terça-feira, janeiro 13, 2015

Je suis chrétien (eu sou cristão)

Intolerâncias, desrespeito e morte
Eu sou cristão e não concordo com qualquer tipo de violência, desde a que derrama sangue até aquela que ofende a consciência. Não concordo com os radicais islâmicos porque querem impor sua fé doentia e exclusivista ao restante da humanidade e porque não toleram os que pensam diferente e os que ousam abandonar sua religião. Sou cristão e não posso concordar, também, com pessoas que achincalham a crença dos outros e que se valem da imprensa e de outros meios, não para comentar ou até mesmo criticar civilizadamente ideias, mas para desrespeitar as convicções alheias, e fazem isso com a justificativa de se tratar de “liberdade de expressão”. Sou cristão e me solidarizo com as famílias que sofrem a perda daquelas dez pessoas que trabalhavam no Charlie Hebdo (além dos dois policiais mortos), mas também choro porque centenas de milhares de cristãos são assassinados todos os anos e a “grande imprensa” parece ignorar o triste fato (confira aqui e aqui). A ONU não se manifesta, não são feitos protestos em praça pública, nem vigílias, nem nada. Sou cristão e me entristeço ao ver um mundo que prega a tolerância e a paz, mas que vive cada vez mais polarizado entre intolerantes e intolerantes que parecem amar da discórdia.

Sou cristão, não sou Charlie nem terrorista. Desejo a paz e a boa convivência com todos. Desejo a liberdade de me expressar, porém, sem ofender quem quer que seja. Desejo que haja respeito e aceitação do diferente, porque, na verdade, na essência, não somos diferentes. Somos todos filhos do mesmo Criador e descendentes dos mesmos pais – apenas nos esquecemos disso, ou nos fizeram esquecer. A xenofobia se insere nesse contexto de esquecimento das nossas origens. A teimosia provocatica da Charlie Hebdo também. Mesmo com tudo o que aconteceu, eles afirmam que continuarão desrespeitando os muçulmanos. O advogado da publicação disse que o espírito do “eu sou Charlie” significa também “o direito à blasfêmia”. Por isso eu não sou Charlie. Sou cristão. Publicar charges de Maomé é como chutar uma estátua católica ou queimar a bandeira de um país. É ofensivo. Desperta mais ódio. Gera mais violência.

Sou cristão e leio com certa desconfiança as palavras de um papa que, num momento como esse, diz que é preciso condenar as formas “desviantes de religião”. Já o vi condenando o “fundamentalismo” que, segundo ele, se trata de, entre outras coisas, crer na literalidade da Bíblia, especialmente em seus primeiros capítulos (confira aqui e aqui). Já o vi dizendo que não se deve obedecer à lei de Deus ao pé da letra (confira) e que os criacionistas acreditam num Deus “mágico”, porque sustentam que Ele criou a vida neste planeta em seis dias literais, como descreve o Gênesis (confira). Já assisti a um programa de TV britânico em que um padre chama um pastor adventista de fundamentalista pelo simples fato de crer que Jesus voltará nas nuvens do céu, verdade afirmada mais de 2.500 vezes nas Escrituras (confira). Então, ser criacionista é ter uma fé “desviante”?

Sou cristão e decidi seguir Jesus e pautar minha vida pelo exemplo e pelos ensinamentos dEle. Jesus Se referiu a Adão e Eva como personagens reais, históricos. Comparou os dias anteriores ao dilúvio aos dias que precederiam Sua segunda vinda, considerando históricos ambos os eventos. Para os padrões religiosos de hoje, o próprio Jesus teria uma fé “desviante”. Mas eu sou cristão e fico do lado de Cristo. Até o fim. Mesmo que tenha que depor a vida por isso - ou ser injustamente chamado de fundamentalista. Mas jamais farei mal a uma mosca nem desrespeitarei a religião dos outros. Isso porque sou cristão. Je suis chrétien.

Michelson Borges

Em tempo: Em 2011, a França proibiu os muçulmanos de orar em público (confira). Isso afetou cerca de cinco milhões de pessoas. O que mais será proibido no futuro?