sexta-feira, janeiro 24, 2014

Prefira as “versões amigáveis”

Versões hostis não levam a nada
Ao ler Introdução à Filosofia da Religião, de William L. Rowe, especificamente o capítulo “O problema do mal” (no qual o autor aborda o problema lógico e o problema indiciário do mal), destaco o seguinte trecho:

“É preciso não confundir a perspectiva de que uma pessoa pode ter justificação racional para aceitar o teísmo enquanto outra pessoa tem justificação racional para aceitar o ateísmo com a perspectiva incoerente de que o teísmo e o ateísmo podem ser ambos verdadeiros. Dado que o teísmo (no sentido estrito) e o ateísmo (no sentido estrito) exprimem afirmações contraditórias, um tem de ser verdadeiro e o outro falso. Mas como os indícios de que se dispõe podem justificar a crença numa afirmação que, à luz da totalidade dos indícios é falsa, é possível pessoas diferentes terem justificação racional para acreditar em afirmações que não podem ambas ser verdadeiras. Suponha-se, por exemplo, que uma amiga sua embarca num avião para o Havaí. Horas depois da decolagem você descobre que o avião caiu no mar. Depois de uma busca de vinte e quatro horas, não se encontram sobreviventes. Nestas circunstâncias é racional que o leitor pense que a sua amiga não sobreviveu. Mas dificilmente será racional que ela própria acredite nisso enquanto está a boiar ao sabor das ondas com um colete salva-vidas, perguntando-se por que razão os aviões de busca não conseguem encontrá-la. O teísmo e o ateísmo não podem ser ambos verdadeiros. Mas na medida em que a experiência e o conhecimento diferem de pessoa para pessoa, uma pode ter justificação racional para aceitar o teísmo ao passo que outra tem justificação racional para aceitar o ateísmo.

“Caracterizamos o teísta como alguém que pensa que o Deus teísta existe e o ateu como alguém que pensa que o Deus teísta não existe. À luz do nosso estudo do problema do mal, talvez devamos introduzir distinções complementares. Um ‘ateu amigável’ pensa que uma pessoa pode ter justificação racional para acreditar que o Deus teísta existe. Um ‘ateu hostil’ pensa que ninguém tem justificação racional para acreditar que o Deus teísta existe. Há que fazer distinções semelhantes a respeito do teísmo e do agnosticismo. Um ‘agnóstico hostil’, por exemplo, é um agnóstico que pensa que ninguém tem justificação racional para acreditar que o Deus teísta existe e que ninguém tem justificação racional para acreditar que o Deus teísta não existe. Mais uma vez, temos de observar que o ateu (ou o teísta) amigável não acredita que o teísta (ou o ateu) tem uma crença verdadeira, apenas que pode perfeitamente ter justificação racional para adotar essa crença. Talvez a lição final a retirar do nosso estudo do problema do mal seja que as versões amigáveis do teísmo, do agnosticismo e do ateísmo são todas preferíveis às versões hostis.”

Todos temos nossas razões diante de um mundo e uma realidade misteriosos e complexos. Teísta, ateísta ou agnóstico - sejamos amistosos uns com os outros: o diálogo torna-se muito mais proveitoso e empolgante. Procuremos compreender o porquê de cada um. Afinal, a Verdade quer se manifestar. Não devemos ofuscá-la com os nossos preconceitos irracionais. 

(Frank de Souza Mangabeira, membro da Igreja Adventista do Bairro Siqueira Campos, Aracaju, SE; servidor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Sergipe)