sexta-feira, maio 09, 2008

Físicos voltam a estudar a idade do Santo Sudário

A obsessão pela relíquia mais controversa da cristandade acaba de voltar aos laboratórios. Pesquisadores da Universidade de Oxford, no Reino Unido, e do Turin Shroud Center, nos Estados Unidos, estão investigando a possibilidade de uma contaminação rara no Santo Sudário, a mortalha de linho que supostamente teria envolvido o corpo de Jesus Cristo após sua morte na cruz. Se tal contaminação ocorreu mesmo, a idade do Sudário estimada pela datação com carbono-14 - apenas uns 700 anos, indicando que o pano é uma fraude medieval - estaria incorreta.

A nova bateria de testes é uma prova de como a imagem enigmática do Sudário continua fascinando cientistas e leigos, exatos 20 anos depois do suposto teste definitivo de sua autenticidade - no qual a mortalha acabou não passando. E também mostra como é difícil um estudo objetivo do artefato: é quase impossível encontrar uma visão científica consensual sobre o pano, com acusações de má-fé feitas tanto por defensores quanto por detratores da relíquia.

Caso se trate mesmo de uma falsificação, também não há uma explicação universalmente aceita de como ela teria sido criada. Um livro que acaba de chegar ao Brasil defende a tese de que se trata de uma espécie de fotografia primitiva, usando uma argumentação interessante, mas força a barra ao atribuir a obra a ninguém menos que o personagem favorito das teorias da conspiração, o gênio Leonardo da Vinci.

O teste original da idade do Santo Sudário, hoje abrigado na Catedral de São João Batista em Turim (Itália), aparentemente seguiu à perfeição as exigências do método científico. Três grupos diferentes - da Unidade de Acelerador de Radiocarbono de Oxford, da Universidade do Arizona (EUA) e do Instituto Federal de Tecnologia da Suíça - receberam amostras da borda do pano, longe da imagem, e as submeteram à datação por carbono-14.

Nesse tipo de teste, estuda-se o desaparecimento gradual dessa forma radioativa e instável de carbono. O carbono-14 é absorvido por todos os seres vivos - inclusive as plantas usadas para fazer o linho do Sudário - durante seu metabolismo. Quando morrem, todos possuem uma proporção parecida de carbono-14 em suas moléculas, e essa proporção decai a uma taxa fixa ao longo do tempo. Com isso, a idade de qualquer amostra de matéria orgânica pode ser estimada.

Ora, os três laboratórios obtiveram resultado parecido: o pano teria sido tecido entre os anos 1260 e 1390, no final da Idade Média. No entanto, John Jackson, do Turin Shroud Center, propõe que o Sudário pode ter sido contaminado por monóxido de carbono (CO), uma molécula na qual o carbono-14 aparece em proporções anormalmente altas.

"Uma quantidade relativamente pequena de monóxido de carbono, equivalente a uns 2% do carbono no linho [do Sudário], seria o suficiente para alterar a idade da amostra em cerca de mil anos", declarou em comunicado oficial o diretor da Unidade de Acelerador de Radiocarbono de Oxford, Christopher Ramsay. "Estamos colaborando com a equipe de John Jackson para verificar as taxas de reação [do CO com o pano]."

Ramsay, no entanto, lembra que nenhuma amostra datada por carbono-14 até hoje apresentou esse tipo de problema, graças principalmente à pequena quantidade do monóxido de carbono na atmosfera. No entanto, Jackson aposta que o incêndio que quase destruiu o pano no século 16 poderia ter criado as condições necessárias para o suposto erro de datação.

"A equipe de Jackson ainda não conseguiu replicar essas condições, mas continua sendo possível, embora não muito provável, que futuros experimentos comprovem a idéia deles", afirma Ramsay. Os laboratórios estão realizando experiências para tentar verificar se, em alguns contextos, a absorção maciça de CO pelo tecido acontece mesmo. ...

No fim das contas, acreditar nessa tese [de Leonardo Da Vinci] vira quase tão questão de fé quanto acreditar na autenticidade do Sudário - a qual, é bom lembrar, não tem importância nenhuma para a fé cristã. Afinal, em nenhum lugar do Novo Testamento se diz que Jesus deixaria uma prova física de sua Ressurreição para forçar os descrentes a segui-lo.

(G1 Notícias)

Nota: Esse "santo" sudário, seja o que for, foge ao padrão de comportamento de Jesus, que evitou deixar objetos pessoais preservados a fim de não alimentar a idolatria. Mas o que me chama mesmo a atenção na matéria é a admissão de que as amostras datadas por carbono 14 podem ser contaminadas e fornecerem dados discrepantes. Numa amostra de poderia ter alguns séculos, a contaminação por pequenas quantidades de CO poderia aumentar a idade em até um milênio. O que poderíamos esperar de uma amostra de osso que tivesse estado na natureza por alguns milênios, exposta à ação de um vulcão, dos gases provenientes da Revolução Industrial ou mesmo nas proximidades de um aeroporto, por exemplo? Isso só reforça a conclusão de que o método do C-14 é lógico e bom, mas não muito confiável.[MB]