Cadê o pensamento crítico? |
Se
você está se preparando para o vestibular, provavelmente está ciente da
importância de saber defender um ponto de vista para escrever um texto
dissertativo-argumentativo, gênero pedido na prova de redação de muitos
processos seletivos. Mas isso não é importante apenas para o vestibular: é
essencial para permitir o exercício do seu papel de cidadão, defende a
pesquisadora e pedagoga Noemi Lemes. E aí é que está o problema: segundo ela,
as escolas não preparam os alunos para isso. Para um estudo que desenvolveu pela Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP no ano passado, Noemi
acompanhou estudantes do terceiro ano do Ensino Médio - ou seja, época de
prestar vestibular - em escolas públicas da cidade de Ribeirão Preto, no
interior de São Paulo, para avaliar seus livros didáticos e seu desempenho em
redações dissertativo-argumentativas.
A
conclusão foi que três dos quatro livros analisados não trazia nenhuma
referência a qualquer teoria sobre argumentação e, em vez disso, apresentava
textos jornalísticos como exemplos de textos argumentativos a serem seguidos
pelos estudantes. Para Noemi, isso é preocupante porque, em vez de ensinar e
estimular o aluno a argumentar e defender seu ponto de vista, o material
didático incentiva apenas a reprodução de opiniões trazidas pela mídia. Com a
mera repetição de modelos, o aluno não tem contato com outros pontos de vista,
textos científicos e informações mais aprofundadas.
Usar textos como exemplos dá a ilusão de existir um posicionamento “correto” sobre determinado assunto, sem que ele tenha acesso a outros pontos de vista e forme sua própria opinião - o que já compromete muito a capacidade de argumentação do aluno. Assim, é fundamental ter acesso ao que Noemi chama de “arquivo” - uma série de textos sobre o tema em questão. Por exemplo, se o assunto é aborto, mais do que apenas ler um texto contra e outro a favor, o estudante deveria também ler textos de leis e artigos científicos sobre isso. Dessa forma, teria contato não apenas com opiniões diferentes, mas com diferentes sentidos em que o tema pode ser abordado.
Usar textos como exemplos dá a ilusão de existir um posicionamento “correto” sobre determinado assunto, sem que ele tenha acesso a outros pontos de vista e forme sua própria opinião - o que já compromete muito a capacidade de argumentação do aluno. Assim, é fundamental ter acesso ao que Noemi chama de “arquivo” - uma série de textos sobre o tema em questão. Por exemplo, se o assunto é aborto, mais do que apenas ler um texto contra e outro a favor, o estudante deveria também ler textos de leis e artigos científicos sobre isso. Dessa forma, teria contato não apenas com opiniões diferentes, mas com diferentes sentidos em que o tema pode ser abordado.
Além
disso, ela critica que a argumentação seja explorada só nos últimos anos escolares,
o que significaria subestimar a capacidade dos alunos de lidar com
conhecimentos mais profundos.
A origem da teoria da argumentação remonta ao filósofo grego Aristóteles e à sua obra de três volumes Retórica. “Um dos principais propósitos dessa obra é promover a participação ética e eficaz do cidadão no cotidiano da polis”, diz o estudo. Assim, de acordo com os preceitos aristotélicos, a argumentação não se resume a usar técnicas para o convencimento do outro - envolve a formação de um “cidadão crítico, ético e hábil para exercer bons julgamentos diante das questões que lhe são colocadas, dentro e fora da escola”.
Em outras palavras, Noemi defende a argumentação não apenas para que o aluno possa produzir um bom texto para o vestibular, mas para a sua formação enquanto sujeito crítico atuante no meio político e no ambiente social. “Aprender isso deve ser entendido como um direito do sujeito e é estranho que isso seja negado. Saber argumentar numa sociedade é importante para exercer a cidadania, fazer valer seus direitos e se colocar no mundo”, disse ela ao Guia do Estudante, acrescentando que entender como funcionam os mecanismos de persuasão permite não apenas produzir seus próprios discursos, mas também interpretar criticamente os dos outros, identificando técnicas e ideologias e tornando-se menos manipulável.
O que os alunos podem fazer? Noemi recomenda, tanto a eles quanto aos professores, pesquisar a teoria (o que inclui estudar a obra Retórica de Aristóteles) e ler muito - mas ler “criticamente”, procurando identificar as intenções e técnicas de persuasão usadas. Ao treinar para escrever sobre determinado tema, procure ler sobre ele em várias fontes diferentes.
A origem da teoria da argumentação remonta ao filósofo grego Aristóteles e à sua obra de três volumes Retórica. “Um dos principais propósitos dessa obra é promover a participação ética e eficaz do cidadão no cotidiano da polis”, diz o estudo. Assim, de acordo com os preceitos aristotélicos, a argumentação não se resume a usar técnicas para o convencimento do outro - envolve a formação de um “cidadão crítico, ético e hábil para exercer bons julgamentos diante das questões que lhe são colocadas, dentro e fora da escola”.
Em outras palavras, Noemi defende a argumentação não apenas para que o aluno possa produzir um bom texto para o vestibular, mas para a sua formação enquanto sujeito crítico atuante no meio político e no ambiente social. “Aprender isso deve ser entendido como um direito do sujeito e é estranho que isso seja negado. Saber argumentar numa sociedade é importante para exercer a cidadania, fazer valer seus direitos e se colocar no mundo”, disse ela ao Guia do Estudante, acrescentando que entender como funcionam os mecanismos de persuasão permite não apenas produzir seus próprios discursos, mas também interpretar criticamente os dos outros, identificando técnicas e ideologias e tornando-se menos manipulável.
O que os alunos podem fazer? Noemi recomenda, tanto a eles quanto aos professores, pesquisar a teoria (o que inclui estudar a obra Retórica de Aristóteles) e ler muito - mas ler “criticamente”, procurando identificar as intenções e técnicas de persuasão usadas. Ao treinar para escrever sobre determinado tema, procure ler sobre ele em várias fontes diferentes.
Dicas para uma boa
argumentação: veja alguns pontos presentes na Retórica do filósofo grego Aristóteles
Há
três gêneros retóricos, dos quais derivam também três gêneros do discurso: o
deliberativo (aquele que induz a fazer ou a não fazer algo, muito usado por
conselheiros e indivíduos que se dirigem a assembleias públicas), o forense
(que envolve a acusação ou a defesa de alguém) e o demonstrativo (que se ocupa
do louvor ou da censura de algo ou alguém). Saiba qual o tipo mais adequado
antes de começar seu texto.
Seja
claro. Se o discurso não deixa claro o que pretende, não cumpriu sua função.
Além disso, é preciso usar formato, linguagem e estilo que sejam adequados ao
tema.
Os
discursos podem ter quatro partes (que não precisam, necessariamente, estar
dispostas em quatro parágrafos): o prólogo (na qual o autor deixa clara a
finalidade do discurso, preparando os ouvintes), a exposição, a demonstração ou
prova (com os argumentos do autor em favor de sua ideia) e o epílogo (a
conclusão, na qual o autor amplifica o tema, relembra os ouvintes dos
argumentos fundamentais e finaliza o discurso). Os mais importantes são a
exposição e a prova.
Tente
despertar emoções em seus leitores. Isso aumenta as chances de o leitor ficar
mais receptivo às suas ideias. Só não exagere e banque o sensacionalista -
equilíbrio é fundamental.
Coloque-se
na posição do leitor e tente antecipar os efeitos de sentido do seu texto, bem
como possíveis contra-argumentos à ideia que você defende. Então, adicione ao
seu texto argumentos para contrapor possíveis opiniões contrárias.
Você
pode usar recursos como a metáfora, especialmente se usar relações novas,
propondo um modo diferente de olhar para o tema. Fuja de estereótipos e
lugares-comuns - é o efeito “surpresa” que pode dar ainda mais força à sua
argumentação.
Outros
recursos possíveis são entimema e silogismo. Enquanto este traz duas premissas
e uma conclusão, no entimema acontece algo semelhante, com a diferença de que
uma ou mais premissas podem ser suprimidas por serem consideradas óbvias ou já
conhecidas.
Nota:
Uma ótima maneira de ensinar os alunos a argumentar e ter pensamento crítico é
o ensino do contraditório. No que diz respeito à biologia, por exemplo, isso
não acontece, porque o evolucionismo (para mencionar um conteúdo) é ensinado
como verdade incontestável. Os alunos passam pelos bancos escolares recebendo
informações filosóficas que os incapacitam a questionar o modelo evolutivo/naturalista.
Quando chegam à universidade, já estão “formatados” e não levantam qualquer
questionamento. Ellen White, em seu livro centenário Educação, diz que o objetivo da verdadeira educação é ensinar os
alunos a pensar e não a ser meros reprodutores do conhecimento alheio. Quem
dera todas as escolas seguissem esse conselho. [MB]