segunda-feira, julho 08, 2013

Museu da Espanha exibe fóssil brasileiro adulterado

O fóssil de um pterossauro brasileiro superconservado é destaque em um dos principais museus de ciência do mundo, o CosmoCaixa, em Barcelona. Milhares de pessoas viram o bicho, inclusive muitos especialistas, mas só um paleontólogo achou que havia algo errado e foi a fundo no assunto. Acabou descobrindo uma falsificação. A peça era vista por muitos como um dos exemplares mais preservados do Cretáceo Inferior (entre 100 milhões e 145 milhões de anos atrás). O trabalho de Fabio Dalla Vecchia, no entanto, mostrou que se trata de uma espécie de “Frankenstein” paleontológico: uma composição de vários fósseis diferentes que são montados para darem a aparência de que são os restos de apenas um indivíduo. E mais: apesar de ser uma composição de vários animais diferentes, os cientistas não conseguiram provar que nenhum deles era, de fato, um Anhanguera piscator, como diz o museu. Algumas partes da peça nem fósseis eram, mas sim pedaços de plástico pintado. “A importância científica desse exemplar é bem menor do que nós pensávamos no início”, diz Dalla Vecchia.

Para descobrir a montagem, o cientista e seus colaboradores fizeram um verdadeiro trabalho de detetive. Com a autorização do museu, o grupo olhou o material com lentes de aumento. Já foi o suficiente para detectar algumas partes da composição, sobretudo as de plástico. O crânio e a mandíbula, o mais relevante cientificamente, foram removidos e submetidos a exames de luz ultravioleta e de tomografia computadorizada. O esqueleto não podia ser removido.

Eles identificaram que 50% do crânio e da mandíbula eram reconstituídos. Na parte que era verdadeira, houve uma combinação de partes de vários indivíduos. O cientista diz que devem existir vários casos semelhantes, já que essas falsificações são relativamente comuns.

Uma das mais famosas foi apresentada pela Sociedade Geográfica Nacional dos EUA em 1999 como o “elo perdido” da evolução dinossauro-pássaro. Batizado de Archaeoraptor liaoningensis, ele parecia ter o corpo de um pássaro com um rabo de dinossauro. Algum tempo depois, os cientistas viram que eram dois animais distintos colocados para parecerem um só.

O Museu Nacional do País de Gales foi outro atingido. Após 116 anos exibindo um suposto fóssil de Icthyosaurus, um réptil marinho, a instituição descobriu que se tratava de uma combinação de duas criaturas marinhas, com pedaços feitos de gesso.

Fósseis bem preservados são mais valiosos. Por isso, há muita gente que tenta dar uma “forcinha” para a natureza [ou seria melhor dizer: para a teoria da evolução], criando peças que são verdadeiros Frankensteins.

O antigo habitat do pterossauro Anhanguera piscator, na chapada do Araripe, no Nordeste, concentra uma grande diversidade de répteis voadores e é famoso pela boa conservação dos fósseis. [A chapada do Araripe concentra também abundância de fósseis marinhos longe do mar, é bom recordar.]

Por isso, muito embora venda de fósseis no Brasil seja proibida, é comum que pessoas explorem a área clandestinamente, já que eles são facilmente encontrados.

O trabalho de Della Vecchia foi apresentado no Rio Ptero, simpósio internacional de pterossauros no Rio, e provocou reações exaltadas da plateia. Ironicamente, por motivos distintos. A maioria dos pesquisadores brasileiros ressaltou que esse é o tipo de coisa que acontece quando se compra fósseis ilegalmente. Já os estrangeiros ficaram mais preocupados com a falta de confiabilidade de seus fornecedores regulares.

O museu, porém, diz não ter a intenção de tirar a peça de exposição. Jorge Wagensberg, diretor científico da Fundação la Caixa, diz que, em breve, a informação de que se trata de uma composição será inserida na descrição da peça.


Nota: Em outra matéria da Folha em que se afirma que Jorge Wagensberg, diretor científico da Fundação la Caixa (divisão de um banco espanhol que é dona do museu), sabia da montagem, ele afirma que as composições são um recurso que pode ser usado sem prejuízo quando o objetivo é explicar ao público alguns aspectos mais gerais, como a aparência de um fóssil de perto. Questionado se considerava correto comprar fósseis de países em que esse comércio é considerado ilegal, o diretor disse que só poderia responder sobre os aspectos científicos. Na verdade, o que se pode perceber é que a doutrinação evolucionista é mais importante do que os fatos. Wagensberg procura minimizar a fraude e ainda diz que, mesmo sendo fraude, ela pode ser útil! Imagine se algo dessa natureza fosse feito por um criacionista... Como me disse um amigo biólogo: “No tocante à dicotomia evolucionismo x criacionismo, fica evidente que a escassez de evidências tem levado à ‘criação de dados’ que apoiem o primeiro modelo. Isso também não é necessário em função do grande prejuízo. Imaginem quantas pessoas visitaram o tal ‘fóssil’, fizeram anotações, colocaram em trabalhos escolares, tiraram fotos e colocaram na parede do quarto! Quem irá até a casa dessas pessoas dizer que tudo não passou de uma ‘fraudezinha’? Aprendemos, mais uma vez, que devemos ser cautelosos com a divulgação de ‘informações’ científicas.”[MB]

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