quinta-feira, agosto 04, 2016

Laudato Si é livro de cabeceira da elite política francesa

O jornal francês sobre economia Les Echos entrevistou cerca de 200 líderes do âmbito político e econômico na França, para saber quais eram seus livros de cabeceira. Para saber quais são os livros que inspiram tomadas de decisão dessa verdadeira elite política e intelectual francesa, foi feita a pergunta: “Em um mundo instável, imprevisível e complexo, que livros poderiam nos ajudar a compreender e agir?” Entre os vinte livros mais citados, estão desde clássicos como A arte da guerra, de Sun Tzu, ou Ensaios, de Michel de Montaigne, até obras de atualidade sobre a revolução informática e suas consequências na organização dos negócios, a economia, as últimas crises financeiras, passando por reedições de autores consagrados (Primo Levy, Stefan Zweig), livros de história ou biografias de empreendedores. A grande surpresa, no entanto, foi a presença do papa Francisco na lista. De fato, a encíclica Laudato Si ocupa o 9º lugar entre os títulos mais citados por personalidades políticas e empresariais da França. “Um papa argentino de 79 anos critica vigorosamente o sistema econômico atual e resulta ser um dos autores mais citados pelo establishment francês”, escreveu a Les Echos ao comentar o resultado da pesquisa. “Quem poderia acreditar! Em particular, é a Laudato Si, redigida em 2015, a que marcou os espíritos. Um texto de 192 páginas em que o Papa faz um chamado para salvaguardar nossa “casa comum”. Fustiga nosso modelo econômico e social baseado no consumismo extremado, nossa ‘cultura do descarte’. Fala da dívida ecológica que o Norte tem com o Sul, da falta de acesso à água potável, da perda da biodiversidade. E invoca a ideia de ‘decréscimo’.”

“O cardeal Bergoglio não é economista”, avalia o texto da Les Echos, não cita cifras, nunca apoia suas análises em teorias. Tudo vem de sua experiência de pastor em Buenos Aires, em contato com os pobres. Seu desejo? Instaurar uma “ecologia humana”, escutar “tanto os gritos da terra, como dos homens”. Laudato Si teve uma repercussão especial na véspera da Conferência de Paris sobre o clima [...]. Outros textos citados do papa Francisco são O nome de Deus é misericórdia e a Alegria do Evangelho.”

Laudato Si é recomendada, por exemplo, por Pierre-André de Chalendar (da multinacional Saint-Gobain, especializada em engenharia de materiais) e pela deputada Nathalie Kosciusko-Morizet, ex-ministra de Ecologia, Desenvolvimento Sustentável, Transporte e Habitação.

Mesmo que a inclusão de textos de Bergoglio possa surpreender num primeiro momento, duas tradições francesas poderiam explicá-la: por um lado, a vigência do catolicismo francês (muito frutífero, em especial no plano das ideias) e, por outro, a força que teve nesse país a ideia de um capitalismo social, em contraposição ao outro, considerado “selvagem”.

Basta recordar o já clássico ensaio de Michel Albert, Capitalismo contra capitalismo, que postula a existência de um modelo “renano” ou de uma “economia social de mercado”, oposta ao ultraliberalismo, porém, respeitosa dos mecanismos de mercado, que seria a de países como França e Alemanha.


Nota: Faltou a Les Echos mencionar que a Laudato Si dedica toda uma seção para defender a guarda do domingo como uma das “soluções” para o aquecimento global (fenômeno que talvez nem ocorra como se prevê [confira]). De qualquer forma, fica claro que o papa Francisco e suas ideias têm grande influência sobre os poderosos deste mundo. No Brasil, também há organizações e lideranças estudando a encíclica. [MB]

O tempo presente é de dominante interesse para toda pessoa. Governadores e estadistas, homens que ocupam posições de confiança e autoridade, homens e mulheres pensantes de todas as classes, têm sua atenção posta nos acontecimentos que tomam lugar ao nosso redor. Estão observando as relações que existem entre as nações. Eles examinam a intensidade que está tomando posse de cada elemento terreno, e reconhecem que algo grande e decisivo está para acontecer – que o mundo está no limiar de uma crise estupenda” (Ellen G. White, Profetas e Reis, p. 537).