sexta-feira, maio 09, 2008

Por uma visão crítica da mídia


Michel Collon, autor de Monopoly, l'OTAN à la conquête du monde e de Bush: Le cyclone foi entrevistado por Grégoire Lalieu, do Centre des Jeunes Indigo de La Louvière, da Bélgica, em outubro do ano passado. Abaixo, alguns trechos da entrevista:

Você acha que seria necessário ministrar nas escolas um curso de educação sobre a mídia?

Acho que seria indispensável pois a mídia nos manipula todos os dias. Ela omite grande parte da realidade. Cada guerra é econômica. Quando se ataca o Afeganistão ou o Iraque é para que as multinacionais se apossem das suas riquezas ou das suas posições estratégicas. E cada guerra é acompanhada por uma guerra da informação que manipula a opinião pública com o que chamo de "mídia-mentiras". Seria preciso, portanto, que os jovens fossem vacinados contra esse género de práticas, que eles pudessem compreender por que e como a informação é manipulada.

Como as multinacionais exercem pressão sobre a mídia?

Os grandes meios de comunicação têm orçamentos publicitários indispensáveis ao seu financiamento. Eles não podem, portanto, ir contra os interesses das multinacionais que fornecem essa publicidade, como as empresas petrolíferas ou automobilísticas. Essas multinacionais dão golpes sujos no Terceiro Mundo mas a mídia não tem o direito de falar nisso sob pena de perder uma parte importante das receitas geradas pela publicidade.

A maior parte dos meios de comunicação pertence a grandes grupos financeiros. Isso tem influencia a liberdade de expressão?

Evidentemente. Para possuir uma cadeia de televisão hoje é preciso ser multimilionário. Pense em Berlusconi ou em Rupert Murdoch. Será que um multimilionário vai informar os pobres de modo objetivo? Nada menos certo! Quando uma multinacional quer pôr a mão nas riquezas minerais do Congo ou no petróleo do Oriente Médio ou da Venezuela, ela entra em conflito de interesses com a população desses países que desejaria que o dinheiro dessas riquezas não partisse para o estrangeiro e ficasse ali para assegurar cuidados de saúde e educação a toda a gente.

Portanto, quando nos deparamos com um conflito é preciso verificar se nos apresentam as versões das duas partes. E muito freqüentemente não temos senão o ponto de vista das multinacionais, possuidoras dos meios de comunicação ou que fazem a mídia viver graças ao orçamento publicitário.

Concretamente, como deveria ser o curso de educação para a mídia?

É preciso distinguir entre um verdadeiro curso de educação para a mídia e o que se faz agora, que tem mais a ver com campanhas comerciais para que os jovens se tornem clientes perpétuos de tal ou tal mídia. Esse curso deveria permitir aprender a analisar as imagens, criticar a informação e procurar alhures o que não é dito. Muito freqüentemente, a mídia não diz senão uma parte da realidade e esconde elementos essenciais.

Esse curso deveria igualmente ser interativo e provocar a participação dos jovens, que seriam levados a reagir e a refletir sobre essas imagens, a perguntar-se se elas são verdadeiras ou falsas, quem poderia manipular e por que... Uma outra atividade divertida que experimentei consiste em dividir a turma em dois "países inimigos". O Iraque e os Estados Unidos, por exemplo. E cada grupo deve fazer o seu próprio telejornal destinado a servir aos seus próprios interesses. É uma maneira lúdica de apreender as engrenagens da manipulação da informação.

A mídia exerce influência sobre os jovens?

Certamente, ainda que os jovens não sigam forçosamente o jornal da televisão. A mídia hoje faz tudo para investir na Net e recapturar esse público jovem. Por outro lado, a manipulação midiática não se faz unicamente através dos telejornais ou dos jornais diários. É preciso saber que após os atentados do 11 de Setembro, reuniram-se a Casa Branca, o Pentágono e as grandes companhias de Hollywood. Estava em causa melhorar a comunicação de George W. Bush e definir os países inimigos dos quais se iria falar mal nas grandes produções cinematográficas.

As idéias das multinacionais e do governo norte-americano são igualmente veiculadas pelos filmes e pelas novelas que condicionam a opinião pública. Numa série policial, o terrorista malfeitor nunca é norte-americano, quando na verdade é o governo dos Estados Unidos que comete mais atos de terror e crimes de guerra por todo o mundo.

Os filmes, as novelas da televisão e mesmo a publicidade veiculam toda uma série de valores que condicionam o pensamento. E são ainda mais perigosos do que um jornal de informação na medida em que são muito mais insidiosos. A série 24 Horas, muito bem feita e palpitante, serve para justificar a tortura praticada pelos serviços norte-americanos.

Hoje, concretamente, o que é que um jovem pode fazer para se informar bem?

A Internet oferece numerosas possibilidades para escapar ao monopólio das grandes televisões. Aconselho a olhar num mesmo dia os telejornais das diferentes cadeias a fim de constatar que todos eles dizem as mesmas coisas e que escondem as mesmas coisas. É preciso, portanto, procurar alhures aquilo que não se encontra nas grandes mídias. É o que tento desenvolver com o meu site na internet, no qual divulgo artigos independentes vindos do mundo inteiro. Penso que é preciso encorajar os jovens a procurar informação dessa maneira.

Há vários anos que o governo da comunidade francesa (da Bélgica) fala de um curso de educação sobre a mídia, mas este projeto ainda não viu a luz. Sabe por que?

Não. Em todo o caso, um jornal da televisão não se avalia como uma pizza, é preciso refletir no que ele tem por trás. As autoridades não desejam entrar em conflito com as multinacionais. Mas se não se fizer a educação para a mídia de maneira crítica, dando a palavra àqueles que não estão de acordo com o domínio das multinacionais sobre a informação, então não será possível realmente falar de educação. Será apenas formatação.

Que interesse vê no encontro com jovens?

Já encontrei todas as espécies de público, nomeadamente nas escolas, e os jovens são muitas vezes mais abertos, mais curiosos, mais indignados quando constatam mentiras e injustiças. Escrevi um livro sobre a educação para a mídia, intitulado Attention, medias!, publicado em 1991. Preparo agora uma nova obra, um manual para a mídia, que será muito concreto e prático. O objetivo é que possa ser utilizado por professores, jovens, animadores, para desenvolver um sentido crítico da mídia. Para mim, o público jovem é realmente um público prioritário.

Colaboração: Carlos Bettanin