segunda-feira, abril 18, 2016

Pakicetus, uma baleia com pernas?

A baleia fake da Science
“Estivemos ansiosamente antecipando alguma descoberta desse tipo, mas não estávamos preparados para uma evidência tão convincente da estreita relação faunal entre a Ásia oriental e a América do Norte ocidental, tal como é revelado por esse diminuto espécime.”[1] Essas palavras aparecem logo na quinta linha do artigo publicado por Henry F. Osborn em 1922 na revista Science, no qual ele descreve o famoso homem de Nebraska. A evidência tão convincente à qual ele se referia era um dente de cerca de 1 cm. Apenas isso. No artigo, Osborn discute detalhadamente as características do dente que o levaram a concluir que ele havia pertencido a um ancestral do homem. Em 1927, a Science se viu obrigada a publicar uma retratação com o título “Hesperopithecus apparently not an ape nor a man” (Hesperopithecus, aparentemente nem macaco nem homem).[2] O restante do esqueleto ao qual pertencia o dente havia sido encontrado. Tratava-se de um javali extinto!

Mas a ciência vive de erros e acertos e, naturalmente, o tipo de abordagem que levou ao homem de Nebraska seria revisto no futuro para que não se repetisse tamanho vexame. Certo? Errado. As baleias que o digam.

A capa da edição de 22 de abril de 1983 da Science, 61 anos depois da publicação do homem de Nebraska, estampava um animal meio mamífero terrestre, meio baleia.[3] Na ilustração, o animal saía da margem de uma praia e mergulhava para buscar comida na água. Tratava-se do Pakicetus, nome dado à estranha criatura encontrada no Paquistão.

O Dr. Philip D. Gingerish, líder da pesquisa que apresentou o Pakicetus à comunidade científica, declarou na época que “o Pakicetus e outros cetáceos do início do Eoceno representam um estágio anfíbio na transição evolucionária gradual das baleias primitivas da terra para o mar.”[3] Mas o que era realmente conhecido a respeito do Pakicetus? Apenas fragmentos dos ossos do crânio. A partir deles, todo o crânio foi reconstruído e nele foram adicionadas características que não podiam ser deduzidas apenas com base nos fragmentos. Supôs-se que o Pakicetus possuísse olhos nas laterais da cabeça, como as baleias, e um respirador no topo do focinho. Esse respirador estaria a meio caminho da posição dos respiradores das baleias modernas. Supôs-se, ainda, que o Pakicetus possuísse nadadeiras, que não tivesse um pescoço visível (como nas baleias) e que podia tanto caminhar em terra como nadar no mar, como as baleias.

Dezoito anos depois de o Dr. Gingerich ter encontrado os fragmentos do crânio do Pakicetus, outros quatro crânios parciais e 150 ossos de Pakicetus foram descobertos, permitindo que os cientistas construíssem um esqueleto quase completo.[4] Com base nas novas descobertas, pôde-se concluir que o Pakicetus não se assemelhava nada ao animal que estampou a capa da Science em 1983. Ele, na verdade, possuía um nariz na extremidade do focinho, não um respirador de baleia, pés preparados para correr (não nadadeiras), pescoço longo e visível (não ausente, como nas baleias) e olhos no topo da cabeça (não nas laterais). Não seria um exagero chamar o Pakicetus de a “baleia de Nebraska”. 

Mesmo assim, nos dias de hoje, ainda se insiste em que o Pakicetus esteja na linha de ancestralidade dos cetáceos modernos, com base em características como uma suposta semelhança entre suas bulas auditivas. Os cetáceos modernos possuem uma estrutura chamada de processo sigmoide, algo similar a um polegar estendido. Segundo o Dr. Zhe-Xi Luo, especialista em evolução de mamíferos, o Pakicetus não possuía um processo sigmoide na bula auditiva, mas simplesmente uma placa plana. Placas como essa são encontradas em mamíferos terrestres.[5] Observe a figura ao lado e tire suas próprias conclusões.

A história toda de como esse animal acabou sendo chamado de baleia é um exemplo muito interessante de como a visão de mundo de um cientista possui um peso decisivo em suas interpretações, especialmente quando tentamos reconstruir a história de um passado do qual sobraram apenas alguns vestígios. Os fragmentos de crânio encontrados pelo Dr. Gingerinsh constituem os dados experimentais dos quais ele dispunha. O significado que ele atribuiu àqueles fragmentos foi pura interpretação baseada em sua visão de mundo evolucionista.

A mídia científica muito frequentemente nos apresenta os dados fósseis e sua interpretação evolucionista como um conjunto indissociável. Extrapolações e inferências são apresentadas como fatos incontestáveis e se procura lançar ao ridículo aqueles que se atrevem a olhar para os mesmos dados com uma visão de mundo diferente. É preciso ter isso em mente quando nos forem apresentados os próximos homens-macaco e baleias com pernas.

Concepção artística atual do Pakicetus


Referências: 
[1] H. F. Osborn, “Hesperopithecus, the first anthropoid primate found in America”, Science (80-.). 55 (1922) 463-465. doi:10.1126/science.55.1427.463.
[2] W. K. Gregory, “Hesperopithecus apparently not an ape nor a man”, Science (80-.). 66 (1927) 579-581. doi:10.1126/science.66.1720.579.
[3] P. D. Gingerich, N. A. Wells, D. E. Russell, S. M. I. Shah, “Origin of Whales in Epicontinental Remnant Seas: New Evidence from the Early Eocene of Pakistan”, Science (80-.). 220 (1983) 403-406. doi:10.1126/science.220.4595.403.
[4] J. G. M. Thewissen, E. M. Williams, L. J. Roe, S. T. Hussain, “Skeletons of terrestrial cetaceans and the relationship of whales to artiodactyls”, Nature. 413 (2001) 277-281. doi:10.1038/35095005
[5] C. Werner, “Evolution: The Grand Experiment”, v. 1, 3rd ed., New Leaf Press, 2014.