Enquanto
a Folha de S. Paulo entrevista
adolescentes ateus e dá a essas reportagens títulos sensacionalistas (confira), e vive concedendo espaço para ateus
militantes como Richard Dawkins (confira), o
jornal O Estado de S. Paulo faz
jornalismo melhor, “ouve” o outro lado e entrevista gente que realmente tem o
que dizer para contribuir efetivamente na discussão. Em 2009, por exemplo, o Estadão entrevistou John Lennox, professor em
Oxford e autor de livros como Por Que a Ciência Não Consegue Enterrar Deus?.
Leia a entrevista:
Como o senhor contaria
a história do Universo, com base no design
inteligente?
Bem,
no início, Deus criou o mundo. Quando isso aconteceu, eu não sei. A Bíblia não
diz. A melhor estimativa hoje é em torno de 13 bilhões de anos atrás. Não vejo
problema com isso. A descrição científica do Universo se expandindo a partir de
um ponto inicial é fascinante, porque foi só a partir dos anos 60 que os
físicos começaram a falar nisso. Por séculos, eles aceitaram a versão de
Aristóteles, de que o Universo sempre existiu. Mas a Bíblia sempre disse que
houve um início. É o que eu chamo de convergência. Ciência e teologia buscam
respostas para perguntas muito diferentes, mas não totalmente diferentes.
Então o senhor não vê
conflito entre a ciência do Big Bang e a teologia da Criação?
Não.
O que o Big Bang nos diz é que houve um início, representado por uma
singularidade (um ponto de massa e densidade infinitas). O que os cientistas
fazem é apontar para trás e dizer sinto muito, não posso ir além desse ponto,
porque aqui as leis da física deixam de funcionar. A pergunta lógica que se faz
é: Qual é a causa dessa singularidade? Aí entram as Escrituras e dizem: Deus é
responsável. Isso não é anticiência, é algo que faz sentido.
Mas a mesma pergunta
pode ser feita sobre Deus: Se ele criou o Universo, quem criou Deus?
Se
você me pergunta isso, significa que você pensa em Deus como algo que foi
criado. A maioria de nós (cristãos) nunca acreditou nisso. A pergunta que não
quer calar é outra, muito mais profunda: Existe algo eterno, que nunca foi
criado? Deus é eterno, segundo a fé cristã; Ele não foi criado, sempre existiu.
Perguntar quem o criou é absurdo. E o que dizer sobre a matéria e a energia? Os
materialistas acreditam que elas são eternas. De ambos os lados do debate há
uma realidade definitiva. Para mim, essa realidade é Deus. Para o materialista,
é matéria e energia. Então, não venha discutir comigo sobre quem criou Deus. A
verdadeira pergunta que devemos fazer é: Para que lado apontam as evidências?
O que diz o design inteligente?
É
importante contextualizar isso, porque estou cansado das interpretações
equivocadas que são feitas. A pergunta que está na base do assim chamado “movimento
do design inteligente” é esta: Há
evidências científicas de que o Universo não é um sistema fechado; de que houve
um input de inteligência na sua
criação? O que buscamos fazer com isso é separar a questão científica da
questão teológica. Imagine o seguinte: você e eu voamos para Marte e
encontramos lá várias pilhas de cubos de titânio. A primeira pilha tem dois
cubos, a segunda três, depois 5, 7, 11, 13 e assim por diante, seguindo a ordem
de números primos. O que você acharia disso? Certamente alguém esteve lá antes
de nós, mas quem? Podemos concluir que aquilo é um arranjo inteligente, mesmo
sem saber a identidade da inteligência que o criou. Agora, você acha que o fato
de o Universo ser inteligível é evidência do quê? De uma inteligência superior
que o criou, ou de um processo aleatório e despropositado?
Como é que a evolução
se encaixa nesse modelo?
Temos
que ter cuidado aqui, pois a palavra evolução
é como a palavra criacionismo; ela
pode ter várias definições, e não vejo problema com algumas delas. Não vejo
problema com o que Darwin observou. Ele foi um gênio! A seleção natural faz
algumas coisas, como mudar bicos de pássaros e coisas assim. O erro está em
acreditar que a evolução faz tudo. A evolução pressupõe a existência de um
organismo replicador mutante. Ela não pode explicar a existência daquilo que é
mutado, não pode explicar a origem da vida. Não estou dizendo que processos
naturais não estão envolvidos; estou dizendo que a inteligência tem que estar
envolvida desde o início. Se você define a natureza como aquilo que a física e
a química podem fazer, a vida parece ser algo sobrenatural. Processos naturais
são ótimos para transmitir informação, mas não para criar informação.
O senhor acredita que
Deus criou uma única forma de vida primordial, da qual todos os seres vivos
evoluíram, ou que todas as espécies foram criadas por Deus da maneira como
existem hoje?
Não
quero ser dogmático sobre isso. Nós já conversamos sobre a singularidade que
existia na origem do Universo. Os físicos concordam que houve um início, então
eles estão em acordo com a Bíblia nesse aspecto. No primeiro capítulo da Bíblia
está escrito: “E Deus disse: faça-se a luz.” Então eu imagino que Deus falou e
criou o Universo. Depois Ele falou de novo, e houve outras singularidades.
Talvez uma delas tenha sido a criação da vida.
Mas o que foi criado
exatamente? Vou colocar a pergunta de outra forma: O senhor acredita na
ancestralidade comum de todos os seres vivos, como propõe Darwin?
Ora,
isso está sendo disputado profundamente pelos cientistas neste momento. Não sou
geneticista, mas estou muito impressionado com as novas argumentações que estão
surgindo nessa área. Elas mostram que a árvore da vida está morta. O que eu
acredito é que houve pontos específicos na história em que Deus introduziu
coisas novas, que não podem ser explicadas apenas pelos processos naturais que
já estavam em curso. Os momentos mais importantes foram a criação do Universo,
da vida biológica e da vida humana. Não acredito que os seres humanos evoluíram
de alguma forma animal, puramente por processos naturais.
O ser humano, então,
seria uma singularidade criada por Deus, como o Universo? Ele foi criado da
forma como existe hoje?
Isso
é o que eu acredito. O que você teria visto se estivesse lá no momento da
criação, eu não sei dizer. O que sei é que os seres humanos são seres únicos em
toda a criação. A Bíblia diz que eles foram feitos à imagem de Deus. Em resumo,
minha atitude é muito simples: sem Deus, não se pode chegar do nada a alguma
coisa. Sem Deus, não se pode chegar do material ao vivo. Sem Deus, não se pode
chegar do animal ao humano. Acredito nisso não por uma questão de fé, mas
porque é o que as evidências me levam a crer.
É justo que um
materialista, como o senhor diz, exija provas de que Deus existe para acreditar
nele?
Sem
dúvida, desde que você me explique o que quer dizer por “provas”. Eu trabalho
numa área - a matemática - em que “prova” tem um significado muito específico.
É claro que eu não posso provar matematicamente que Deus existe. Mas eu posso
dar evidências e fazer uma argumentação com base na ciência e em outras
disciplinas. Assim como não posso provar que minha mulher me ama, mas tenho
muitas evidências disso. Richard Dawkins diz que ter fé é acreditar em algo
sobre o qual não há provas. Mas isso é a definição dele. Isso é fé cega. Eu sou
um cristão, e a fé cristã é o oposto da cegueira. Ela é baseada em evidências,
como a ressurreição de Cristo, sobre a qual há evidências históricas, diretas e
indiretas.