Fé na passarela? |
Foi
muito bom ficar isolado do mundo num retiro espiritual promovido pela igreja, enquanto muitas pessoas caíam na folia do carnaval. Estava totalmente alheio
às notícias que, no Brasil, nessa época, praticamente giram em torno da festa
que toma conta das telas, como um espetáculo inebriante de cores, luzes e
corpos desnudos. Isso até que resolvi dar uma olhada nos noticiários da
internet para me atualizar um pouco e, logo de cara, me deparei com a
informação de que a escola de samba vencedora do desfile em São Paulo tem como tema
de seu samba enredo a fé. Veja só a notícia publicada no Portal UOL: “Com
o enredo ‘Andar com fé eu vou... que a fé não costuma falhar!’, a Mocidade
Alegre foi eleita tricampeã do Grupo Especial de São Paulo no Carnaval
2014. Entre os pontos altos do desfile da agremiação do bairro do
Limão estiveram a comissão de frente de olhos vendados - em referência à
fé cega -, e uma ‘paradona’ da bateria, com coreografia em que os ritmistas
ficavam de joelhos. A presidente da escola, Solange Bichara, que
chegou a passar mal durante o desfile e foi atendida com arritmia
cardíaca, também teve um mal-estar depois do fim da apuração, quando a escola
foi anunciada campeã. Cercada de repórteres e chorando, Solange agradeceu. ‘Meu
Deus do céu eu não acredito. Obrigada barracão, obrigada comunidade. Vocês são
demais’, disse. ‘Não acredito. Preciso de uma água’, exclamava ela,
visivelmente emocionada. ‘A fé, o respeito e educação do sambista vencem
sempre. Não gosto de cantar vitória antes’, completou.”
Em
primeiro lugar, a verdadeira fé não é cega. É amparada em evidências bastante
razoáveis e até racionais, e num relacionamento de amizade com um Deus que Se
revela principalmente por meio de um Livro que tem se demonstrado confiável. Fé
cega é aquela que mistura folia com religião; santidade com irreverência; o
santo com o profano. Isso, sim, é cegueira espiritual. Fé cega é achar que Deus
torce para algum time de futebol ou que resolveu dar uma mãozinha para uma
escola de samba somente porque seus bateristas se ajoelhavam como parte de uma
coreografia. Fé cega é achar que Deus Se agrada de que símbolos religiosos
(ainda que inócuos) sejam misturados com nudez e erotismo barato, como no caso
da atriz (ou modelo, não sei) que colocou crucifixos como parte de sua fantasia
ou do homem que se vestiu de padre e fez o sinal da cruz para uma sambista nua.
Tremendo desrespeito.
Teriam coragem de debochar de um gay ou um islâmico? |
Crucifixos como parte da fantasia |
É
uma pena que o Brasil seja conhecido principalmente como o país do carnaval e
do futebol. Quem dera fosse conhecido pela educação de seu povo; por seus
prêmios Nobel; pelos investimentos em saúde e infraestruturas realmente
relevantes e não em estádios de futebol que, passada a Copa, serão apenas monumentos
nababescos a compor o cenário de algumas cidades. Quem dera nosso país fosse
verdadeiramente cristão e não uma nação de pagãos travestidos de seguidores de Jesus,
que “se acabam” na festa da carne nos três ou quatro (ou seis, ou dez) dias de
carnaval e, depois, fazem suas penitências (quando fazem) achando que, com
isso, conseguem que Deus lhes passe a mão na cabeça, deixando pra lá seus
pecados e sua devassidão. Já que conseguem "dar um jeitinho" para tudo, por que não com o Criador?
Enquanto
multidões rebolavam nas avenidas, nas ruas e nos sambódromos, os disparates e
desmandos do nosso governo esquerdista levaram outras multidões a se
mobilizarem nas redes sociais num estranho apoio saudosista do regime militar e
num flerte perigoso com as ditaduras do outro lado do espectro político, querendo
nos colocar entre a foice e as espada, entre uma ditadura e outra. A que ponto
chegamos! Por causa de uma democracia mal e porcamente administrada vamos
desejar a repressão?
Por um lado, fico feliz em ter me unido à
maioria dos brasileiros que não curte carnaval (de
acordo com pesquisa realizada pelo Ibope neste ano, a maioria dos brasileiros,
57%, não gosta/detesta/gosta pouco do carnaval. E somente 43% adoram ou gostam
muito. Enquanto que 30% dos brasileiros caem na folia, 65% aproveitam esse
período para descansar). Por outro, fico triste em ver tanta
alienação, confusão e irreverência.
Michelson Borges