgem Maria, se em lugar algum a Bíblia diz que ela está no Céu nem que pode atender nossas orações?” “Por que guardamos o domingo, se o mandamento bíblico é para guardarmos o sábado e em lugar algum a Bíblia fala em algum tipo de anulação do quarto mandamento ou de substituição do sétimo dia por qualquer outro dia?” Por quê? Por quê? E por quê? Eram perguntas realmente sinceras. Eu era um líder na igreja, presidente de grupo de jovens e membro das pastorais da Juventude e da Comunicação. Minha intenção não era ofender nem provocar ninguém. Eu realmente queria saber o que a Bíblia ensina e por que não estávamos vivendo de acordo com esses ensinamentos. (Clique aqui e conheça um pouco mais da minha difícil história de conversão à verdade bíblica.)

Meus estudos e minhas perguntas continuaram, e o incômodo foi se alastrando. Até que a liderança da paróquia decidiu organizar um curso bíblico, por minha causa. Para instrutor, convidaram um ex-seminarista e professor de História. Todos estávamos ansiosos pelo início das aulas – eu mais ainda, afinal, poderia finalmente esclarecer minhas dúvidas com alguém mais experiente e conhecedor da Palavra de Deus.

Na primeira aula, numa quarta-feira à noite de meados de 1991, o professor começou sua exposição pelo livro de Êxodo, relacionando a história dos hebreus a movimentos como o dos Sem Terra. A Teologia da Libertação estava no auge e aquele professor era um legítimo representante dela, vendo em cada parte da Bíblia um exemplo de luta social. Quando chegou ao relato da saída dos hebreus do Egito e da passagem deles pelo Mar Vermelho, sua interpretação do texto causou estranheza até naqueles que não conheciam muito bem a Bíblia nem a estudavam. O professor simplesmente negou o relato bíblico dizendo que os judeus, na verdade, não haviam cruzado o mar, mas passado por ele com água talvez pela cintura, num momento de maré baixa. E foi desconstruindo praticamente todos os milagres relatados nas páginas sagradas. Levantei a mão algumas vezes, tentando contestar aquilo, mas foi inútil.

A turma, que devia ter inicialmente uns 30 ou 40 alunos, aos poucos foi minguando e o curso teve fim depois de poucas semanas. Nem preciso dizer que fiquei frustrado, mas, por outro lado, ainda mais motivado a me aprofundar no conhecimento das Escrituras e na correta exegese dos textos. Depois de dois anos e meio de pesquisas intensas e muita oração, acabei me tornando adventista do sétimo dia, por entender – e constatar – que, dentre todas as igrejas que pesquisei, a Adventista é a que tem as doutrinas verdadeiramente de acordo com a Bíblia Sagrada.

Por que estou contando tudo isso? Porque recebi nesta semana um texto interessante que me fez lembrar da história que narrei acima. Aqui está ele, com algumas adaptações:  

Na sala de aula, a professora pergunta:

– Hoje vamos falar sobre milagre. Quem sabe de algum?

– Eu sei de um milagre, professora – disse um aluno, e ela voltou a perguntar:

– Qual?

– A travessia dos israelitas pelo Mar Vermelho.

– Ora, aquilo não foi milagre! – ela interrompeu. – No lugar onde os israelitas atravessaram, em certas épocas do ano, a água baixa tanto que fica reduzida a uma camada de lama na altura dos tornozelos. Atravessar o Mar Vermelho não foi nenhum milagre.

E, dirigindo-se à turma, ela voltou a perguntar:

– Alguém pode citar algum milagre?

O mesmo aluno levantou a mão e disse:

– Tenho outro milagre para citar, professora.

– Qual? – ela perguntou, já com um tom de impaciência. E o menino respondeu:

– Os exércitos de faraó terem se afogado em uma camada de lama à altura dos tornozelos.

Michelson Borges