Nem
tudo que reluz é planeta. Um novo estudo acaba de colocar em xeque a descoberta
de mundos ao redor de outras estrelas recém-nascidas. Tudo pode não passar de
uma ilusão. Antes que alguém se apavore e jogue no lixo sua coleção de planetas
favoritos, é preciso enfatizar que isso afeta apenas uma ínfima parcela dos
mundos extrassolares anunciados pelos cientistas. A imensa maioria deles (cerca
de 900), detectada por outros métodos, segue firme e forte. Os que foram
afetados são aqueles inferidos pelo padrão de dispersão de gás e poeira num
disco ao redor de estrelas jovens. Sabe-se que planetas se formam em discos
como esses, pela aglutinação crescente de grãos de poeira, até que se formem
objetos suficientemente massivos para crescer por gravidade.
Em
alguns dos discos já observados, os cientistas detectavam vãos - que até o
momento eram explicados pela suposta presença de um planeta nas imediações. Contudo,
uma série de simulações feitas pelo brasileiro Wladimir Lyra (ganhador da bolsa
Carl Sagan, da Nasa) e pelo americano Marc Kuchner mostra que as trilhas vazias
podem surgir naturalmente, sem planeta nenhum. Ambos trabalham em centros da
Nasa (Lyra é do Laboratório de Propulsão a Jato, e Kuchner é do Centro Goddard
de Voo Espacial) e seu estudo acaba de ser publicado na revista científica
britânica Nature.
A
dupla mostrou que, ao realizar simulações mais complexas, incluindo não só a
poeira do sistema, mas também as pequenas quantidades de gás presentes, as
trilhas vazias aparecem naturalmente. “Encontramos uma instabilidade de
aglutinação que organiza a poeira em anéis estreitos e excêntricos”, escreveram
os dois em seu artigo.
É
um achado importante, porque, embora os planetas inferidos a partir dos discos
sejam poucos, eles eram tidos como a melhor pista da observação de formação
planetária “ao vivo”, ajudando assim a esclarecer como se dá esse processo. “Costuma-se
usar a detecção desses anéis para sugerir a presença de planetas, e inferir sua
massa e órbita”, disse Lyra à Folha. “Eu
me ponho do lado cético e acreditarei no planeta apenas quando me mostrarem o
dito cujo.”
O
trabalho coloca em xeque, por exemplo, a sugestão de que há dois mundos de
massa terrestre ao redor da estrela Formalhaut, a mais brilhante da constelação
de Peixes.
A
dupla, entretanto, é cautelosa em jogar no lixo a ideia dos planetas. “Nosso
modelo, apesar de ter a vantagem de não precisar de planetas, precisa de gás.
No caso de Formalhaut, não há gás detectado”, conta Lyra. “Mas isso pode ser
porque gás é difícil de medir.”
O
pesquisador ressalta que outros discos ao redor de estrelas como HD 61005 se
encaixam melhor com o modelo novo, que dispensa planetas.
Nota:
Como me escreveu um amigo, essa é “mais uma para sempre ficarmos muito atentos
às ‘novas descobertas científicas’ que tanto encantam e obscurecem nosso
discernimento”. Note as palavras de Lyra: “Eu me ponho do lado cético e
acreditarei no planeta apenas quando me mostrarem o dito cujo.” Essa deveria
ser a postura de todo cientista, evitando, assim, divulgar dados incompletos ou
hipóteses sem evidências, como se fossem fato. O povo sempre acredita, e duvido
que essa retificação terá a mesma divulgação das notícias sobre “descobertas”
de novos planetas.[MB]