Na
última década, pessoas residentes ou em trânsito no Brasil, assim como empresas
instaladas no país, se tornaram alvo de espionagem da Agência de Segurança
Nacional dos Estados Unidos (National Security Agency - NSA, na sigla em
inglês). Não há números precisos, mas em janeiro passado o Brasil ficou pouco
atrás dos Estados Unidos, que teve 2,3 bilhões de telefonemas e mensagens
espionados. É o que demonstram documentos aos quais O Globo teve acesso. Eles foram coletados por Edward Joseph Snowden
(foto ao lado), técnico em redes de computação que nos últimos quatro anos
trabalhou em programas da NSA entre cerca de 54 mil funcionários de empresas
privadas subcontratadas - como a Booz Allen Hamilton e a Dell Corporation. No
mês passado, esse americano da Carolina do Norte decidiu delatar as operações
de vigilância de comunicações realizadas pela NSA dentro e fora dos Estados
Unidos. Snowden se tornou responsável por um dos maiores vazamentos de segredos
da História americana, que abalou a credibilidade do governo Barack Obama.
Os
documentos da NSA são eloquentes. O Brasil, com extensas redes públicas e
privadas digitalizadas, operadas por grandes companhias de telecomunicações e
de internet, aparece destacado em mapas da agência americana como alvo
prioritário no tráfego de telefonia e dados (origem e destino), ao lado de
nações como China, Rússia, Irã e Paquistão. É incerto o número de pessoas e
empresas espionadas no Brasil. Mas há evidências de que o volume de dados
capturados pelo sistema de filtragem nas redes locais de telefonia e internet é
constante e em grande escala.
Criada
há 61 anos, na Guerra Fria, a NSA tem como tarefa espionar comunicações de
outros países, decifrando códigos governamentais. Dedica-se, também, a
desenvolver sistemas de criptografia para o governo. A agência passou por
transformações na era George W. Bush, sobretudo depois dos ataques terroristas
em Nova York e Washington, em setembro de 2001. Tornou-se líder em tecnologia
de Inteligência aplicada em radares e satélites para coleta de dados em
sistemas de telecomunicações, na internet pública e em redes digitais privadas.
O
governo Obama optou por reforçá-la. Multiplicou-lhe o orçamento, que é secreto
como os de outras 14 agências americanas de espionagem. Juntas, elas gastaram
US$ 75 bilhões no ano passado, estima a Federação dos Cientistas Americanos,
organização não governamental especializada em assuntos de segurança.
A
NSA tem 35,2 mil funcionários, segundo documentos. Eles informam também que a
agência mantém “parcerias estratégicas” para “apoiar missões” com mais de 80
das “maiores corporações globais” (nos setores de telecomunicações, provedores
de internet, infraestrutura de redes, equipamentos, sistemas operacionais e
aplicativos, entre outros).
Para
facilitar sua ação global, a agência mantém parcerias com as maiores empresas
de internet americanas. No último 6 de junho, o jornal The Guardian informou que o software Prism permite à NSA acesso aos
e-mails, conversas online e chamadas
de voz de clientes de empresas como Facebook, Google, Microsoft e YouTube (confira
aqui). [...]
A
interferência é sempre imperceptível: “Servimos em silêncio” - explica a
inscrição numa placa de mármore exposta na sede da NSA em Washington.
Espionagem
nesse nível, e em escala global, era apenas uma suspeita até o mês passado,
quando começaram a ser divulgados os milhares de documentos internos da agência
coletados por Snowden dentro da NSA. Desde então, convive-se com a reafirmação
de algumas certezas. Uma delas é a do fim
da era da privacidade, em qualquer tempo e em qualquer lugar.
Principalmente em países como o Brasil, onde o “grampo” já foi até política de
Estado, na ditadura militar.