segunda-feira, agosto 22, 2016

Brasil tem bactéria resistente ao mais poderoso antibiótico

Perigo crescente
Recentemente descoberto na China e também encontrado em países da Europa, da Ásia e da África, o gene mcr-1, que causa resistência a uma classe de antibióticos utilizados justamente para tratar infecções por bactérias multirresistentes, foi identificado pela primeira vez no Brasil em cepas da bactéria Escherichia coli isoladas de animais criados para abate. Os pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) responsáveis pela identificação da bactéria também reportaram o primeiro caso de infecção humana no Brasil, em um hospital de alta complexidade em Natal (RN), por uma cepa da bactéria portadora do gene e resistente à Colistina (polimixina E), um dos mais poderosos antibióticos, considerados como último recurso no tratamento de infecções produzidas por bactérias que não respondem a outras drogas. “A aparição desse gene no Brasil pode contribuir para o surgimento de bactérias totalmente resistentes aos antibióticos, com risco de enfrentarmos uma situação similar ao que foi a era pré-antibiótica, quando doenças comuns, como uma infecção urinária ou um ferimento profundo na pele, levavam facilmente a óbito”, alerta Nilton Lincopan, responsável pela pesquisa.

Descoberta em 1949, a produção da Colistina foi descontinuada entre a década de 1970 e o ano 2000 por sua elevada toxicidade, ficando o antibiótico restrito ao uso veterinário. A partir do ano 2000, entretanto, com a emergência de bactérias produtoras de enzimas responsáveis por provocar resistência a praticamente todos os antibióticos beta-lactâmicos, como as penicilinas, a Colistina voltou a ser utilizada como última alternativa terapêutica no tratamento de infecções produzidas por micro-organismos multirresistentes, principalmente associados a surtos de infecção hospitalar.

Por muito tempo os cientistas acreditaram que o desenvolvimento da resistência bacteriana à Colistina seria um processo difícil. “Porém, no fim do ano passado, um artigo alarmante foi publicado na revista Lancet Infectious Diseases, em que pesquisadores chineses descreveram a identificação de um novo gene (o mcr-1) que confere resistência contra polimixina E e polimixina B”, relembra Nilton.

Ainda mais preocupante, de acordo com o pesquisador, foi a descoberta de que o gene é facilmente transferível de uma espécie bacteriana a outra por meio de plasmídeos, fragmentos de DNA extracromossômicos que podem se replicar autonomamente e que podem ser transferidos entre diferentes espécies bacterianas por conjugação - processo de reprodução das bactérias por meio do qual pedaços de DNA passam diretamente de uma para a outra. O fragmento de DNA transferido se recombina com o material genético da bactéria receptora, produzindo novas combinações genéticas que serão transmitidas às células-filhas na próxima divisão celular.

Cepas bacterianas carregando o gene mcr-1 foram encontradas tanto em animais de abate como em seres humanos, levantando suspeitas sobre a existência de uma cadeia na disseminação da resistência à Colistina que começa a partir do uso do antibiótico na alimentação animal, propagando-se para os animais abatidos, os alimentos derivados e o ambiente.

De fato, o gene mcr-1 agora já foi identificado em cepas de bactérias clinicamente importantes, como Escherichia coliSalmonella spp. e Klebsiella pneumoniae. “O aspecto mais assustador sobre o gene é a facilidade com que ele é transferido entre diferentes espécies bacterianas. Consequentemente, algumas bactérias hospitalares têm alinhado esse gene junto a outros de resistência a antibióticos, favorecendo que a espécie bacteriana receptora fique resistente a praticamente a totalidade dos medicamentos. Assim, se um paciente estiver gravemente infectado, por exemplo, por uma E. coli, não haverá nada que se possa fazer”, diz o pesquisador.

(Diário da Saúde)

Nota: Dois aspectos relevantes nos contextos dietético e criacionista: (1) note-se o problema do uso de antibióticos na alimentação dos animais criados para consumo humano e o risco que isso representa; (2) depois de supostos milhões de anos de história evolutiva, com tanta facilidade de transferência de genes entre as bactérias, elas continuam a ser bactérias. Se adaptam, mas nunca macroevoluem. [MB]