Já perdi a conta de quantos e-mails recebi e recebo com boatos e "lendas urbanas" (hoaxes) que sempre encontram alguém crédulo o bastante para acreditar nelas e as espalhar aos quatro ventos. São mensagens como aquela segundo a qual os computadores da Nasa teriam descoberto o "dia longo" relatado no livro bíblico de Josué. Ou, então, uma das mais "novas": teriam sido descobertas as rodas das carruagens do faraó que perseguiu os hebreus quando da fuga do Egito em sua passagem pelo Mar Vermelho. Essa e outras "descobertas" são atribuídas a um enfermeiro anestesista e arqueólogo amador chamado Ron Wyatt, falecido em 1999. Infelizmente, falsas evidências acabam por lançar descrédito sobre a Bíblia em lugar de autenticá-la. Evidências arqueológicas seguras há aos montões, por isso, aqueles que creem no Livro Sagrado não precisam (e não devem) se valer de boatos infundados para tentar atrair a atenção das pessoas.
A Revista Adventista deste mês traz um artigo do especialista em Arqueologia Bíblica Dr. Rodrigo Silva. No texto, intitulado "O êxodo que não existiu", ele analisa as tais evidências falsas de Wyatt. Eis aqui alguns trechos da matéria:
"Por mais de uma vez tive [diz Rodrigo] a oportunidade de visitar, com a equipe arqueológica da Universidade Andrews, os locais a que Wyatt faz referência. Coletamos dados, fizemos análises, entrevistas, etc. e, depois de tudo isso, posso afirmar, sem temor de erro, que essas descobertas são completamente falsas."
Segundo o Dr. Rodrigo, Wyatt também dizia saber o local onde fora escondida a Arca da Aliança. Depois de sua morte, seu substituto e principal aliado, Richard Rives, conseguiu autorização especial para escavar no local onde Wyatt disse ter visto e até fotografado a Arca. Porém, nada foi encontrado.
"[Wyatt] sustentava que o Golfo de Áqaba, perto de Nuweiba, seria o local da travessia dos hebreus. Ali, num trabalho arqueológico submarino, Wyatt disse ter encontrado ossos humanos e rodas das carruagens de faraó cobertas de corais..." Numa foto publicada na internet e disseminada num PowerPoint via e-mail, aparece uma roda de "ouro" (como ele foi preservado depois de 3.400 anos submerso em água salgada, Wyatt não explica) com quatro raios (aro quádruplo), mostrando semelhança com algumas rodas de carruagens antigas expostas em museus. "O que Wyatt não contou", diz Rodrigo, "é que os egípcios tinham dois tipos de carruagem: uma para a guerra, com aro sêxtuplo (...) e uma para passeios ocasionais, a quádrupla, que ele disse ter encontrado. Se a dita roda fotografada por Wyatt fosse mesmo autêntica, teríamos de perguntar por que faraó teria usado carruagens de passeio para perseguir o povo hebreu e deixado em casa as carruagens de guerra?"
As peças fotografadas por Wyatt provavelmente provieram de navios cargueiros que afundaram na região entre 1869 e 1981. A cidade de Hurghada, no norte do Mar Morto, chega a abrigar um sítio turístico para mergulhadores que desejam ver destroços de navios naufragados ali.
E Rodrigo conclui: "Não acreditemos apressadamente em tudo o que se diz na internet, nem propaguemos o boato através de e-mails do tipo FWD. A descoberta de uma fraude pode colocar em descrétido a verdadeira mensagem que devemos anunciar."