segunda-feira, agosto 29, 2016

Neil deGrasse Tyson: “É preciso superar o criacionismo”

O cientificista queridinho da Veja
Parece que a revista Veja tornou a apontar seus canhões na direção dos teístas e dos criacionistas. Há duas semanas, publicaram na seção “Página Aberta” um artigo do presidente da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (Atea), Daniel Sottomaior. E nada de contraponto na seção que nada tem de aberta (confira aqui). Agora voltaram à carga com uma entrevista concedida ao site de Veja pelo cientista pop do momento, o astrofísico Neil deGrasse Tyson, que está lançando um livro no Brasil dez anos depois do lançamento nos Estados Unidos (outro detalhe curioso: livros de apologetas cristãos são ignorados pela mídia secular brasileira). De quando em quando, a maior semanal do Brasil privilegia figuras carimbadas do ateísmo militante, como Richard Dawkins e outros, e “se esquece” de conceder espaço para pensadores que defendem o “outro lado”. Aliás, o próprio Tyson já foi entrevistado pela Veja no ano passado (confira aqui). Perde o jornalismo. Perdem os leitores da revista. Perdem os brasileiros. Leia a seguir alguns trechos da nova entrevista concedida por Tyson, e meus comentários entre colchetes [MB]:

Não há motivo para as pessoas serem céticas quanto à ciência? 

Aqueles que dizem não confiar na ciência geralmente têm outra filosofia, que pode ser política ou religiosa, por exemplo. Só não podemos esquecer que a ciência é um caminho para encontrar verdades objetivas. Você pode ter verdades pessoais, como “Jesus é meu salvador”. Motivo: se quiser convencer outra pessoa disso, precisará repetir isso com frequência ou travar uma guerra, obrigando-os a concordar com você. Não há provas factíveis [o cientista depende muito de seus sentidos e de seu bom senso, em várias situações. E confia neles para fazer ciência. Por que a experiência de alguém que aceita Jesus como Salvador tem que ser desprezada? Quem disse que o método científico, por mais útil que seja, é a única forma de descobrir a verdade? O bom ceticismo sempre será útil, ainda que aplicado à ciência. Não fosse assim, poderíamos estar acreditando ainda hoje em hipóteses descartadas há muito tempo]. Já a verdade objetiva é verdade, quer você acredite nela ou não. É com base nelas que legislações deveriam ser criadas. De qualquer forma, a fronteira da ciência é sempre complicada e as coisas que se provam erradas são geralmente as que aparecem nos jornais. Mas uma vez que uma hipótese é testada muitas vezes, por pessoas e países diferentes, e se chega ao mesmo resultado estatisticamente, ela se torna um fenômeno emergente em suas mãos. [Tyson se revela um tremendo cientificista. E não é de se estranhar: como ateu declarado, ele só tem a ciência a que se apegar, e qualquer coisa classificada como “sobrenatural” (ou seja, além do escrutínio limitado dos nossos métodos) será rejeitada. Mas é bom que se frise que essa rejeição ocorre com base em pressupostos filosóficos, não necessariamente “científicos”.]

Há no livro uma seção sobre a relação da ciência com a religião. Algumas das expressões que você usa são: “São abordagens inconciliáveis” e “não há concordância”. Ao mesmo tempo, você aponta uma pesquisa que mostra que 20% dos astrofísicos são religiosos. Afinal, é possível conciliar? 

Esses cientistas mantêm cada uma dessas coisas em partes separadas do cérebro. É só isso. [Com essa alegação, Tyson nega a experiência de grandes nomes da ciência, como Newton, Galileu, Pascal e tantos outros, para os quais ciência e religião eram plenamente conciliáveis. Aliás, muitos desses cientistas atribuíam suas descobertas à cosmovisão teísta que defendiam, pelo fato de não limitar suas lentes conceituais unicamente ao naturalismo. Além disso, Tyson revela arrogância ao se atrever a descrever como seus colegas cientistas pensam. Um ateu querendo explicar o cérebro de crentes!] Eles só podem dizer que a religião deles não conflita com a ciência se rejeitarem todas as alegações científicas feitas por sua religião [uau! Então Tyson conhece todas as alegações científicas da religião para dizer que elas devem ser rejeitadas? Sabe mais de religião do que seus pares religiosos? Será que ele ignora que muitas descobertas da ciência foram antecipadas nas páginas da Bíblia? Será que ele ignora que não existe contradição alguma entre a ciência experimental e a Bíblia? Ou quer forçar a barra, tentando transformar em ciência o que se trata de metafísica, como as alegações sobre a origem do Universo e da vida, eventos além do escrutínio de qualquer ferramenta científica?] No cristianismo, por exemplo, há um capítulo inteiro na Bíblia sobre a Origem. Eles devem rejeitar sumariamente tudo dito no Gênesis, porque o que é dito lá se opõe à evolução e à história, ou mesmo à idade da Terra [sim, o relato do Gênesis se opõe à evolução e à idade da vida na Terra, ambos temas ainda controvertidos; mas que fique claro: o Gênesis se opõe à evolução (macro), não à ciência. Tyson quer fazer crer que sejam sinônimos, mas não são]. Então eles, os cientistas-religiosos, rejeitam essa parte e mantêm os elementos de enriquecimento espiritual [novamente o ateu quer falar por seus pares que creem. Conheço muitos cientistas cristãos que não rejeitam nada da Bíblia e, no entanto, fazem boa ciência – um desses, inclusive, acabou de ser condecorado com uma medalha de excelência científica, no Canadá]. Assim as duas ideias podem coexistir dentro da mesma mente. Pode ser devastador para algumas pessoas, porque é a sua religião, sua filosofia, mas em certo ponto é preciso superar isso. Aceite, as conclusões científicas são verdades objetivas. [E muitos cientistas, como Tyson, procuram a coexistência em sua mente da ciência com o ateísmo e o naturalismo, posições filosóficas não derivadas da ciência nem demonstráveis cientificamente. Estamos no mesmo barco, Sr. Tyson. E o senhor deveria superar seu ateísmo filosófico a fim de se abrir a outras possibilidades.]

Algumas vezes, o senhor se refere a “pessoas com sexto sentido” ou a áreas como a astrologia como “bobagens místicas que sempre falham no teste científico”. Se não há base sólida, por que o público se interessa tanto por essas “bobagens” – muitas vezes mais do que por assuntos científicos? 

Alguns gostam de acreditar que têm mais poderes que os outros. Por exemplo, o “poder” de prever o futuro é muito valorizado na cultura e na sociedade. Se você diz que consegue realizar isso, as pessoas vão aparecer na sua porta. Mesmo se não apresentar provas dessa capacidade. Mas na física e na astrofísica também conseguimos fazer previsões: podemos dizer a que horas o Sol vai nascer ou quando vai acontecer um eclipse solar total. A precisão é tanto que acertamos inclusive o tempo exato, em segundos, em que esses fenômenos irão correr. Mesmo assim, alguns preferem os autointitulados profetas. [Aqui a revista Veja manifesta uma hipocrisia sem tamanho, partilhada por outros meios de comunicação. Tenta colocar no mesmo “saco” a religião bíblica e pseudociências como a astrologia, o que, por si só, já é um absurdo (confira). No entanto, muitas vezes já dedicou suas páginas para promover conteúdos espíritas, ocultistas, esotéricos, etc. Grandes jornais “seculares” até hoje mantêm colunas de astrologia. Então não me venham falar de criacionismo como se fosse uma crendice! Há muito mais evidências em favor dele do que da astrologia, por exemplo.] 

[Por fim, note que Tyson não fala necessariamente em superar o criacionismo. Isso ficou por conta dos editores da Veja. Colocaram palavras na boca dele. - MB]