O cientificista queridinho da Veja |
Parece
que a revista Veja tornou a apontar
seus canhões na direção dos teístas e dos criacionistas. Há duas semanas,
publicaram na seção “Página Aberta” um artigo do presidente da Associação Brasileira
de Ateus e Agnósticos (Atea), Daniel Sottomaior. E nada de contraponto na seção
que nada tem de aberta (confira aqui). Agora voltaram à carga com uma entrevista concedida ao site de Veja pelo cientista pop do momento, o astrofísico Neil deGrasse Tyson, que está
lançando um livro no Brasil dez anos depois do lançamento nos Estados Unidos (outro detalhe curioso: livros de apologetas
cristãos são ignorados pela mídia secular brasileira). De quando em quando, a
maior semanal do Brasil privilegia figuras carimbadas do ateísmo militante,
como Richard Dawkins e
outros, e “se esquece” de conceder espaço para pensadores que defendem o “outro
lado”. Aliás, o próprio Tyson já foi entrevistado pela Veja no ano passado (confira aqui). Perde o jornalismo. Perdem os leitores da revista. Perdem os brasileiros. Leia a seguir alguns trechos da nova entrevista concedida por Tyson, e meus comentários entre colchetes [MB]:
Não há motivo para as
pessoas serem céticas quanto à ciência?
Aqueles
que dizem não confiar na ciência geralmente têm outra filosofia, que pode ser
política ou religiosa, por exemplo. Só não podemos esquecer que a ciência é um
caminho para encontrar verdades objetivas. Você pode ter verdades pessoais,
como “Jesus é meu salvador”. Motivo: se quiser convencer outra pessoa disso,
precisará repetir isso com frequência ou travar uma guerra, obrigando-os a
concordar com você. Não há provas factíveis [o cientista depende muito de seus
sentidos e de seu bom senso, em várias situações. E confia neles para fazer
ciência. Por que a experiência de alguém que aceita Jesus como Salvador tem que
ser desprezada? Quem disse que o método científico, por mais útil que seja, é a
única forma de descobrir a verdade? O bom ceticismo sempre será útil, ainda que
aplicado à ciência. Não fosse assim, poderíamos estar acreditando ainda hoje em
hipóteses descartadas há muito tempo]. Já a verdade objetiva é verdade, quer
você acredite nela ou não. É com base nelas que legislações deveriam ser
criadas. De qualquer forma, a fronteira da ciência é sempre complicada e as
coisas que se provam erradas são geralmente as que aparecem nos jornais. Mas
uma vez que uma hipótese é testada muitas vezes, por pessoas e países
diferentes, e se chega ao mesmo resultado estatisticamente, ela se torna um
fenômeno emergente em suas mãos. [Tyson se revela um tremendo cientificista. E
não é de se estranhar: como ateu declarado, ele só tem a ciência a que se
apegar, e qualquer coisa classificada como “sobrenatural” (ou seja, além do
escrutínio limitado dos nossos métodos) será rejeitada. Mas é bom que se frise
que essa rejeição ocorre com base em pressupostos filosóficos, não
necessariamente “científicos”.]
Há no livro uma seção
sobre a relação da ciência com a religião. Algumas das expressões que você usa
são: “São abordagens inconciliáveis” e “não há concordância”. Ao mesmo tempo,
você aponta uma pesquisa que mostra que 20% dos astrofísicos são religiosos.
Afinal, é possível conciliar?
Esses
cientistas mantêm cada uma dessas coisas em partes separadas do cérebro. É só
isso. [Com essa alegação, Tyson nega a experiência de grandes nomes da ciência,
como Newton, Galileu, Pascal e tantos outros, para os quais ciência e religião
eram plenamente conciliáveis. Aliás, muitos desses cientistas atribuíam suas
descobertas à cosmovisão teísta que defendiam, pelo fato de não limitar suas
lentes conceituais unicamente ao naturalismo. Além disso, Tyson revela
arrogância ao se atrever a descrever como seus colegas cientistas pensam. Um
ateu querendo explicar o cérebro de crentes!] Eles só podem dizer que a
religião deles não conflita com a ciência se rejeitarem todas as alegações
científicas feitas por sua religião [uau! Então Tyson conhece todas as alegações
científicas da religião para dizer que elas devem ser rejeitadas? Sabe mais de
religião do que seus pares religiosos? Será que ele ignora que muitas
descobertas da ciência foram antecipadas nas páginas da Bíblia? Será que ele
ignora que não existe contradição alguma entre a ciência experimental e a
Bíblia? Ou quer forçar a barra, tentando transformar em ciência o que se trata
de metafísica, como as alegações sobre a origem do Universo e da vida, eventos
além do escrutínio de qualquer ferramenta científica?] No cristianismo, por
exemplo, há um capítulo inteiro na Bíblia sobre a Origem. Eles devem rejeitar
sumariamente tudo dito no Gênesis, porque o que é dito lá se opõe à evolução e
à história, ou mesmo à idade da Terra [sim, o relato do Gênesis se opõe à
evolução e à idade da vida na Terra, ambos temas ainda controvertidos; mas que
fique claro: o Gênesis se opõe à evolução (macro), não à ciência. Tyson quer
fazer crer que sejam sinônimos, mas não são]. Então eles, os
cientistas-religiosos, rejeitam essa parte e mantêm os elementos de
enriquecimento espiritual [novamente o ateu quer falar por seus pares que creem.
Conheço muitos cientistas cristãos que não rejeitam nada da Bíblia e, no entanto,
fazem boa ciência – um desses, inclusive, acabou de ser condecorado com uma
medalha de excelência científica, no Canadá]. Assim as duas ideias podem coexistir dentro da mesma mente. Pode ser
devastador para algumas pessoas, porque é a sua religião, sua filosofia, mas em
certo ponto é preciso superar isso. Aceite, as conclusões científicas são
verdades objetivas. [E muitos cientistas, como Tyson, procuram a coexistência
em sua mente da ciência com o ateísmo e o naturalismo, posições filosóficas não
derivadas da ciência nem demonstráveis cientificamente. Estamos no mesmo barco,
Sr. Tyson. E o senhor deveria superar seu ateísmo filosófico a fim de se abrir
a outras possibilidades.]
Algumas vezes, o senhor se
refere a “pessoas com sexto sentido” ou a áreas como a astrologia como
“bobagens místicas que sempre falham no teste científico”. Se não há base
sólida, por que o público se interessa tanto por essas “bobagens” – muitas
vezes mais do que por assuntos científicos?
Alguns
gostam de acreditar que têm mais poderes que os outros. Por exemplo, o “poder”
de prever o futuro é muito valorizado na cultura e na sociedade. Se você diz
que consegue realizar isso, as pessoas vão aparecer na sua porta. Mesmo se não
apresentar provas dessa capacidade. Mas na física e na astrofísica também
conseguimos fazer previsões: podemos dizer a que horas o Sol vai nascer ou
quando vai acontecer um eclipse solar total. A precisão é tanto que acertamos
inclusive o tempo exato, em segundos, em que esses fenômenos irão correr. Mesmo
assim, alguns preferem os autointitulados profetas. [Aqui a revista Veja manifesta uma hipocrisia sem
tamanho, partilhada por outros meios de comunicação. Tenta colocar no mesmo “saco”
a religião bíblica e pseudociências como a astrologia, o que, por si só, já é
um absurdo (confira). No entanto, muitas vezes já dedicou suas páginas para promover conteúdos
espíritas, ocultistas, esotéricos, etc. Grandes jornais “seculares” até hoje mantêm
colunas de astrologia. Então não me venham falar de criacionismo como se fosse
uma crendice! Há muito mais evidências em favor dele do que da astrologia, por
exemplo.]
[Por fim, note que Tyson não fala necessariamente em “superar o criacionismo”. Isso ficou por conta dos editores da Veja. Colocaram palavras na boca dele. - MB]